tag:blogger.com,1999:blog-39371062869515747962024-02-07T05:33:27.782+00:00OS BELENENSESUnknownnoreply@blogger.comBlogger14125tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-55400984299069975752009-08-08T23:08:00.005+01:002009-08-08T23:15:39.285+01:00Raul Solnado, um (grande) dos nossos<div align="justify">É dia de pesar, de adeus a um Belenense indefectível, "pastel" com orgulho inabalável, que sempre envergava as nossas cores e símbolos, sem estúpidos complexos ou vergonhas... para além de ter ajudado ao sucesso e notoriedade de várias iniciativas do Clube.<br />Até sempre! </div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-9794975210808969462009-06-15T11:35:00.004+01:002009-06-15T11:42:10.649+01:00Andebol - Campeões Nacionais de Juniores<div align="justify">O Belenenses conquistou o título máximo de Juniores em Andebol Masculino, pela sexta vez na sua história, confirmando, para além do excelente valor dos nossos jovens - que estão de parabéns - o lugar privilegiado da modalidade no nosso Clube.<br />Aqui fica o histórico dos referidos títulos, que faz do Belenenses um dos grandes desta modalidade:<br /><br />1966/67<br />1967/68<br />1968/69<br />1971/72<br />2004/05<br />2008/09<br /><br />De recordar que os títulos no final da década de 60 (e início dos anos 70) têm uma relação muito estreita com a sequência de títulos que viria a ser conquistada nos anos seguintes... em Séniores.<br />É uma modalidade onde vale a pena apostar na formação (vs. importação) e o Belenenses continua a mostrar a força da sua escola!</div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-53695697725113686022009-06-09T14:59:00.006+01:002009-06-09T15:13:29.842+01:00Recordando Manuel Ramos, a alma Belenense do Porto<div align="justify">No dia 7 de Novembro de 2006 faleceu Manuel Ramos, grande Belenense, que por sinal era um dos maior símbolos (no meu entender, o maior) da presença do Clube fora do seu "berço" lisboeta.<br /><br />É comum cada clube desportivo perpetuar no seu panteão aqueles que foram grandes atletas, grandes desportistas, ou grandes dirigentes. Mas, embora a condição de Manuel Ramos fosse bem mais que a de um "simples" adepto, é nessa categoria que deve ser lembrado, como exemplo maior de uma dedicação extrema, desinteressada e incondicional.<br /><br />Portuense de gema e Belenense de longa data, Manuel Ramos trabalhou incansavelmente em prol do Clube e do fortalecimento da sua presença no Norte do País, chegando a arregimentar adeptos do Minho e de Trás-os-Montes em torno da "Tertúlia Belenense", sediada na Invicta - da qual foi um dos principais mentores (embora reconhecido pelos restantes como o verdadeiro mentor - afinal de contas foi o seu Secretário-Geral).<br /><br />Da sua acção e dedicação, a "Tertúlia" é o melhor exemplo. Fundada numa altura em que o Belenenses estava empenhado na construção do Estádio do Restelo, esteve sempre na "linha da frente" na divulgação da obra e consequente angariação de fundos.<br />Manuel Ramos fez questão de se deslocar do Porto e estar presente em muitas (quase todas) das efemérides relacionadas com o novo Estádio. Naturalmente, para o dia da inauguração - há pouco mais de 50 anos - deslocou-se também um grandioso contingente nortenho, talvez o maior de todos de fora de Lisboa.<br /><br /></div><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhw1DEu9MH_WW7ebQczjZNW1Yd6zHwoZD-l6wJNyGIek9_oNAr_nMI832wgXkugxKKCtrMsjjumBgJlBsl-cAmMucheEa1dXgo7BI1VSXaomfLQ5j-ImKFXQjTSVLbodtDGejUbuCSpP7Q/s1600-h/manuelr1.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5345327475509422882" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 345px; CURSOR: hand; HEIGHT: 400px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhw1DEu9MH_WW7ebQczjZNW1Yd6zHwoZD-l6wJNyGIek9_oNAr_nMI832wgXkugxKKCtrMsjjumBgJlBsl-cAmMucheEa1dXgo7BI1VSXaomfLQ5j-ImKFXQjTSVLbodtDGejUbuCSpP7Q/s400/manuelr1.jpg" border="0" /></a><br />Em simultâneo, Manuel Ramos colaborou intensamente com o jornal do Clube, sendo responsável por uma rubrica específica dedicada aos "Belenenses no Porto".<br /><br />Os tempos de Manuel Ramos chegaram a ser aqueles em que não era descabido considerar o Belenenses como o clube lisboeta (ou até clube não nortenho) com maior número de adeptos no Norte!<br /><br />Embora a "Tertúlia" se viesse a perder, Manuel Ramos nunca cessou a sua inigualável paixão ao Clube. Ainda em 2004, no âmbito da paragem portuense da "volta" pelas filiais, Manuel Ramos estava lá, recebendo o justo carinho do Clube do seu coração.<br /><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiu2nTn52cXwuEpLnci_cYfZTGf7YDh3E9oZ7F0CyujQliD2cWmDthFQfkkAS4kX88SEPZM4DFst6WobbRnKa-is_e8XLy9i2SebeLGCkFfmtwjnxf08N0iYhzuX-PuSp9t7-Kp3jvgmYU/s1600-h/manuelr2.JPG"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5345327478213000002" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 368px; CURSOR: hand; HEIGHT: 294px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiu2nTn52cXwuEpLnci_cYfZTGf7YDh3E9oZ7F0CyujQliD2cWmDthFQfkkAS4kX88SEPZM4DFst6WobbRnKa-is_e8XLy9i2SebeLGCkFfmtwjnxf08N0iYhzuX-PuSp9t7-Kp3jvgmYU/s400/manuelr2.JPG" border="0" /></a><br /><br />Reproduzimos em seguida alguns textos e imagens para recordação desta nossa grande figura.<br />Começamos por uma "auto-entrevista" do próprio Manuel Ramos, publicada no Jornal "Os Belenenses" em Janeiro de 1955, onde este explica a sua filiação clubística:<br /><br /><blockquote>"- Se sou Belenenses há muito? Desde que entrei para o Liceu de Alexandre Herculano, tinha então nove anos. Fui lá encontrar muitos simpatizantes do Belenenses – e quis a sorte que um deles (talvez o maior…) ficasse a ser meu companheiro de carteira.<br />Refiro-me ao Dr. João de Sobral Mendes, ainda hoje um grande amigo do Clube.<br /><br />O Belenenses era o motivo preferido das nossas conversas diárias. Foi a ele que eu primeiro ouvi contar as proezas dos nossos grandes jogadores dessa época: o “Pepe”, o Augusto Silva, o César de Matos, o Joaquim Almeida, os Ramos, etc., etc.<br />Lembro-me muito bem de que (já então!), em vésperas de jogos internacionais ou entre selecções regionais, nos entretínhamos (até às vezes em plena aula!) a formar as “linhas” com muitos jogadores do Belenenses… Para nós, não havia melhores! E os cálculos que fazíamos quanto ao desfecho dos encontros do nosso Clube, nos campeonatos em curso, levavam-nos invariavelmente à posse do título. Era tão fácil – e tão agradável!...<br />(…)<br />- O que mais quero para o Clube? Sem dúvida nenhuma, o novo Estádio do Restelo. Mais do que quaisquer vitórias – mesmo em campeonatos…<br />No dia em que tivermos construído o estádio – teremos alcançado um triunfo muito maior. Esse será o dia mais feliz da minha vida!"</blockquote><br /><br />Continuamos com alguns excertos da série publicada sobre o Cinquentenário do Estádio do Restelo, onde se constata a incansável acção de Manuel Ramos:<br /><br /><blockquote>"Decorrendo o ano de 1952, continuavam os apelos à adesão de sócios. Mas surgiam já e também grandes – e comoventes - sinais de apoio da «nação azul».<br /><br />(...) [Um] exemplo (...) que viria até a originar uma das mais emblemáticas forças de apoio popular em prol do estádio e do Clube. Assim era o anúncio no portuense «Jornal de Notícias» [do qual Manuel Ramos veio a ser director]:<br />«Agora que a construção do novo estádio do Belenenses vai entrar em fase mais activa, iniciando-se em breve os respectivos trabalhos, sabemos que os sócios e adeptos do clube residentes no Porto e nos concelhos vizinhos estão interessados num grande movimento de solidariedade tendente a obter fundos que se destinem àquelas obras.<br />Vai ser constituída uma comissão central e serão, depois, distribuídas listas para inscrição de todos os bons amigos do Belenenses, que atingem elevado número em terras do Norte.»<br /><br />A segunda maior cidade e o Norte de Portugal diziam também «presente!». Estava prestes a nascer um dos mais importantes e incansáveis núcleos de Belenenses do País, como veremos adiante.<br /><br />À cabeça de tão admirável movimento, o ilustre jornalista Manuel Ramos, que ao mesmo tempo inspiraria um outro grande exemplo, a ser seguido por mais consócios: voluntariamente passou a pagar uma quota suplementar de 20 escudos!<br /><br />(...)<br /><br />Quanto às campanhas e iniciativas de sócios e adeptos, não era menor o frenesim. O entusiástico grupo do Norte a que já nos referimos no Capítulo anterior, liderado pelo notável jornalista Manuel Ramos, conseguiu por fim a criação de um núcleo, com simpatia designado como «Tertúlia Belenense», com sede na cidade do Porto. No dia 20 de Dezembro de 1952, nos salões da delegação portuense do Automóvel Clube de Portugal, teve lugar a primeira reunião, premiada com sucesso imediato. Seguiu-se uma nova reunião logo a 5 de Janeiro de 1953, demonstrando o bom andamento da iniciativa, bem como um concorrido jantar de confraternização, poucos dias depois (11 de Janeiro), contando com presença avalizadora do próprio Presidente do Clube (Francisco Mega). Uma merecida prova de reconhecimento que muito alentou os Belenenses da região.<br /><br />(...)<br /><br />Aliás do Norte, do mesmo Manuel Ramos, o Belenenses logo aproveitou uma excelente idéia. Recorde-se que o referido consócio, num gesto voluntário e de grande generosidade, já havia oferecido ao Clube o pagamento de uma quota suplementar. No Boletim de Dezembro de 1952 o Clube exortou os restantes consócios a seguirem tal exemplo, registando uma receptividade que dificilmente podia ser maior: sucederam-se os novos voluntários… às centenas!<br /><br />(...)<br /><br />[No ano de 1954] A «Tertúlia Belenense», por sua vez, também fazia o que podia – sempre apoiados na incontornável figura de Manuel Ramos, que fazia da redacção do «Jornal de Notícias» ponto de distribuição de vinhetas e mealheiros. Ambicionava já a instalação de uma sede para a «Tertúlia», mas o ano não se revelaria propício para tal (como curiosidade, as reuniões continuaram a ter lugar na «Leitaria Primus», na Rua Rodrigues Sampaio, no Porto).<br />Em novo jantar de confraternização, realizado a 27 de Setembro de 1954, chegou a reinar o desânimo. Apesar de novo feito – a primeira abertura de mealheiros fora da Secretaria do Clube – e de mais uma brilhante e emocionada evocação da história do Belenenses (celebrava-se também o 35º aniversário do Clube) Manuel Ramos mostrou-se profundamente desiludido com o que considerava ter sido uma fraca adesão ao jantar (cerca de trinta pessoas, quando sabia serem às centenas os Belenenses no Porto). Não fosse o pronto e caloroso incentivo dos presentes (em especial de Diamantino de Carvalho, outro Belenense «ferrenho») e a «Tertúlia» poderia ter acabado ali. Mas continuou, em distante mas enorme – cada vez maior – amor ao Belenenses!<br /><br />(...)<br /><br />Mantendo ainda especial atenção sobre o que se passou no ano de 1955, cumpre destacar – uma vez mais – aquele que foi talvez um dos maiores símbolos do «querer Belenense» em toda a campanha do Estádio do Restelo.<br /><br />Já aqui referimos: a devotada e incansável «Tertúlia Belenense» no Porto, ela própria fruto da solidariedade e empenho despertados pela construção da nova «casa azul». Mas o ano de 1955 marcaria uma grande etapa na vida daquele grupo de indefectíveis do Norte de Portugal, como veremos de seguida.<br />(...) À frente das «tropas» estava o jornalista Manuel Ramos (Jornal de Notícias), figura que de longe fazia pulsar um enorme coração azul, mas que era também presença assídua e sempre considerada nos grandes momentos do Belenenses… em Belém.<br /><br />A «Tertúlia Belenense» nem sempre viveu dias de ânimo e felicidade. Sofreu com certa desmobilização ou alheamento, sofreu com a perda do campeonato em 1955… mas ressurgiu sempre, estóica, como se cada golpe a fizesse mais forte e tenaz.<br /><br />Um dos seus problemas concretos – «práticos» – era a falta de uma sede própria. Entre salões cedidos (gentilmente), esta ou aquela simpática «leitaria» (como a «Leitaria Primus»), a verdade é que para realizar as suas reuniões a «Tertúlia» não dispunha de condições próprias e condignas.<br /><br />Até que em Junho de 1955 a vontade começou a ganhar forma. Falava-se de um primeiro andar no centro da cidade do Porto, não ideal, mas satisfatório…<br /><br />Paralelamente, foi lançada uma iniciativa que devemos obrigatoriamente mencionar, não só por dizer respeito à «Tertúlia», mas porque evoca também um outro episódio da história do Clube. É que no final do «fatídico» encontro com o Sporting Clube de Portugal em 1955, nas Salésias (o que ditou a perda de um campeonato a minutos do fim), registaram-se alguns desacatos… posteriormente punidos pela Federação, com a aplicação de uma multa ao clube.<br /><br />Entendendo que, por um lado, era dever dos sócios ajudar a «aliviar» essa pena imposta ao Clube, e que, por outro, deviam ser todos os sócios a assumir a culpa (ainda que só alguns fossem verdadeiramente responsáveis), Diamantino de Carvalho, um dos mais ilustres e intervenientes consócios do Norte, sugeriu que fossem os sócios a pagar a multa em causa, contribuindo cada um de acordo com as suas possibilidades.<br />Um belo exemplo de desportivismo e amor ao Clube…<br /><br />Regressando ao assunto principal, foi em Setembro de 1955, altura de aniversário do Clube (mas também, como veremos posteriormente, momento-chave na construção do Estádio) que a «Tertúlia» finalmente conseguiu o seu objectivo. Assim deu conta o Jornal «Os Belenenses»:<br /><br />«Foi solenemente inaugurada a sede da Tertúlia de «Os Belenenses» no Porto<br /><br />A Tertúlia de «Os Belenenses» no Porto, fundada, em boa hora, há cerca de três anos, por um grupo de bons e dedicados amigos do Clube, realizou no passado Domingo [dia 25 de Setembro de 1955] o sonho que vinha acalentando desde a sua criação. A partir desse dia, tem a Tertúlia uma sede condigna, pequena embora, mas que não envergonha o Belenenses – cujo prestígio e bom nome, aliás, sempre têm sido defendidos pelos homens que no Porto se dispuseram a criar uma verdadeira «casa belenense».<br /><br />(...) falou o nosso consócio Manuel Ramos, em nome da Comissão Dirigente da Tertúlia. Começou por saudar o Sr. Dr. Urgel Horta, afirmando que o chefe do distrito, a não estar presente, não poderia ter enviado àquela festa um representante mais qualificado. Desportista ilustre, com uma obra notável dentro do F.C. do Porto, a sua presença ali constituía motivo de satisfação para todos os Belenenses. Lamentado o motivo por que o Sr. Dr. Domingos Braga da Cruz não pudera comparecer, Manuel Ramos pediu ao Sr. Dr. Urgel Horta que dissesse ao Sr. Governador Civil quanto todos os presentes desejam as melhoras do seu filho.<br /><br />Saudou, depois, o Sr. Dr. Paulo Sarmento, vereador municipal. Também a Câmara quisera fazer-se representar por um desportista prestigioso, que todos admiram. O facto equivalia a uma redobrada honra.<br /><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg6aWVSHWfGoWmyaIJ0Lq6tVsEi-OivdmNa8-M3hJ2u6vbPZrITa0vrRXbzB8E-iRGYfbBRQ-nPJE2N9fVPBv48MIhLAB99rxRLDUsJptsj6SxTKlpXxGSRyzOSsfD9_aLhvzF-pnmBKWQ/s1600-h/manuelr3.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5345327483319410786" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 377px; CURSOR: hand; HEIGHT: 343px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg6aWVSHWfGoWmyaIJ0Lq6tVsEi-OivdmNa8-M3hJ2u6vbPZrITa0vrRXbzB8E-iRGYfbBRQ-nPJE2N9fVPBv48MIhLAB99rxRLDUsJptsj6SxTKlpXxGSRyzOSsfD9_aLhvzF-pnmBKWQ/s400/manuelr3.jpg" border="0" /></a><br /><br />O orador cumprimentou, a seguir, o Sr. Capitão Magalhães, pedindo-lhe que transmitisse ao Sr. Tenente-Coronel Santos Júnior a certeza de que a Tertúlia sempre saberá cumprir, sem esforço de maior aliás, aquelas disposições legais a que todas as colectividades congéneres estão sujeitas.<br /><br />Depois, Manuel Ramos agradeceu a presença dos clubes da cidade, dizendo que se permitia destacar o nome de dois deles: o F.C. do Porto e o Sporting Clube Vasco da Gama. O primeiro é um amigo de sempre. São velhas e fortes, indestrutíveis, as relações de amizade entre o glorioso clube portuense e o Belenenses. O Vasco da Gama tem a irmaná-lo ao nosso Clube a mesma Cruz de Cristo – que os atletas das duas colectividades, orgulhosamente, usam na camisola. Dirigindo-se ao Sr. Dr. Miguel Pereira, vice-presidente do F.C. do Porto, Manuel Ramos, depois de fazer o elogio do ilustre dirigente, que presidiu há anos aos destinos do grande clube, onde realizou uma obra de maior valia, garantiu-lhe que a Tertúlia do Porto sempre procurará trabalhar pelo bom entendimento entre Porto e Belenenses – cuja amizade nada ou ninguém fará destruir.<br /><br />O «Solar dos Leões» e a «Casa do Benfica» mereceram também duas palavras amigas de Manuel Ramos. Colectividades de idênticos fins, ambas elas trabalham, afinal, como a Tertúlia, para um maior engrandecimento dos seus clubes – e do Desporto, portanto.<br /><br />O orador saudou, depois, a Imprensa e a Rádio, o que fez, quanto à primeira, esquecendo por momentos a sua qualidade de jornalista. A Tertúlia – afirmou – muito deve aos jornais e à Rádio.<br />As últimas palavras de Manuel Ramos foram para o Clube, para os seus dirigentes, associados e jogadores. Garantiu que a Tertúlia saberá continuar a trabalhar, como até aqui, em favor do Belenenses – seu grande e único objectivo!; que deseja ter a colaboração de todos os belenenses, sem excepção, procurando uni-los, cada vez mais, sob a bandeira do Clube; e que os belenenses do Porto, acreditando embora no valor da sua equipa de futebol e na competência do seu treinador, saberão manter-se fiéis ao seu ideal de sempre, sejam quais forem os resultados no campo da luta. Saudou todos os sócios, presentes e ausentes, e, falando do esforço que representa a inauguração da sede da Tertúlia, pôs em destaque a preciosa colaboração recebida do Sr. Alfredo Castro, desportista distinto e artista de méritos reconhecidos, ali, por curiosa coincidência, representando o Sporting Vasco da Gama.<br />Voltado para o Sr. Dr. Paiva Raposo, Manuel Ramos terminou por dizer que os belenenses do Porto não faltarão, no próximo ano, à inauguração do grande estádio do Restelo.<br /><br />(...) Durante o dia, a sede foi visitada por elevado número de belenenses – do Porto, de Lisboa e da Província.»<br /><br />(...) Em Novembro de 1955 seria o próprio Manuel Ramos a fazer uma apreciação sobre a nova sede da Tertúlia, ao Jornal do Clube:<br /><br />«(…) A sede da Tertúlia – e temos sempre o maior prazer em recebê-lo lá! – é uma coisa modesta, que mais não conseguimos. Estou certo, porém, de que não envergonha o Belenenses e corresponde perfeitamente ao que os nossos consócios do Norte desejariam possuir. Instalações maiores e melhores, quando o Clube vive um momento de apertada economia e em que todos os esforços devem conjugar-se com vista ao Estádio do Restelo – seria, não há dúvida, asneira crassa.<br /><br />O que ali está – com a sua sala de bilhar, com o seu bar, com a sua sala da direcção e secretaria – chega muito bem para as presentes necessidades e aspirações. Oxalá, porém, essa casa viesse um dia a mostrar-se pequena demais para o seu movimento. Era bom sinal!<br /><br />Para já, os sócios do Belenenses e da Tertúlia podem frequentar a sede todas as noites – pois ali, em camaradagem amiga, encontrarão um verdadeiro ambiente belenense.(…).»<br /><br />Manuel Ramos exortava todos os Belenenses a ajudarem a Tertúlia e, dessa forma, o Belenenses. Quanto ao Estádio do Restelo, revelou ainda que já estava em estudo uma grande excursão dos Belenenses do Norte, para estarem presentes no grande dia da inauguração!<br /><br />Como referimos anteriormente, a Tertúlia «centralizava» a recolha de mealheiros no Norte e até já tinha tido o privilégio de realizar uma abertura, algo que esperava repetir por altura do seu terceiro aniversário – desta vez na sua sede.<br />Assim aconteceu, numa festa realizada a 22 de Dezembro de 1955 (data que por vezes é confundida com a de aniversário – só que em 1955 o dia 20 correspondia a um dia útil).<br /><br />(...) Falta-nos referir que a sede da «Tertúlia» situava-se no 1º andar do nº 875 da Rua Fernandes Tomás, no Porto…<br /><br />Como se pode facilmente constatar, é com todo o merecimento que os episódios da história da «Tertúlia Belenense» têm lugar especial numa «história» do Estádio do Restelo, como aliás já o tiveram em livros sobre a história do próprio Belenenses (da autoria de Acácio Rosa). Exemplos como o de Manuel Ramos, nunca será demais repetir, são raros e inexcedíveis."</blockquote><br /><br />Por fim, um texto publicado hoje mesmo no "seu" Jornal de Notícias (de Manuel Vitorino c/ Jorge Vilas), que nos revela outras facetas daquele nosso consócio, homem de fortes princípios, determinado... mas também de excelente humor:<br /><br /><blockquote>"Morreu Manuel Ramos<br />A hora dos coronéis<br /><br />Manuel Ramos foi, durante anos, um assíduo frequentador do café "A Brasileira", na Baixa portuense<br /><br />"A sua postura suscitava respeito. Era discreto, sabia ouvir como poucos e era muito exigente. Com ele próprio e com os outros", afirmou Carlos Lage, presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, amigo de Manuel Ramos, ontem falecido e cujas exéquias fúnebres serão efectuadas, hoje, na igreja da Lapa, no Porto.<br /><br />Foi um jornalista de corpo inteiro. Teve uma vida dedicada ao JN, onde trabalhou durante 47 anos, em que foi, entre outros cargos, director (entre Setembro de 1978 e Dezembro de 1979) e chefe de redacção. Sabia-se que estava doente há muito tempo e temia-se pela sua morte. Nesta Casa feita de papel impresso, partilhou alegrias e tristezas. Percorreu todos os patamares da empresa foi revisor, repórter da cidade, redactor, chefe de redacção, director. Na hora do seu desaparecimento - aos 86 anos, nasceu em 16 de Fevereiro de 1920 -, fica a memória de um homem exemplar e rigoroso, tendo repartido o seu saber e sua experiência de vida por diferentes instituições sociais e culturais da cidade.<br /><br />E amigos "Era um homem de grande carácter. Interessava-se por tudo. Quando entrava na livraria, procurava saber as novidades editoriais. Os últimos livros que comprou cá foram obras de Lobo Antunes e José Saramago", contou, ao JN, Henrique Perdigão, dono da Livraria Latina, na Praça da Batalha, um dos locais habituais de tertúlia de Manuel Ramos. O outro era, nos bons velhos tempos, o café "A Brasileira".<br /><br />De volta aos elogios "Convivi com ele [Manuel Ramos] nos tempos da Constituinte e a imagem que deixou foi de um homem rigoroso e de independência face às propostas apresentadas. Foram tempos memoráveis. Também foi um dos alicerces da democracia", recordou Carlos Lage.<br /><br />O antigo eurodeputado lembrou, ao JN, outros episódios vividos ao longo do anos, confidências da militância partidária vividas por ambos dentro do PS/Porto "A escolha dos candidatos fez-se de uma forma curiosa, já que uma boa parte das pessoas não tinha a noção do que era a Assembleia Constituinte. Mas Manuel Ramos cedo evidenciou a sua presença", destacou Carlos Lage. O livreiro Henrique Perdigão preferiu destacar o "homem incansável", o jornalista criterioso e que, nas horas difíceis, não virava a cara à luta: "Quando quiseram fechar a livraria, por causa de uma acção de despejo, os seus escritos no JN contribuíram para a cidade tomar posição. A Latina sempre foi uma referência cultural. A livraria não fechou e ganhámos a acção em tribunal", contou o livreiro.<br /><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgbcgsfjJuibScbu3M148aUtUuWMgC0v-dDMiFjBf0UMUadUYyBfhEYcpG70DHZfFTFjvpqFwN1vJ71OPWXa_Ue1FM54RDdba4gireV52XUSxSvzL1clklQKTT8ayDVJXN3d4BJ002T68M/s1600-h/manuelr4.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5345327483995028386" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 250px; CURSOR: hand; HEIGHT: 167px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgbcgsfjJuibScbu3M148aUtUuWMgC0v-dDMiFjBf0UMUadUYyBfhEYcpG70DHZfFTFjvpqFwN1vJ71OPWXa_Ue1FM54RDdba4gireV52XUSxSvzL1clklQKTT8ayDVJXN3d4BJ002T68M/s400/manuelr4.jpg" border="0" /></a><br /><br />Na oposição a Salazar<br /><br />Manuel Ramos sempre esteve ligado aos círculos da Oposição ao regime de Salazar e Caetano. Conviveu com António Macedo, Carlos e Mário Cal Brandão e juntamente com Vital Moreira e outros constitucionalistas foi redactor da Lei Fundamental que resultou do 25 de Abril. Porém, a sua acção cívica estendeu-se a diversas instituições e organismos da cidade. Foi membro da primeira comissão administrativa da Câmara Municipal do Porto, presidida pelo arquitecto Artur Andrade; mais tarde, vice-governador civil do Porto, ao lado do seu amigo e correligionário Mário Cal Brandão. Pela sua acção e pelos serviços prestados à causa pública, a Câmara do Porto concedeu-lhe, no início da década de 80,a Medalha de Honra da Cidade. Ainda como jornalista e figura pública, Manuel Ramos teve particular intervenção na crise vivida durante bastante tempo no Asilo Profissional do Terço, uma instituição de relevantes serviços prestados à cidade e cuja gestão danosa foi objecto de intervenção por parte do Ministério Público e da Segurança Social do Porto.<br /><br />Manuel de Sousa Ramos era casado com Silvina de Sousa Ramos, pai de Maria Manuel Ramos e avô de Sílvia Regina Vilas e Marta Luísa Vilas Dias. Encontra-se depositado na capela mortuária da igreja da Lapa, onde, hoje, pelas 15 horas, terá lugar a celebração de exéquias fúnebres. O féretro seguirá para o cemitério do Prado do Repouso, onde o corpo será inumado.<br /><br />À família o JN apresenta as mais sentidas condolências.<br /><br />A "hora dos coronéis"<br /><br />A "hora dos coronéis" chegava depois do jantar. O militar de plantão nas instalações dos Serviços de Censura, à Rua de Santa Catarina, telefonava pontualmente às 21 horas e Manuel Ramos fazia questão de ser ele a atender, embora quem o conhecesse soubesse que paciência evangélica era virtude que ele não cultivava.<br /><br />"Notícias sobre o almirante Tenreiro são para cortar" - dizia o coronel do lado de lá do telefone. "Para cortar, senhor coronel? Então, já não se pode falar de um homem que tantos serviços tem prestado à Pátria?", repontava Manuel Ramos, do lado de cá, em ar de gozo. "E também estão proibidas notícias sobre suicídios", informava, noutra altura, o coronel. E Manuel Ramos escrevia nas suas notas diárias "A Censura proibiu os suicídios em Portugal"…<br /><br />São aos milhares as notas de Censura que ainda existem no Centro de Documentação do "Jornal de Notícias". Como a desobediência nestes casos era crime e podia dar azo a julgamento em Tribunal Plenário, outro remédio não havia senão seguir à risca as "ordens dos coronéis", que não se limitavam a dá-las pelo telefone. Todos os dias, o Maciel, contínuo da Redacção, ia a Santa Catarina levar as prosas para os censores poderem cortar, com lápis vermelho - em Lisboa, o lápis era azul - os extractos que eles considerassem não estarem de acordo com os cânones do regime. E invariavelmente os cortes deixavam as notícias sem qualquer sentido… Manuel Ramos, que sempre foi um homem da Oposição, ficava vermelho de raiva com todos estes disparates. Também no Centro de Documentação do JN há milhares de notícias arquivadas com o selo dos coronéis. E quanto à guerra colonial, que mobilizou milhares de jovens para as antigas colónias, nem pensar. Daqui apenas podia dar-se à estampa as notas oficiais que, normalmente, só contemplavam o número de mortes e feridos. Mas não se fazia, então, as notícias? Manuel Ramos, neste particular, era inflexível "Nós escrevemos; eles que cortem se quiserem", sentenciava."</blockquote><br /><br />De acordo com a informação prestada pelo Clube, Manuel Ramos, que era à data o sócio nº 20, foi elevado a Sócio de Mérito em 1959 e em Novembro de 2002 foi distinguido com o mais alto galardão do Clube, a Cruz de Cristo de Ouro - Mérito e Dedicação.<br /><br />Que recordemos para sempre Manuel Ramos com o mesmo carinho e respeito que nutria pelo seu Clube - o nosso, o nosso Grande Belenenses! <br /><br /><strong>Nota: uma primeira versão do texto foi publicada pelo autor no blogue <a href="http://cantoazulaosul.blogspot.com/">Canto Azul ao Sul</a> (9 de Novembro de 2006).</strong>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-34128235144848590892009-06-09T14:47:00.001+01:002009-06-09T14:47:45.591+01:00Os Guarda-Redes do Belenenses<div align="justify">A presente lista, inicialmente publicada em <a href="http://www.geocities.com/hpacfb/">página pessoal</a> do autor (em 2005, quanto tal compilação não existia ainda), está sujeita a revisão, não só pela actualização das últimas épocas mas também pela escassez de informação para algumas das épocas mais distantes (todas as contribuições são bem vindas):<br /><br /><br /><strong>Épocas/Habituais Titulares/(Reservas/Suplentes/Pontuais) </strong><br /><br />1919/20 Mário Duarte, Mário Monteiro (?)<br />1920/21 Mário Duarte, José Paulo dos Santos (?)<br />1921/22 Mário Duarte, Artur José Pereira (1 jogo!)<br />1922/23 Mário Duarte, Stock(?), Manuel Pereira(?)<br />1923/24 Mário Duarte, Manuel Arsénio<br />1924/25 Alaiz, Stock<br />1925/26 Assis, Alaiz [Campeões de Lisboa]<br />1926/27 Assis [Campeão de Portugal]<br />1927/28 Assis, Jerónimo Morais<br />1928/29 Assis, João Tomás, Jerónimo Morais [Campeões de Portugal e de Lisboa]<br />1929/30 João Tomás, Jerónimo Morais, José Luís Gomes [Campeões de Lisboa]<br />1930/31 João Tomás, Jerónimo Morais<br />1931/32 Soares dos Reis, Jerónimo Morais, J. Miranda(?) [Campeões de Lisboa]<br />1932/33 Jerónimo Morais [Campeão de Portugal]<br />1933/34 José Reis a), Jerónimo Morais<br />1934/35 José Reis a), Jerónimo Morais<br />1935/36 José Reis a), Jerónimo Morais<br />1936/37 José Reis a), Fernando Sousa<br />1937/38 Artur Dyson, Fernando Sousa<br />1938/39 (?)<br />1939/40 Salvador Jorge<br />1940/41 Salvador Jorge<br />1941/42 Salvador Jorge [Vencedor Taça de Portugal]<br />1942/43 Salvador Jorge<br />1943/44 Salvador Jorge, Capela b) [Campeões de Lisboa]<br />1944/45 Capela b), José Sério, Acácio Correia<br />1945/46 Capela b), José Sério [Campeões Nacionais da 1ª Divisão e de Lisboa]<br />1946/47 Capela b), José Sério<br />1947/48 José Sério a), Joaquim Caetano c)<br />1948/49 José Sério a) , Joaquim Caetano c)<br />1949/50 Joaquim Caetano c), José Sério a)<br />1950/51 José Sério a), Joaquim Caetano c), Carmo Duarte?<br />1951/52 José Sério a), Joaquim Caetano c)<br />1952/53 José Sério a), Joaquim Caetano c), José Pereira<br />1953/54 José Sério a), José Pereira d)<br />1954/55 José Pereira d), José Sério a)<br />1955/56 José Pereira d)<br />1956/57 José Pereira d)<br />1957/58 José Pereira d)<br />1958/59 José Pereira d)<br />1959/60 José Pereira d), Nascimento [Vencedores da Taça de Portugal]<br />1960/61 José Pereira d), João Ferreira Gomes, Nascimento<br />1961/62 José Pereira d), João Ferreira Gomes, Nascimento<br />1962/63 José Pereira d), João Ferreira Gomes<br />1963/64 José Pereira d), João Ferreira Gomes<br />1964/65 José Pereira d), João Ferreira Gomes<br />1965/66 José Pereira d), João Ferreira Gomes, Serrano<br />1966/67 João Ferreira Gomes, Serrano<br />1967/68 João Ferreira Gomes, Serrano<br />1968/69 João Ferreira Gomes, Serrano, Félix Mourinho<br />1969/70 Ferro, Serrano, Félix Mourinho<br />1970/71 Félix Mourinho, Ferro, Vítor Cabral<br />1971/72 Félix Mourinho, Ferro, Ruas<br />1972/73 Félix Mourinho, Ruas, Ferro<br />1973/74 Felix Mourinho, Melo, Ruas<br />1974/75 Melo, Figueiredo<br />1975/76 Melo, Figueiredo<br />1976/77 Melo, Figueiredo<br />1977/78 Rui Paulino, José Pereira, Delgado<br />1978/79 Rui Paulino, José Pereira, Delgado<br />1979/80 Delgado, Jacinto João<br />1980/81 Delgado, Jacinto João<br />1981/82 Jacinto João, Padrão, Torres<br />1982/83 Figueiredo, Torres, Luís Santos<br />1983/84 Melo, Justino<br />1984/85 Melo, Justino<br />1985/86 Jorge Martins, Justino, Rui Valentim<br />1986/87 Jorge Martins, Justino, Rui Valentim<br />1987/88 Jorge Martins, Justino, Rui Valentim<br />1988/89 Jorge Martins, Justino, Rui Valentim [Vencedores da Taça de Portugal]<br />1989/90 Borislav Mihailov d), Justino, Pedro Espinha e) (Juv. Belém)<br />1990/91 Pedro Espinha f) (6 int?), Justino<br />1991/92 Pedro Espinha f), Figueiredo, Adamo / Luis Ferreira<br />1992/93 Pedro Espinha f), Figueiredo, Luis Ferreira<br />1993/94 Pedro Espinha f), Figueiredo, Luis Ferreira<br />1994/95 Figueiredo, Tomislav Ivkovic g), Luis Ferreira<br />1995/96 Tomislav Ivkovic g), Luis Ferreira, Valente<br />1996/97 Valente, Silvino, Luis Ferreira<br />1997/98 Botelho, Valente, Luis Ferreira<br />1998/99 Marco Aurélio, Botelho, Luis Ferreira<br />1999/00 Marco Aurélio, Botelho, Luis Ferreira<br />2000/01 Marco Aurélio, Botelho, Luis Ferreira<br />2001/02 Marco Aurélio, Luis Ferreira, Pedro Alves<br />2002/03 Marco Aurélio, Luis Ferreira, Pedro Alves<br />2003/04 Marco Aurélio, Pedro Alves, Fábio Montes<br />2004/05 Marco Aurélio, Pedro Alves, Fábio Montes<br />2005/06 Marco Aurélio, Pedro Alves, Marco Pinto<br />2006/07 Marco Aurélio, Costinha, Marco Gonçalves, Marco Pinto<br />2007/08 Costinha, Júlio César, Marco Gonçalves, Marco Pinto, Thiago Schmidt<br />2008/09 Júlio César, Costinha, Assis, Thiago Schmidt (emp.)<br /><br />a) - 1 internacionalização ("AA") pelo Belenenses<br />b) - viria a ter 5 internacionalizações, salvo erro já pela Académica (para onde se transferiu, tendo a sua estreia na Selecção sido a 5 de Janeiro de 1947)<br />c) - 11 internacionalizações ("AA") pelo Belenenses, o mais internacional guarda-redes azul de sempre<br />d) - Campeão Nacional de Juniores em 1946/47<br />e) - 102(!) internacionalizações pela Selecção da Bulgária, ainda hoje recordista absoluto do seu país. Curiosamente a sua passagem pelo Belenenses coincidiu com um período "morto" (entre a frustrada fase de qualificação para o Campeonato do Mundo de 90 e a do Campeonato da Europa de 92).<br />f) - viria a ter 10 internacionalizações pelo Guimarães e pelo Porto<br />g) - 38 internacionalizações pela Jugoslávia, todas antes de ingressar no Belenenses<br /><br />São devidos agradecimentos a Luís Gomes, Álvaro Antunes, Fernando Nunes e Joaquim Caetano (um dos nossos guarda-redes), pela ajuda prestada neste levantamento.</div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-54176991349907145442009-06-05T23:15:00.001+01:002009-06-05T23:00:00.246+01:00SÉRIE: Cinquentenário do Estádio do Restelo - Capítulo II - 1ª parte<div align="justify"><strong>Capítulo II: O Caminho das Salésias ao Restelo<br />1ª parte: ventos de mudança</strong><br /><br />No capítulo anterior recordámos – ainda que de forma sintética - os dias do Belenenses nos seus antigos campos «ignorando» propositadamente os detalhes dos acontecimentos que levariam à construção de um novo estádio. Assim sendo, cabe-nos agora recuar de novo no tempo, desde aquela manhã em que uma multidão calcorreou o percurso das Salésias ao Restelo, até ao momento em que verdadeiramente se iniciou essa caminhada… da qual o cortejo de Setembro de 1956 foi, no fundo, uma emocionada evocação simbólica.<br /><br />Antes de mais, torna-se conveniente fazer uma breve análise de alguns dos motivos subjacentes à ordem de expulsão das Salésias (em Junho de 1946), pois nem todos diziam exclusivamente respeito ao Belenenses ou, pelo menos, entrecruzavam-se numa teia de circunstâncias que afectavam os clubes em geral.<br /><br />Podemos afirmar que a partir do início da década de 30 foram duas as grandes «frentes» de mudança conjuntural. Por um lado, uma que partia dos próprios clubes de futebol, que por contrapartida da sua popularidade crescente e do reconhecimento generalizado da importância da formação desportiva, pretendiam uma maior comparticipação estatal nos investimentos tidos como necessários para manter – e até expandir – aquela sua função.<br /><br />A outra «frente» dizia respeito ao próprio Estado, que na mesma altura se preparava para efectuar uma série de obras públicas de vulto. No caso particular da zona de Lisboa, projectava a criação de novos bairros, espaços de recreio e lazer, bem como uma nova rede viária, tudo em grandes proporções.<br />Num momento inicial, não era evidente a necessidade de emparceiramento com os clubes, evitando a incómoda concorrência de reivindicações que a pluralidade de emblemas cogitava.<br /><br />Porém, em 1933, por iniciativa conjunta de um grupo parlamentar e do jornal «Os Sports» (o mais importante de então), realizou-se o primeiro Congresso de Clubes Desportivos, cujas conclusões viriam a ser apresentadas ao Presidente do Conselho de Ministros (já na altura a figura máxima do poder). As diversas exigências incluíam, à cabeça, a construção de um «estádio nacional», pois considerava-se que em todo o País não existia ainda um recinto apropriado para eventos desportivos de grande envergadura (incluindo a realização de jogos internacionais). Das restantes, destacavam-se ainda: a construção de instalações locais e/ou regionais que pudessem ser aproveitadas pela generalidade dos clubes; a criação de um organismo governamental que regulasse e fomentasse a actividade desportiva; a criação de uma escola superior de educação física e a atribuição de um estatuto especial aos clubes, como reconhecimento acrescido da sua utilidade pública (com a respectiva concessão de vantagens fiscais).<br /><br />Culminando aquele movimento concertado, os clubes marcaram presença numa grande «parada atlética» no Terreiro do Paço (a 3 de Dezembro de 1933), prestando homenagem ao Presidente do Conselho e, enfim, aguardando o seu veredicto. Foi então que António de Oliveira Salazar confirmou a promessa de construir o Estádio Nacional. A questão dos estádios dos clubes, como veremos, seria para resolver depois, caso a caso.<br /><br />Como já referimos no capítulo anterior, quem não ficou à espera foi o Belenenses. Em 1937, sem apoios estatais ou camarários, inaugurou o primeiro campo relvado em Portugal, assumindo assim o papel de anfitrião dos maiores espectáculos desportivos. Isto enquanto o referido Estádio Nacional não fosse uma realidade, o que só viria a acontecer em 1944, como também veremos adiante.<br /><br />Do estrangeiro, entretanto, continuavam a chegar exemplos de grandes estádios, alguns deles erigidos ostensivamente como símbolos de poder das nações (tal como viria a ser, em boa medida, o Estádio Nacional). O melhor exemplo de todos era o «Olympiastadion», em Berlim, onde Hitler presidiu à celebração dos Jogos Olímpicos de 1936. Dispunha da exorbitante capacidade para sentar 110 mil espectadores!<br />Os maiores clubes europeus, por sua vez, sonhavam contar com semelhantes recintos, apenas comparáveis aos antigos Coliseus romanos.<br /><br /></div><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgV616aq2ng5iXqdO0UlVJB2k9TrLC_Uux1dJIqwZkX2YU1Ca6mCAcSNWQ5GxLkUMqiQvurJLclOxFdJYQQ7BomtO5ozFMQeL7HmpaTppSPWKTwg_vkZOwOSqXAzz1LtnJ_64uQuGDwJLU/s1600-h/olympia2.bmp"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5343963925897617058" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 400px; CURSOR: hand; HEIGHT: 341px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgV616aq2ng5iXqdO0UlVJB2k9TrLC_Uux1dJIqwZkX2YU1Ca6mCAcSNWQ5GxLkUMqiQvurJLclOxFdJYQQ7BomtO5ozFMQeL7HmpaTppSPWKTwg_vkZOwOSqXAzz1LtnJ_64uQuGDwJLU/s400/olympia2.bmp" border="0" /> <p align="justify"></a><div align="center">O colossal complexo do Olympiastadion de Berlin</div><p align="justify"><br /><br />Quanto aos clubes lisboetas, numa primeira instância, teriam de se sujeitar ao desfiar de prioridades do Governo e Câmara Municipal.<br /><br />Em 1938 foi inaugurado o Parque Florestal de Monsanto, onde desde tempos remotos mal existiam árvores e se cultivavam searas e hortas. Pouco depois, iniciava-se a construção de uma auto-estrada que «cortaria» as mesmas serranias fazendo a ligação entre as Amoreiras e o Estádio Nacional (hoje parte da auto-estrada de Cascais), recinto que na mesma altura já brotava numa outra futura zona florestal, mais distante (o Vale do Jamor).<br /><br /></p><p></p><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEihD6Vc7Sog53faREU9zYgVszSuBF78xTKKjmbtmuEjJbFA3b0o-hCXGDsQcz6-D4QB8glxq4e0v0-gM99ea9iDnCY7kxx1Z5I27J_sD1eKOG-JfYGGqoRgKLAUm6r4M0wO3-Dxf5Lwys8/s1600-h/monsanto+vista+RED2.bmp"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5343963903695366274" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 400px; CURSOR: hand; HEIGHT: 128px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEihD6Vc7Sog53faREU9zYgVszSuBF78xTKKjmbtmuEjJbFA3b0o-hCXGDsQcz6-D4QB8glxq4e0v0-gM99ea9iDnCY7kxx1Z5I27J_sD1eKOG-JfYGGqoRgKLAUm6r4M0wO3-Dxf5Lwys8/s400/monsanto+vista+RED2.bmp" border="0" /></a> <div align="center">Vista de Monsanto a partir da Ajuda (1939)</div><br /><br /><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhevUHULFSNCez_-Nfdk_b04h2nhywIKl0kzFc_jbJ5WEFXuBScjJwuBwMUdhsQbZKW8vSC3cabJrWTsNKr4pVOF-oO3b2D34MmGngcPDLppk4TvRtDZAOXMVyY-kcvWLDPYKrVcnweOGc/s1600-h/estadio+nacional+red2.JPG"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5343963901320729730" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 400px; CURSOR: hand; HEIGHT: 285px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhevUHULFSNCez_-Nfdk_b04h2nhywIKl0kzFc_jbJ5WEFXuBScjJwuBwMUdhsQbZKW8vSC3cabJrWTsNKr4pVOF-oO3b2D34MmGngcPDLppk4TvRtDZAOXMVyY-kcvWLDPYKrVcnweOGc/s400/estadio+nacional+red2.JPG" border="0" /></a> <div align="center">O Vale do Jamor por altura da construção do Estádio Nacional (ao fundo)</div><p align="justify"><br /><br />O primeiro grande clube afectado seria o Benfica, que a troco de uma indemnização monetária e da cedência de um antigo campo do Sporting (no Campo Grande), teria de abandonar o seu campo das Amoreiras, pois por ali desembocaria o Viaduto de Duarte Pacheco. Nessa altura, curiosamente, pôs o Belenenses o seu estádio à disposição dos «encarnados».<br /><br />Contudo, a idéia inicial da Câmara Municipal de Lisboa era mais arrojada: propunha a todos os grandes clubes a construção de novos complexos desportivos no Parque de Monsanto, a seu cargo e por contrapartida do abandono de todos os campos já existentes na cidade.<br /><br />Para o Benfica, tal solução implicava que a utilização do estádio do Campo Grande (a célebre «estância de madeira») se tornasse provisória. Para além disso, com o argumento de ter sido o primeiro clube afectado, conseguiu também o privilégio de ser o primeiro a escolher um espaço em Monsanto. O Sporting, por seu turno, deveria suspender as obras previstas para o seu «novo» campo (situava-se em local aproximado do primeiro campo da sua história, no Lumiar). O Belenenses, em boa medida, era o que mais tinha a perder: tão só e de longe o melhor estádio do País, mas também a preciosa, característica e antiga ligação umbilical a Belém.<br /><br />Esmorecido o interesse das partes, o «plano de Monsanto» afinal não passaria das intenções.<br /><br />Em 1940, como já referimos anteriormente, foi a vez do Casa Pia A.C. ter de abandonar o Campo do Restelo, sacrificado à Exposição do Mundo Português. Até encontrar solução definitiva, recorreu a um antigo campo para os lados do Rio Seco (que havia pertencido ao União de Lisboa).<br /><br />Em 1944, mais concretamente no dia 10 de Junho, foi finalmente inaugurado o Estádio Nacional, disputando-se um jogo entre Benfica e Sporting… sobre aquele que ainda era somente o segundo campo relvado do País (depois das Salésias).<br /><br />Chegados ao ano de 1946, só existia mais um campo relvado: o da Tapadinha, pertencente ao Atlético Clube de Portugal, que havia sido inaugurado no ano anterior. As Salésias, embora a partir daí preteridas para a realização das finais da Taça e dos jogos da Selecção (em favor do Estádio Nacional), ainda serviam de campo de treino para esta última, pois na cidade de Lisboa continuava a não haver melhor.<br /><br />Foi então que chegou a notícia que tomou de (desagradável) surpresa o Belenenses, como já descrevemos no anterior capítulo.<br /><br />Quanto aos rivais, o Benfica havia obtido pouco tempo antes (em Maio de 1946) a promessa de poder voltar ao seu lugar de origem. Em reunião com o Ministro das Obras Públicas, este declarou solenemente: «o Benfica é de Benfica e para lá tem de voltar!». Abandonaria assim o estádio do Campo Grande para depois erguer, numa solitária planura, o «Estádio de Carnide», mais tarde conhecido como… Estádio da Luz. Seria inaugurado em 1954, sendo o primeiro campo relvado dos «encarnados».<br /><br />O Sporting, que já se encontrava (re)instalado no seu berço de origem, também nessa altura (1946) decidiu promover melhorias, incluindo o arrelvamento do seu campo e a posterior construção de um novo estádio (no mesmo local), que viria a inaugurar a 10 de Junho de 1956 (o Estádio José de Alvalade).<br /><br />A esta altura impõe-se uma nota de ressalva: quando aqui referimos a situação de outros clubes não o fazemos por reverência ou, inversamente, por desrespeito. Nem tão pouco desvirtuamos o nosso propósito, que é dar a conhecer uma (pequena) parte da história do Belenenses. O que apresentamos não são senão factos, reconhecidos e divulgados pelos próprios emblemas e instituições em causa, que nos permitem descrever o cenário geral em que se desenrolaram acontecimentos respeitantes ao Belenenses, sendo estes últimos indissociáveis daquele.<br /><br />Para completar o «quadro geral», urge ainda fazer referência ao que entretanto ocorria na zona de Belém em particular. Recorde-se, uma vez mais, que a justificação para a expropriação das Salésias era, segundo a C.M.L., a necessidade de urbanização.<br /><br />Com efeito, já desde o final da década de 30 se faziam sentir profundas alterações, acentuadas com a realização da Exposição do Mundo Português: surgiu a Praça do Império; foi inaugurado o Bairro Novo de Belém (ou Bairro das Terras do Forno, entre a Rua dos Jerónimos e a Calçada do Galvão); foram abertas as avenidas da Torre de Belém, do Restelo e da Índia, neste último caso implicando a destruição de gasómetros que serviam a Fábrica de Gás de Belém (cuja demolição se previa para a mesma altura, mas só se veio a efectuar já em 1950); desapareceu também o antigo Mercado de Belém e, por fim, a Casa Pia de Lisboa teve de abandonar o Mosteiro dos Jerónimos para se instalar no Colégio Pina Manique (nas traseiras), enquanto os terrenos que dispunha a Norte, da antiga «cerca», foram sendo expropriados (ficariam limitados, como hoje, pelo traçado da Avenida do Restelo).<br /><br />Para os descampados que permaneciam a Norte, até às imediações de Monsanto e Caselas, já tudo estava traçado no papel, incluindo um bairro residencial com pretensões de luxo. Nada ou quase nada escapava aos planos de urbanização. Uma vez mais, depois de meio século de atribulações, o grande clube de Belém teria de sofrer para não se apartar do seu bairro.<br /></p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-32149694032986979102009-06-05T23:00:00.000+01:002009-06-05T22:25:37.029+01:00Pepe, 1931: O adeus de um campeão<div align="justify"><strong>Homenagem por ocasião do 75º aniversário do falecimento de Pepe (24 de Outubro de 2006)</strong><br /><br />No final da manhã do dia 23 de Outubro de 1931 deu entrada no Hospital de Marinha um jovem torneiro de metais, de fato de ganga e bóina, queixando-se de violentas dores na barriga. Viria a falecer no dia seguinte, tendo sido em vão todos os esforços para o salvar.<br />Nos dias que se seguiram, a notícia da sua morte surge nas capas dos jornais; ao seu funeral acorre uma infindável multidão; de todo o país e do estrangeiro chegam manifestações de pesar. Mais tarde, erguem um monumento em sua memória e uma rua de Lisboa passa a ter o seu nome. Quem era, afinal?<br />Era José Manuel Soares, o “Pepe”, um dos melhores jogadores de sempre do Belenenses e da história do futebol português.<br /><br /><strong>As origens</strong><br /><br />José Manuel Soares Louro nasceu a 30 de Janeiro de 1908 (embora certas fontes apontem o dia 29), filho de Maria José da Silva Soares e de Julião Soares Gomes. O local terá sido a casa da família, na Rua do Embaixador, nº17, em Belém (outras fontes referem – talvez por lapso – que teria nascido na Covilhã, terra de origem da família?).<br />Foi em Belém que cresceu o “Pepe” (diminutivo de José - talvez por influência dos muitos galegos que viviam na zona), sujeito a enormes vicissitudes, no seio de uma família pobre, num bairro pobre. O pai vendia hortaliça com uma carroça, de porta em porta. A mãe tinha uma banca de fruta no antigo Mercado de Belém (já desaparecido, situava-se em frente da actual Rua Vieira Portuense, sendo contíguo o antigo Campo do Pau do Fio). E aqueles parcos rendimentos serviam para sustentar, para além do Pepe, mais cinco irmãos: Ana (a mais velha, que era quem tomava conta da casa e dos outros), Rogério, Suzana e ainda outros dois (mais novos).<br /><br />Na mesma Rua do Embaixador, porém, tinha o Pepe ilustres vizinhos. Também de famílias humildes, mas que se iam tornando famosos por todo o país, graças ao que parecia uma brincadeira de crianças, mas que já animava multidões: o futebol. Ali viviam alguns dos melhores futebolistas, dos tempos do Sport Lisboa, das Terras do Desembargador (logo acima da rua)… e dos primeiros anos do Belenenses. Entre os quais, Artur José Pereira, então o melhor jogador de todo o País e principal fundador do Clube, cuja fama por certo não deixaria indiferente a miudagem da rua. Recorde-se que à data da fundação do Belenenses tinha o Pepe 11 anos.<br /><br />Não terá sido assim surpreendente que José Manuel Soares, como tantos outros rapazes, viesse a engrossar as fileiras de jovens promessas do novo Clube (de antigas tradições). Em 1924, com 16 anos, começou a jogar na 4ª “categoria” (escalões jovens). A 18 de Outubro desse mesmo ano, foi promovido directamente à 2ª categoria (logo abaixo da equipa de “honra”), o que demonstra bem a sua qualidade.<br /><br /><strong>A estreia e conquista do primeiro Campeonato de Lisboa</strong><br /><br />O grande momento, a estreia pela equipa principal, aconteceu a 28 de Fevereiro de 1926, tinha o Pepe apenas 18 anos. É bastante conhecido o episódio, em que o capitão Augusto Silva chamou o rapazinho para entrar em campo, logo contra o Benfica. Mas já lá vamos. Menos conhecida é a verdadeira razão da chamada de José Manuel Soares à 1ª categoria. Assim a revelou Joaquim Dias, um dos sócios fundadores, em entrevista ao Jornal do Belenenses:<br />“- O Artur José Pereira, depois de aturada conversa comigo, na altura tesoureiro do clube, deliberou tomar tal decisão [de incluir o Pepe na 1ª categoria], apesar do receio que tinha em que a massa associativa não gostasse, devido à pouca idade do inesquecível atleta.”<br /><br />Assim ficamos a saber que o grande mestre do futebol português, Artur José Pereira, que ajudou a formar tantos jogadores de excelência (até finais dos anos 30), também esteve ligado à progressão do Pepe - embora discretamente, como lhe era habitual.<br /><br />Regressando ao dia 28 de Fevereiro de 1926, tratava-se da 11ª jornada do importantíssimo Campeonato de Lisboa (onde estavam as melhores equipas e que chegou a servir como “poule” indirecta para o Campeonato de Portugal). Como em épocas anteriores (nomeadamente, a de 1924/25), o Belenenses tinha boas hipóteses de conquistar aquele título - seria a primeira vez nos seus 7 anos de história. Já havia amealhado 6 vitórias, 2 empates (com Sporting e Benfica, na 1ª volta) e apenas tinha sofrido 2 derrotas (com o Setúbal – jogo altamente polémico – e com o Carcavelinhos). O jogo anterior tinha sido, precisamente, a derrota com o Carcavelinhos (que por fusão com o União de Lisboa daria origem ao Atlético).<br /><br />Os nervos estavam à flor da pele. Na verdade, era um momento crucial para a vida do Belenenses. Era tempo de saber se o Clube, fundado pelos melhores futebolistas, podia afinal continuar entre os melhores, conquistando um grande título. E era tempo de confirmar se a seguir à primeira geração (cujos últimos representantes, Alberto e Joaquim Rio, se retiraram por esta altura) já havia uma segunda geração de jogadores, também eles, entre os melhores.<br /><br />Para descrever o que se passou naquele Domingo, aqui fica o relato compilado por Acácio Rosa:<br /><br />“O Belenenses a um quarto de hora do fim, perdia por 1-4!<br />Campo das Amoreiras.<br />Belenenses-Benfica!<br /><br />Durante setenta e cinco minutos só dois jogadores não perderam a fé ante a descrença geral. Augusto Silva – o mais velho – e Pepe – o mais novo.<br />Antes do encontro, corriam rumores de que alguns dos nossos jogadores, por desinteligências internas, não jogariam.<br />A Direcção delegou em Augusto Silva plenos poderes para a escolha da equipa.<br />E, Augusto Silva escolheu os onze jogadores e para a meia esquerda foi Pepe! Vinha dos infantis [como se designavam as camadas jovens em geral]…<br /><br />Mas, a um minuto do fim, com o resultado já em 4-4, a vontade indómita de todos e os ataques sucessivos, o adversário comete falta na grande área. Penalty!<br />Ninguém dos belenenses queria ser o responsável pela execução da falta.<br />Augusto Silva, resolutamente, aponta para o Pepe e diz-lhe: “o penalty marcas tu!”<br />Pepe, envergonhado e receoso, apenas respondeu:<br />- Eu, Sr. Augusto????<br />- Sim, marcas tu!<br /><br />E Pepe marcou o golo e o Belenenses venceu o Benfica por 5 a 4, para o Campeonato de Lisboa.”<br /><br />Foi o delírio entre as “hostes” de Belém - Pepe, o “miúdo”, era um novo herói! E que melhor ocasião – tomando parte de um dos míticos “quartos de hora à Belém”!<br />Ficava aberto o caminho para a conquista do primeiro Campeonato de Lisboa (pela primeira vez disputado por 8 equipas, em vez de 5 – o que valorizou ainda mais aquele triunfo). Para tal bastaram as vitórias sobre o Império (3-0) e o Sporting (1-0), ficando tudo resolvido para a última jornada, em que perdemos por 4-1 com o União de Lisboa, resultado já sem importância.<br /><br />Seguiu-se a disputa do Campeonato de Portugal, que pela primeira vez reunia os vencedores dos campeonatos regionais – isto é, também passava a incluir mais equipas.<br />E, para primeira participação do Belenenses… nada mal: depois de vencer o GS “Os Leões” por 7-2, o Espinho por 4-1, e o difícil Olhanense por 2-1, chegámos à final, a disputar com o Marítimo.<br />O jogo foi no campo do Ameal, no Porto, a 6 de Junho de 1926, e José Manuel Soares fazia parte do “onze”.<br />Mas o jogo não acabou bem… ou melhor, nem acabou quando devia (aos 20 minutos da 2ª parte)! Depois de acontecimentos estranhos – antes e durante o jogo, incluindo a animosidade dos portuenses – o Belenenses perdeu por 2-0...<br /><br /><strong>A época de 1926/27 e a conquista do primeiro Campeonato de Portugal</strong><br /><br />A época seguinte, de 1926/27, ficaria para a História do Clube como uma das melhores.<br /><br />No Campeonato de Lisboa ficámos em 2ª lugar, perdendo o título para a também fortíssima formação do Vitória de Setúbal (também curiosamente foi a última vez que o Vitória disputou o Campeonato de Lisboa, devido à criação da Associação de Futebol de Setúbal). O Pepe alinhou em 9 dos 14 jogos disputados.<br /><br /><br /><strong>Estreia Internacional de Pepe </strong><br /><br />A 16 de Março de 1927, no campo do Lumiar, deu-se a estreia de José Manuel Soares pela Selecção Nacional. Frente à poderosíssima França (para “desforra” da derrota de Abril de 1926, em Toulouse, por 4-2), Pepe marcou 2 golos (o primeiro a consegui-lo na história da Selecção), contribuindo para a vitória (4-0). Saiu em ombros, levado pela multidão. O Pepe já não era só um herói dos Belenenses, também já era um herói nacional!<br />Sobre esta estreia e a “desforra”, escreveu Ricardo Ornellas posteriormente:<br />“E que desforra e que dois rapazes que se estrearam! Dois Zés Manéis, o Soares, “Pepe”, e o Martins, o de ponta esquerda - um «gravoche» e endiabrado e o outro, cheio de boas maneiras.<br />Dividiram os golos: cada um fez dois. Um o Pepe, foi garoto…<br />Depois do encontro disse que, no segundo dele «palavra de honra»<br />que não queria mandar a bola à baliza; ia só a fazer uma passagem... Não<br />importa nada, claro, que a crítica tivesse considerado golo uma maravilha<br />de execução; era-se menos exigente...”<br /><br />A 2ª internacionalização terá ocorrido em Itália (derrota por 1-3). A 29 de Maio de 1927, a terceira (derrota em Espanha por 2-0).<br /><br />A edição do Campeonato de Portugal para 1926/27 seria, sem dúvida, a mais difícil de todas até então disputadas. Poderiam participar todas as equipas que o desejassem fazer!<br /><br />Depois de levar de vencida os Leões de Santar (9-1), o poderoso FC Porto (3-2), o Marítimo (8-1, numa desforra saborosa frente ao “campeão”!) e o Benfica (2-0), o Belenenses conseguiu de novo o lugar na final (pela 2ª vez… na 2ª participação!).<br />O adversário foi o Vitória de Setúbal , pelo que estava também em causa uma “desforra” pelo sucedido no Campeonato de Lisboa.<br /><br />No jogo realizado a 12 de Junho de 1927, no Stadium do Lumiar, o Belenenses venceu por 3-0 e sagrou-se assim – pela primeira vez – Campeão de Portugal! E o Pepe, titular, conseguiu assim o seu primeiro título nacional. Não marcou nenhum dos 3 golos (um Augusto Silva e dois de Silva Marques), mas ajudou no primeiro, com uma simulação que enganou a defesa adversária e deixou a baliza à mercê de Augusto Silva.<br /><br />No dia 9 de Julho de 1927 teve lugar um banquete de homenagem aos campeões, entre os quais Pepe, no Casino S. José de Ribamar (antigo palácio Ribamar), em Algés. Pouco depois Pepe (como os restantes) seria elevado a Sócio de Mérito do Clube de Futebol “Os Belenenses”, com apenas 19 anos de idade (era o sócio nº 1784)! Aconteceu na Assembleia Geral de 8 de Agosto de 1927.<br /><br /><strong>A época de 1927/28 e a epopeia dos Jogos Olímpicos</strong><br /><br />Na época de 1927/28 o Belenenses viveu mais alguns momentos inesquecíveis da sua história. Afirmou-se como um clube pujante, vitorioso e com um futuro auspicioso.<br /><br />A 29 de Janeiro de 1928, em jogo a contar para o Campeonato de Lisboa (10ª jornada), foi inaugurado o magnífico campo das Salésias, o seu primeiro recinto próprio apto para as competições oficiais! Mal sabia o Pepe que esse mesmo campo viria a ser baptizado com o seu nome…<br /><br />Para o Campeonato de Lisboa de 1927/28 (em que ficámos em 3º lugar) o Pepe realizou 11 jogos, ajudando a que tivéssemos o melhor ataque da competição, com 42 golos.<br /><br />Pelo meio, a conquista da Taça de “Natal” (frente a Benfica e Setúbal) e da Taça Ademar de Melo (a duas mãos, com o Boavista).<br /><br />Para o Campeonato de Portugal, depois de eliminarmos o Luso de Beja (7-1) e o Leça (8-1), fomos eliminados pelo Vitória de Setúbal (1-4), em mais um estranho jogo, disputado no campo do Benfica (cujos sócios, presentes em força, estavam contra nós). O Pepe disputou os 3 jogos em questão.<br /><br />Mas um dos momentos mais altos da carreira de Pepe foi, sem dúvida, a participação nos Jogos Olímpicos de Amsterdão, em 1928.<br />Depois de boas prestações em jogos particulares, a Federação Portuguesa de Futebol decidira inscrever a Selecção no Torneio Olímpico de futebol. Para a viagem até Amsterdão, os seleccionadores Cândido de Oliveira e Ricardo Ornelas não hesitaram em escolher os Belenenses José Manuel Soares, Augusto Silva, César de Matos e Alfredo Ramos (embora este não viesse a participar em qualquer jogo). No total, quatro jogadores do Belenenses, que era assim o clube mais representado na Selecção!<br /><br />Os jogos particulares em que José Manuel Soares havia alinhado foram com a fortíssima Argentina, em 1 de Abril de 1928 (empate a 0); com a Itália, em 15 de Abril de 1928 (estrondosa vitória por 4-1) e com a França, a 29 de Abril de 1928 (brilhante empate a 1 bola). De permeio, a presença num Lisboa-Algarve (8-0) e num Lisboa-Madrid (2-2).<br />De salientar que em todos estes jogos Pepe alinhou como “interior” esquerdo…<br /><br />Já em Amsterdão, a estreia foi excelente. A 27 de Maio de 1928, frente à duríssima selecção do Chile, naquele que foi o primeiro jogo da Selecção Nacional em competições oficiais, Pepe marcou 2 golos, contribuindo decisivamente para a vitória (4-2). Vitória essa que não foi nada fácil. Começaram os chilenos em vantagem, com dois golos, enquanto Portugal ficava momentaneamente reduzido a 10 (por lesão de um jogador). No segundo tempo conseguimos a reviravolta, “num estrondoso alarde de valentia, ânimo, coragem e consistência técnica”.<br />No segundo jogo (a 29 de Maio de 1928), nova vitória, frente à Jugoslávia, com uma exibição histórica de Augusto Silva, que marcou um golo e foi levado em ombros pelos próprios holandeses.<br />Terminou a “aventura” com uma derrota frente ao Egipto (3 de Junho de 1928), numa conjunção de má arbitragem (incluindo um golo mal anulado) e excesso de confiança.<br />No entanto, o País rendeu-se aos heróis de Amsterdão, os “Leões de Amsterdão” (ou ainda “Tigres”, uma versão menos “leonina”). Entre eles, os três Belenenses que foram titulares em todos os jogos, sendo que Pepe alinhou sempre como “interior”… direito.<br />E assim José Manuel Soares ficou também para a história, como atleta olímpico!<br /><br />Já depois dos Jogos Olímpicos, o Belenenses efectuou a sua primeira visita à Madeira, depois de insistentes convites dos madeirenses. O Pepe alinhou em todos os jogos ali realizados (5).<br /><br />Finalmente, em 11 de Novembro de 1928, foram homenageados na sede do Clube os nossos “leões de Amsterdão” (Pepe, Augusto Silva, César de Matos e Alfredo Ramos), tendo sido descerrados os seus retratos pelo Presidente da Associação de Futebol de Lisboa.<br /><br /><strong>A época de 1928/29 e a supremacia - as conquistas do segundo Campeonato de Lisboa e do segundo Campeonato de Portugal</strong><br /><br />Seguiu-se a época de 1928/29, repleta de glória. Talvez a melhor de sempre!<br />E foi bastante atarefada… e atribulada.<br /><br />Começou com o Torneio de Preparação, envolvendo os primeiros 4 classificados do Campeonato de Lisboa. A 23 de Setembro de 1928 (data de aniversário) vencemos o União de Lisboa por 2-1, e na final, a 30 de Setembro de 1928, empatámos a zero com o Sporting. Devia ter sido jogado um período suplementar de 30 minutos, mas os sportinguistas não o quiseram. Estranhamente, não foi atribuída a vitória no torneio…<br />O Pepe foi titular nos dois jogos.<br />Seguiu-se um jogo frente ao Setúbal, que terminou em empate (3-3).<br /><br />Depois iniciou-se o Campeonato de Lisboa 1928/29, em que alguns jogadores “azuis” foram bastante penalizados pela violência dos adversários. Pepe, com um entorse; César de Matos, chegou a fracturar a perna direita; e Rodolfo Faroleiro, com forte contusão que o obrigou a perder boa parte da 1ª volta.<br /><br />Chegados a Dezembro, o Belenenses contava já com 5 vitórias, um empate e uma derrota. Estava no bom caminho…<br />De realçar, as vitórias frente ao União de Lisboa (3-2), Sporting (3-1) e Carcavelinhos (3-1).<br />Entretanto, a 2 de Dezembro de 1928, Pepe participara no primeiro jogo Paris-Lisboa (1-2).<br /><br />Aproveitando o interregno natalício, a 23 e 25 de Dezembro de 1928 o Belenenses disputou dois jogos com o FC Porto, ambos no Porto, conseguindo uma vitória no primeiro (2-1), perdendo no segundo (2-3).<br /><br />Em Janeiro de 1929 Lisboa recebeu a grande equipa do Ferencváros, campeão da Hungria e vencedor da Taça da Europa Central (disputada pelos campeões da Hungria, Áustria e Checoslováquia), que para mais havia derrotado pouco antes o Blackburn, vencedor da Taça de Inglaterra, por expressivos 6-1. Face a tal poderio, sucumbiu o Belenenses, mesmo com Pepe, por 6-0 (a 1 de Janeiro).<br /><br />Seguiu-se a Taça Associação (da AF Lisboa), na qual Belenenses foi eliminado no primeiro jogo (derrota por 2-1 frente ao União de Lisboa, a 13 de Janeiro de 1929).<br /><br />A 31 de Janeiro de 1929 realizou-se um jogo em benefício do Asilo Nun’Álvares, em virtude do contrato de cedência do terreno das Salésias. O Belenenses venceu o Vitória de Setúbal por 3-1. No encontro de retribuição, em Setúbal (a 3 de Fevereiro de 1929), os vitorianos conseguiram uma vitória farta em golos (6-1).<br /><br />Contudo, os resultados menos conseguidos desta altura não afectaram o percurso do Belenenses, destinado a mais altos “vôos”.<br />Logo no recomeço do Campeonato de Lisboa (a 17 de Fevereiro de 1929) o Belenenses levou de vencida o Benfica por 6-3!<br />E embora na jornada seguinte o União de Lisboa levasse a melhor (4-2, a 24 de Fevereiro), em seguida veio nova vitória frente ao Sporting (1-0, a 10 de Março de 1929).<br /><br />Aproveitando novo interregno do Campeonato, o Belenenses efectuou nova digressão, a Marrocos (à parte que era colónia francesa – a restante era espanhola), a convite do Clube Português de Marrocos.<br />Pepe alinhou nos 3 jogos, em que o Belenenses deixou excelente impressão. Como curiosidade, foi Artur José Pereira (que integrava a comitiva) que a convite dos próprios marroquinos arbitrou as partidas em causa…<br />Eis os resultados e algumas das reacções da imprensa local:<br /><br />31 de Março de 1929 – Belenenses 1, Union Sportive Marocaine 1<br />Do jornal “La Vigie”: “os portugueses mostraram-se melhores footballers que os nossos locais e o resultado do encontro, um empate, não representa de nenhuma maneira a fisionomia da partida”<br /><br />1 de Abril de 1929 – Belenenses 5, Olympique de Rabat (Olympique Marocain) 1<br />Do “La presse”: “A partida disputada no Estádio Municipal de Aguedel foi esplêndida. Os “azuis” de princípio a fim mostraram a sua táctica impecável.”<br /><br />2 de Abril de 1929 – Belenenses 4, Club de Football de Fez, 0<br /><br />Ainda antes desta digressão, Pepe participou em dois encontros da Selecção Nacional (derrota em Espanha por 5-0, a 17 de Março, e derrota em França por 2-0, a 24 de Março) e num encontro “Norte-Sul” que os “sulistas” (com Pepe) venceram por 4-1 (a 3 de Março).<br /><br />De regresso a Lisboa, regressou também o Campeonato (o de Lisboa, claro). Faltavam apenas quatro jornadas para o final, e nada estava decidido. O Belenenses partia com 7 vitórias, 1 empate e 2 derrotas… mas Benfica, Carcavelinhos e União de Lisboa (e, com hipóteses mais remotas, o Sporting) estavam à espreita.<br /><br />Contudo, fomos irrepreensíveis… e imbatíveis. A 14 de Abril de 1929, vitória por 3-2 frente ao Palhavã (sucessor do Império); a 21 de Abril, vitória por 8-0 (!) sobre o Casa Pia; a 28 de Abril, nova goleada, 8-0 sobre o Bom Sucesso; e a 12 de Maio de 1929, o jogo do título, em que o Belenenses derrotou o Carcavelinhos por 2-0!<br />Estava assim conquistado o segundo Campeonato de Lisboa da história do Belenenses!<br />E a José Manuel Soares coube boa parte dos 54 golos marcados (embora a época seguinte viesse a ser mais espectacular ainda, como veremos), a que corresponderam 37 pontos (recorde-se que para o Campeonato de Lisboa, nestas épocas, a pontuação por jogo era a seguinte: vitória – 3 pontos; empate – 2 pontos; derrota – 1 ponto).<br /><br />A 5 de Maio de 1929 Pepe participou em mais um encontro “inter-cidades”, entre a selecção militar de Lisboa e a de Madrid (derrota por 2-3).<br /><br />Dois dias depois (e ainda antes do final do Campeonato de Lisboa, portanto) começaria o Campeonato de Portugal. Seria o Belenenses capaz de conquistar a “dobradinha” (Campeonato de Lisboa + Campeonato de Portugal), que só o Sporting conseguira, por uma vez, em 1922/23? Seria o Belenenses o primeiro clube de Lisboa a conseguir conquistar dois campeonatos de Portugal? (recorde-se que à época o Benfica não havia conquistado nenhum) Seria também o Belenenses apenas o segundo clube a nível nacional a conseguir conquistar dois campeonatos de Portugal? (embora o Porto, o primeiro, tivesse obtido o seu primeiro título na 1ª edição, limitada a Porto… e Sporting).<br /><br />A primeira eliminatória do Belenenses até foi “fácil”. O adversário (Leiria) não compareceu…<br />Ainda antes da eliminatória seguinte houve novo Porto-Lisboa, em que o Pepe esteve presente (19 de Maio de 1929, terminando com vitória dos portuenses por 4-3).<br /><br />A 26 de Maio de 1929, para os oitavos de final do Campeonato de Portugal, o Belenenses eliminou um dos principais concorrentes, vencendo o Benfica por 3-2. Neste desafio o Pepe sofreu entrada duríssima, logo aos 5 minutos, e o Belenenses esteve praticamente o jogo inteiro com apenas 10 elementos!.<br />A 2 de Junho, nos quartos de final, foi a vez do difícil Carcavelinhos ficar pelo caminho, por 3-1.<br />O jogo das meias finais, frente ao Setúbal, foi bem difícil, como seria de prever. A 9 de Junho as equipas não foram além de um empate. Mas o jogo de desempate aconteceu logo no dia seguinte (aproveitando o facto de ser feriado), levando o Belenenses a melhor (2-0). O curioso é que ambos os jogos foram em Setúbal, tendo o Belenenses repousado na praia de Albarraquel de um dia para o outro… e aproveitou para incluir o Pepe no 2ª jogo, porque não tinha sido possível no primeiro!<br /><br />Chegou então a final, realizada a 16 de Junho de 1929, no campo da Palhavã. O adversário era o complicado União de Lisboa, que no entanto não resistiu à superioridade “azul”. Vencemos por 2-1! Um clube com pouco menos que 10 anos de vida, de novo Campeão de Portugal!<br /><br />Três dias depois, a 19 de Junho, a Direcção do Clube manifesta o louvor aos “duplos” campeões, incluindo o Pepe (e o próprio Artur José Pereira, que era o treinador!).<br /><br />De realçar o número de jogos disputados nesta época, em especial pelo Pepe (37!). Ao nível de um jogador profissional dos nossos dias…<br /><br /><strong>A época de 1929/30, os "records" e o terceiro Campeonato de Lisboa</strong><br /><br />A época seguinte (1929/30) viria a ser talvez a melhor época de sempre de José Manuel Soares, que estava ainda mais “maduro”, hábil e astuto. Ele que de aparência nunca deixara de ser um rapazola.<br /><br />Integrado nas festas do 10º Aniversário do Clube, disputou-se um Belenenses-Barreirense, com derrota por 3-5.<br />Seguiu-se a Taça Preparação, com uma vitória por 6-2 frente ao Carcavelinhos (22 de Setembro de 1929) e um empate a 3 bolas com o Benfica (a 29 de Setembro de 1929).<br /><br />O Campeonato de Lisboa, iniciado poucos dias depois, ficou marcado por records… do Belenenses, e do Pepe em especial.<br />A 27 de Dezembro de 1929, logo na 2ª jornada, o Belenenses venceu o Bom Sucesso por 12 golos a 1, dos quais José Manuel Soares marcou 10! Este é, até hoje, um record imbatido em competições oficiais. Mas vejamos a tabela completa de resultados, onde não faltam os golos (mais que literalmente!):<br /><br />Casa Pia: 9-1 e 6-1<br />Bom Sucesso: 12-1 e 11-0<br />Chelas: 6-1 e 5-1<br />Benfica: 1-3 e 1-2<br />União de Lisboa: 7-1 e 7-3<br />Carcavelinhos: 4-2 e 5-1<br />Sporting: 1-0 e 4-2<br /><br />E assim foi conquistado o terceiro título de Lisboa, com a espectacular marca de 79 golos – “record” imbatido da competição.<br />Por seu turno, Pepe (que foi totalista) marcara 36 golos no campeonato, tornando-se no melhor marcador de sempre; e os 61 golos no total da época, eram também “record”!<br /><br />A nível de representações internacionais, a época também foi fantástica para José Manuel Soares.<br />Em 6 de Outubro de 1929, alinhou por Lisboa na vitória por 3-2 frente à selecção de Sevilha. A 1 de Dezembro de 1929, um resultado menos feliz na Selecção Nacional, em Itália (derrota por 6-1).<br />Nos dois importantes jogos que se seguiram, Pepe foi a estrela. A 12 de Janeiro de 1930 foi um golo seu que deu a vitória frente à poderosa Checoslováquia, num jogo disputado em Lisboa. E a 23 de Fevereiro de 1930, em jogo disputado no Porto, a Selecção Nacional venceu a grandiosa França por 2-0… com dois golos do Pepe!<br /><br />Resumindo aqueles excelentes resultados, escreveu posteriormente Ricardo Ornelas:<br />“Duas vitórias seguidas em casa: 1-0, contra a Checoslováquia em Lisboa, à custa dum Roquete enorme e quando aparecia, como capitão um Serra e Moura, inteligente e brioso, cedo levado pela morte; e 2-0 contra a França, no Porto, num desafio em<br />que Carlos Alves, o das luvas [pai de João Alves], e mais o Pépe, o da boina, encheram o campo”.<br /><br />Na época de 1929/30 Pepe participou ainda num “Norte-Sul” (a 3 de Novembro de 1929, ganho pelos “sulistas” por 0-2) e num “Lisboa-Porto” militar (venceram os de Lisboa por 5-0, a 20 de Abril de 1930).<br /><br />A 6 de Abril de 1930 decorreu no Hotel Duas Nações um banquete de homenagem aos campeões de Lisboa. E os campeões eram bastantes – não só da primeira categoria: o Belenenses conquistara o título lisboeta nas categorias de honra (1ª), reservas (2ª) e 2ª categoria (3ª), algo que nenhum clube conseguira até então!<br />Para além disso, o Belenenses era também o clube com o maior número de jogadores em representação na Selecção Nacional e Selecções Regionais!<br /><br />O Campeonato de Portugal de 1929/30, no entanto, não viria a ser feliz para as nossas cores.<br />O formato foi alterado, pois a partir dos oitavos de final as eliminatórias eram decididas a duas “mãos”.<br />Começámos bem, ao derrotar o Olhanense por 6-0. Na eliminatória seguinte, dos oitavos, empatámos duas vezes com o FC Porto (2-2 e 3-3). O jogo de desempate, em Santarém, ditou a vitória do Belenenses por 2-1.<br />Nos quartos de final eliminámos o Marítimo, depois de um “nulo” seguido de uma vitória por 2-1.<br />O Belenenses “caíu” na meia-final, frente ao Barreirense, de forma invulgar e polémica. Depois de um empate (1-1), ficou apurado o Barreirense graças a uma vitória por 3-2 no 2º jogo… sendo que o 3º e decisivo tento foi um auto-golo de um dos nossos…<br />A polémica “estalou” quando o Belenenses denunciou a inscrição na equipa do Barreiro de um jogador residente na Ajuda (e que por curiosidade também já jogara pelo Belenenses). Pelos regulamentos, ao que parece, os jogadores tinham que residir no distrito da sua equipa. No entanto, não nos foi dada razão (mesmo com recurso ao poder judicial, já então!). Em protesto, Augusto Silva, César de Matos e o “nosso” José Manuel Soares pediram escusa à Federação para o jogo de 8 de Junho de 1930, frente à Bélgica. E, com efeito, não jogaram. Assim sendo, o memorável jogo contra a França acabou por ser o último jogo de José Manuel Soares pela Selecção Nacional…<br /><br /><strong>A época de 1930/31, a última</strong><br /><br />A época de 1930/31 foi de certa forma “atípica” para os padrões do Belenenses à época de José Manuel Soares. Com efeito, desde a estreia deste na 1ª equipa, só numa época o Belenenses não conseguira conquistar um dos dois grandes títulos (Campeonatos de Lisboa e de Portugal). Nas outras quatro foram conquistados 3 Campeonatos de Lisboa e 2 Campeonatos de Portugal…<br />Naquela época, porém, o Belenenses ficou em “branco”.<br /><br />Até começámos bem, com a conquista da Taça de Preparação, vencendo na final o Benfica por 3-2 (depois de eliminar Sporting e Casa Pia).<br />A vingança “encarnada” chegou a 12 de Outubro, vencendo o jogo de “abertura” por 3-1.<br /><br />A carreira no Campeonato de Lisboa, em bom rigor, também foi bastante boa (apesar de não termos conquistado o título). O Belenenses terminou em 2º lugar, com 11 vitórias, 1 empate (Sporting) e apenas uma derrota (União de Lisboa)… a um ponto apenas do Sporting, que sagrou-se campeão…<br /><br />Sporting: 1-0 e 2-2<br />Benfica: 4-2 e 4-1<br />União Lisboa: 2-1 e 1-2<br />Chelas: 6-1 e 4-1<br />Bom Sucesso: 6-0 e 4-0<br />Carcavelinhos: 6-1 e 4-0<br />Casa Pia: 2-2 e 1-0<br /><br />Repare-se que o Belenenses, com 47 golos, teve o melhor ataque no torneio, uma vez mais…<br /><br />Ainda em 1930 Pepe participou noutros desafios particulares:<br />2 de Novembro: Belenenses 4, Carcavelinhos 0 – jogo de beneficência em favor do sanatório do Outão<br />14 de Dezembro: Belenenses 4, Benfica 2<br />29 de Dezembro: Belenenses 4, União de Lisboa 2 – jogo de beneficência em favor do Asilo Nun’Álvares, nos cumprimento do contrato de cedência dos terrenos das Salésias.<br /><br />Em 1931, outros jogos ainda de carácter particular:<br />31 de Janeiro: Belenenses 3, União de Coimbra 1 – jogo realizado em Coimbra<br />1 de Março: União de Lisboa 1, Belenenses 3 – jogo comemorativo do 21º aniversário do União de Lisboa<br />29 de Março: Belenenses 2, Barreirense 2<br />5 de Abril: Belenenses 1, União de Lisboa 2 – jogo a favor da Federação Portuguesa de Tiro<br />15 de Maio: Belenenses 1, Misto do Sporting, União de Lisboa e Barreiro 2 – jogo a favor do antigo árbitro Alfredo Pedroso<br />31 de Maio: Belenenses 4, Boavista 2<br />10 de Junho: Belenenses 0, Barreirense 2 – disputa da Taça Caridade, que também serviu para fazer esquecer definitivamente os “atritos” da época anterior entre os clubes em causa…<br /><br />Entretanto, a 22 de Março de 1931 o Belenenses estreou-se na Taça “Lisboa”… e não viria a participar no Campeonato de Portugal dessa mesma época…<br />Mais um rocambolesco episódio (não é só nos dias de hoje) esteve na origem de tal facto.<br />Parece que, a propósito de uma visita do Vitória de Setúbal ao Brasil, surgiu um violento diferendo entre a Associação de Futebol de Lisboa, por um lado, e a Federação Portuguesa de Futebol, mais as Associações de Futebol de Setúbal, Porto e Algarve, por outro. Como resultado, a AF Lisboa proibiu todos os seus filiados de realizarem desafios com clubes daquelas associações, o que na prática ditaria a desistência de todas as equipas de Lisboa de participarem Campeonato de Portugal. E, com efeito, Belenenses, Sporting, Carcavelinhos e União de Lisboa não participaram no Campeonato de 1930/31. Os únicos a “furarem” o acordo foram o Benfica (que já agora queria repetir o título, conquistado pela primeira vez apenas na época anterior) e o Casa Pia (em simpatia com o Benfica). Curioso é o facto de que duas das mais fortes formações da própria Associação de Futebol de Setúbal, o Barreirense e o Luso do Barreiro, também não terem participado…<br /><br />Em compensação, a Associação de Futebol de Lisboa decidiu oferecer a referida Taça Lisboa, a ser disputada pelos clubes que com ela se solidarizaram no conflito com a FPF (incluindo clubes que poderiam ter beneficiado da desistência de outros, mas não o quiseram – como o Chelas ou o Fósforos).<br /><br />O Belenenses chegou à final depois de eliminar o Fósforos (11-0 e 6-0), o Chelas (3-4 e 4-2) e o Luso do Barreiro (meia-final, por 3-0). No jogo derradeiro, disputado a 14 de Junho de 1931, perdemos frente ao Sporting, por 3-1.<br /><br />Terminou assim de forma estranha a última época completa de José Manuel Soares ao serviço do Belenenses…<br /><br />Em termos de selecções regionais, Pepe disputou ainda:<br />Lisboa-Coimbra, 5-2, a 21 de Dezembro de 1930<br />Porto-Lisboa, 1-0, a 10 de Maio de 1931<br />Lisboa-Porto militar, 4-2, a 7 de Junho de 1931<br />Lisboa-Santarém, 2-1, a 5 de Junho de 1931<br /><br /><strong>O adeus</strong><br /><br />A 19 de Outubro de 1931, já no início da época 1931/32, disputou-se um Belenenses-Sporting para a Taça Serra e Moura, que vencemos por 1 a zero. Este terá sido o último jogo de Pepe. Ironicamente, Serra Moura – então homenageado – era um jogador famoso do Sporting (companheiro de Selecção do Pepe) que havia falecido prematuramente…<br /><br />E assim voltamos a início deste texto, onde antecipámos a notícia da trágica morte de José Manuel Soares, o “Pepe” – Campeão de Lisboa e de Portugal, atleta olímpico, internacional por 14 vezes (com 7 golos marcados), cerca de 140 jogos feitos pelo Belenenses!<br /><br />Morreu com 23 anos, por causa de um estúpido acidente - que desta vez, porém, não detalharei aqui. Homero Serpa e Marina Tavares Dias (depois) compilaram rigorosos relatos do episódio, que recomendo.<br /><br /><strong>A memória de um símbolo do Belenenses</strong><br /><br />Desta vez, fiquemos apenas com a imagem do garoto campeão… mas sempre humilde.<br />Mesmo chegando a ser um ídolo por esse país fora, nunca abandonou – nem poderia – o seu ofício. Até aos 19 anos trabalhou como torneiro de metais numa oficina ao pé do Mercado de Belém. Depois, provavelmente com a ajuda de Belenenses (o Presidente João Luís de Moura era aviador naval), foi trabalhar para as oficinas do Centro de Aviação Naval do Bom Sucesso (criado pelo belenense Gago Coutinho – que aliás dali partiu com Sacadura Cabral em 1922 para a travessia do Atlântico Sul).<br />Nasceu pobre e morreu pobre, naquele dia 24 de Outubro, há três quartos de século atrás.<br /><br />A morte de Pepe teve primeiro destaque na Imprensa nacional: "Morreu o Pepe! A notícia, como todas as más notícias, correu célere, levando a desolação a todo o meio desportivo. Vitimado em circunstâncias dolorosamente trágicas, quando contava apenas 22 [23] anos, quando a sua vida resplandecia no máximo da pujança, José Manuel Soares leva consigo a dor inconsolável dos seus parentes, o pranto comovido e a saudades enorme dos seus companheiros de desporto, e a compaixão sincera de todo o público"<br /><br />Em sinal de luto profundo, a equipa do Belenenses ostentou fumos pretos durante o resto da época de 1931/32. E assim ficaram para a posteridade, com semblantes de tristeza, os que já sem o Pepe conquistaram o quarto campeonato de Lisboa (precisamente o de 1931/32), entretanto a ele dedicado.<br /><br />Por ocasião do 13º Aniversário do Clube (em 1932) foi descerrado nas Salésias o monumento em honra de José Manuel Soares, um belo e sóbrio baixo-relevo da autoria do famoso mestre-escultor Leopoldo de Almeida. Em 1956, na sequência do abandono forçado das Salésias e após a inauguração do Estádio do Restelo, o monumento foi trasladado para o novo recinto, sendo descerrado na sua nova localização a 1 de Dezembro de 1956, onde ainda hoje o encontramos.<br />O próprio campo das Salésias, na mesma altura (1932), recebeu o seu nome. Mais tarde, como o melhor recinto do País, passaria a ser conhecido como “Estádio José Manuel Soares”, até ao seu abandono.<br /><br />Em 1983 o Grupo “Os Mil” instituiu os troféus “Pepe”, para distinguir os mais dedicados e notáveis Belenenses do ano (foram entregues em 28 de Maio de 1983). Iniciativa efémera, porém (seguiram-se os “Amaros”, e depois…).<br /><br />O conceituado cronista desportivo Severiano Correia descreveu assim José Manuel Soares:<br />“Era de facto um jogador extraordinário! Irrequieto e franzino, dentro do rectângulo era um elemento que chamava as atenções do público. Chutador por excelência, de uma combatividade extraordinária, constituía perigo para qualquer defesa, por muito valiosa que fosse. Era o menino mimado das gentes de Belém, de tal modo que nem com uma rosa se lhe poderia bater — expressão do seu mestre Artur José Pereira.”<br /><br />Severo Tiago, também ele jogador do Belenenses, diria décadas mais tarde acerca do Pepe: “Hoje esse fenómeno valeria milhões de contos”.<br /><br />E digo eu: José Manuel Soares, o nosso “Pepe”, não foi “apenas” um rapaz com má fortuna, um pobre desgraçado que desapareceu deste mundo de forma trágica e comovente. Esse foi o fim absurdo de uma carreira brilhante, a de um rapaz talentoso, dedicado, bondoso, generoso, que com todas essas virtudes conseguiu conquistar gentes pelo País fora (e até pelo estrangeiro).<br />Foi o primeiro ídolo do futebol português, embora tivesse sucedido a grandes nomes, como Artur José Pereira (cuja fama como jogador dificilmente ultrapassou o meio) e embora faltassem ainda décadas para o aparecimento dos chamados “mass-media”. Contudo, o crescente interesse da imprensa, pela primeira vez, “fabricou” uma autêntica lenda.<br /><br />Pepe foi quase tudo o que um jogador famoso pode ser. Excelente na sua “arte”, imitado pelos miúdos de todas as terras por onde passava, querido e invejado entre as moças, respeitado pelos colegas, venerado pelos adeptos…<br />Porém, não era rico, nem vaidoso, mas tinha um amor à camisola como o amor à sua terra: entranhado!<br />Será coisa do passado, como os vários títulos conquistados. Mas a vontade de vencer, a entrega – em cada jogo, como no “quarto de hora”, ou na sua vida, até ao último dia – são imortais.<br /><br /><strong>Até sempre, Pepe!</strong><br /><br /><strong>Nota: texto anteriormente publicado pelo autor nos blogues <a href="http://cantoazulaosul.blogspot.com/">Canto Azul ao Sul</a> (24/10/2006) e <a href="http://torresdebelem.blogspot.com/">Torres de Belém</a> (24/10/2007)</strong></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-77724941224964025232009-06-05T10:50:00.011+01:002009-06-05T16:38:12.928+01:00Artur José Pereira, ou A Origem do Belenenses<div align="justify"><strong>Belenense - Nado em Belém</strong><br /><br />Artur José Pereira nasceu em Belém a 16 de Novembro de 1889, na casa da família na Rua do Embaixador (nº 69). A família Pereira era bastante humilde, como boa parte das famílias residentes nessa zona.<br />Havia passado somente um ano sobre o célebre encontro promovido pelos irmãos Pinto Basto na Parada de Cascais, que consubstanciou a introdução do futebol no nosso país. O futebol ainda dava os seus primeiros passos em Portugal...<br /><br />Porém, poucos anos depois, a “febre” do futebol chegou a Belém, disputando-se alguns dos encontros não muito longe da casa de Artur. A partir de 1892, com a construção da Praça de Touros do Campo Pequeno, o terreiro em frente ao Palácio de Belém (futura Praça Afonso de Albuquerque), a praia de Belém e as “Terras do Desembargador” tornaram-se outros locais predilectos para treinos e a disputa de jogos “a sério”…<br />Este último local era talvez e de todos o mais próximo da casa de Artur José Pereira (não longe das traseiras da Rua do Embaixador) e era onde mais frequentemente se disputavam jogos “oficiais” (a par com Carcavelos), não sendo portanto de estranhar que este já como criança de tenra idade tivesse assistido a encontros de futebol aí disputados pelos maiores entusiastas da época.<br />Belém era então o primeiro foco do futebol popular, do futebol de rua – neste caso também na praia! - e os belenenses os primeiros entusiastas provenientes de classes mais desfavorecidas.<br /><br />Entretanto, já mais crescido, é certo que Artur fazia parte da miudagem que fazia tudo para ir ver o futebol , mais concretamente os jogos dos ingleses da Companhia do Cabo Submarino / Carcavelos FC, em Carcavelos, ou os renhidos encontros na vizinha Casa Pia (dos quais o primeiro relatos é de 1893).<br />Não sabemos se terá assistido ao histórico encontro de 22 de Janeiro de 1897 em que os rapazes da Casa Pia derrotaram o Carcavelos Club po 2-0 no hipódromo (os ingleses, até então mestres imbatidos), mas os ecos desse resultado sem dúvida deverão já ter entusiasmado o jovem Artur (então com 7 anos).<br /><br /><strong>Os primeiros pontapés</strong><br /><br />Com toda esta envolvente, o passatempo predilecto das crianças logo passou a ser o futebol, jogado com bolas de trapos, de bexiga de porco ou de boi, como relataria anos mais tarde Manuel Martins (o “Barbinhas”, por ser sua a barbearia da zona), grande amigo de Artur José Pereira, em entrevista a Romeu Correia.<br />Desta forma, não temos dúvidas que, quando foram inauguradas a Praça e Estátua de Afonso de Albuquerque (1903), Artur José Pereira era um dos rapazes que por lá dava pontapés na bola, provavelmente já com notável talento (contava já 13 anos).<br />Nessa mesma altura já se tinham formado dois grupos populares na zona, a secção de futebol da “Associação do Bem” (associação de ex-alunos da Casa Pia) e o grupo dos “Catataus”, alcunha dos irmãos Rosa Rodrigues que lideravam o grupo de vizinhos da Rua Direita (hoje Rua de Belém). Artur José Pereira deve ter sido uma vez mais espectador atento, quando não participante prematuro nas “peladinhas” na praia, junto às Salésias ou à Praça Afonso de Albuquerque. Já a “Associação do Bem” fazia os seus treinos no Hipódromo de Belém, um pouco mais longe.<br /><br />Artur José Pereira assistiu concerteza aos primeiros passos do primeiro grande clube de Belém, o Sport Lisboa, fundado em Fevereiro de 1904 na Farmácia Franco (na Rua de Belém). Como muitos dos primeiros treinos e jogos desenrolavam-se nas “Terras do Desembargador”, é fácil de adivinhar que Artur seria uma vez mais espectador assíduo e atento.<br /><br />Ao longo de todo este tempo e com tanta paixão pelo futebol podemos deduzir que a frequência escolar de Artur José Pereira assumiu um papel secundário. Desconhecemos pormenores sobre a mesma, mas é sabido - e seria notado nos anos vindouros - que Artur José Pereira teve fraca instrução. Terá provavelmente ficado pelo equivalente a uma 5ª classe, que seria então o último ano de escolaridade obrigatória.<br /><br /><strong>Jogador de futebol</strong><br /><br />Não sabemos exactamente com que idade é que Artur José Pereira passou a integrar equipas “oficiais” de futebol (nomeadamente 2ªs e 3ªs equipas, algo comum nesta época), mas existem algumas referências ao facto de em 1907/08 ser já um jogador destacado no recém-criado Sport União Belenense.<br />Quem depois reparou em Artur José Pereira, não sabemos (talvez todos!), mas o certo é que este se estreou pelo Sport Lisboa em 22 de Março de 1908 - ainda com 17 anos!<br />A sua entrada terá sido portanto posterior à “dissolução” do antigo Sport Lisboa (mantendo o nome devido à providencial inscrição no campeonato), e deu-se numa altura em que os dirigentes tinham mantido um plantel em competição com recurso à 2ª equipa. O acordo de Cosme Damião com um clube de Benfica surgiu pouco depois.<br /><br />O certo é que Artur, mesmo recém chegado, desde logo expressou o seu receio de que o novo clube resultante, o Sport Lisboa e Benfica, iria perder assim a sua identidade como herdeiro do futebol de Belém e do orgulho das suas gentes - e que provavelmente seria mais conhecido como apenas sendo de Benfica. Mais, como sendo só “o Benfica” (e de facto assim foi). Esta circunstância revela o apego que Artur José Pereira mantinha em relação à sua terra, não por defesa “bairrista”, mas porque via injustiçado o tradicional apoio e o entusiasmo dos seus, os pioneiros do futebol do “povo”.<br /><br />Ainda assim e em 1 de Setembro de 1908 Artur José Pereira lá estava na primeira equipa do Sport Lisboa e Benfica para disputar o campeonato seguinte, acompanhado de “vizinhos” de Belém como Henrique Costa ou Luís Vieira.<br />Logo em 15 de Setembro desse ano foi considerado o melhor jogador no histórico encontro em que pela primeira vez uma equipa de portugueses conseguiu um empate no campo dos ingleses do Carcavellos, até então sempre vitorioso no seu reduto e tendo acumulando goleadas expressivas. Basta dizer que na época anterior o resultado tinha sido 7-0!<br />Desde aí Artur José Pereira revelou-se como o melhor jogador de todos, autêntica “estrela” da equipa.<br />Na época de 1909/10 o Benfica conquistou o seu primeiro Campeonato de Lisboa (na altura ainda era a principal competição nacional), com Artur José Pereira em grande destaque. Um dos jogos foi novamente histórico, pois foram a equipa que venceu pela primeira vez o Carcavellos no seu reduto (0-1).<br />Em 1911 Artur José Pereira foi escolhido para integrar uma selecção da Associação de Futebol de Lisboa, que jogou e venceu os franceses do Stade Bordelais por 5 bolas a 1. Em 1913 essa mesma Selecção efectuou uma digressão pelo Brasil, sendo que Artur José Pereira - uma vez mais – era um dos escolhidos. Conta-se que a impressão que deixou Artur foi de tal forma que terá recebido inúmeros convites para ficar a jogar no Brasil (que recusou, claro). O seu comportamento cívico durante a digressão foi também considerado exemplar, sobretudo sabendo que era homem de pouca instrução e habitualmente pouco preocupado com as “etiquetas”.<br />A acompanhar esta digressão em missão oficiosa seguiu também uma grande figura dos primórdios do desporto em Portugal: Mário Duarte (pai), autêntico sportsman aveirense, ex-praticante de muitas modalidades. Segundo se viria a saber, ali travou conhecimento com Artur José Pereira, de quem ficou amigo e grande admirador. Desde então dizia sempre que Artur era o melhor e seria bom em qualquer equipa do mundo, como relataria o seu filho (também Mário Duarte) anos mais tarde.<br /><br />Por esta altura Artur José Pereira era já um ídolo – e já não só em Lisboa. Segundo consta manteve durante algum tempo um emprego na Farmácia Franco em Belém (a mesma onde se fundou o Sport Lisboa), se bem que o trabalho em si, ao que parece, não era muito. Pedro Franco, o patrão e um dos dinamizadores do Sport Lisboa, nutria por Artur uma grande amizade e sobretudo uma grande admiração... como futebolista (não como empregado). Assim sendo consta que a maior parte do tempo de Artur - como empregado da Farmácia - passava por jogos de bilhar (numa loja próxima) e longas conversas sobre futebol... com o próprio patrão!<br /><br /><strong>Uma mágoa e um sonho que nasce...</strong><br /><br />Apesar de tudo aquilo - e apesar de mais 3 campeonatos de Lisboa conquistados (épocas de 1911/12, 1912/13 e 1913/14) - a satisfação de Artur José Pereira por estar no Sport Lisboa e Benfica, ao que parece, não era muita. Sabemos que desde sempre guardou ressentimentos pelo progressivo corte da ligação a Belém. Também é sabido que Cosme Damião, figura máxima do SLB, pouco priveligiava essa ligação, já desde a saída do Sport Lisboa de Belém. Se isto foi motivo de atrito entre os dois homens, não sabemos ao certo, mas provavelmente sim.<br />O certo é que começaram a surgir problemas disciplinares com Artur José Pereira, apesar de este continuar a ser - incontestavelmente - o melhor jogador do SLB (conflitos de protagonismo?). Até que findo o campeonato de 1913/14, e mesmo com o SLB campeão, Artur José Pereira foi suspenso por 6 meses pelo Benfica, alegadamente por “recusar-se a treinar como qualquer outro jogador”.<br />Se foi uma gota de água ou caso isolado, o descontente Artur José Pereira acabou por ceder aos aliciantes do rival Sporting: protagonizou a primeira grande transferência e uma primeira vinculação quasi-profissional do futebol português. Foi para o Sporting auferir 36 escudos por mês. Isto sem contrato assinado, pois valiam a sua palavra e a de Francisco Stromp, “timoneiro” do Sporting – desde então seu amigo.<br /><br />A excelência de Artur José Pereira não tardou em dar frutos, desta vez no Sporting. Logo na época seguinte (1914/1915) o Sporting conquistou o seu primeiro Campeonato de Lisboa.<br /><br />Os próximos tempos não foram fáceis, tinha começado a 1ª Guerra Mundial, em que Portugal foi parte beligerante. Francisco Pereira, o irmão de Artur, foi recrutado para combater em Moçambique, tendo feito 2 anos de campanha na região do Niassa.<br /><br />Em 1918 Artur conheceu Mário Duarte (filho), que aceitou o repto de um outro jogador para ir treinar ao Sporting. Contou mais tarde Mário Duarte que, como guarda-redes, nunca tivera oposição tão feroz, tal era a potência dos remates, sobretudo de Artur José Pereira, o “baluarte”. Este só dizia “Oh calmeirão [Mário Duarte tinha uma estatura bem cima da média], não ponha as mãos à frente, encaixe, encaixe!”.<br />Mário Duarte saíu do treino de mãos escaldadas e deveras impressionado. Já nos balneários foi interpelado por Artur José Pereira: “Você é alguma coisa ao Sr. Mario Duarte que foi conosco [Selecção da AFL] ao Brasil em 1913?”. “Sou o filho mais velho”, respondeu Mário Duarte. “Venha de lá um abraço!”, disse logo Artur, satisfeito com o encontro. Segundo Mário Duarte, foi a partir de aí que ficaram amigos.<br /><br />Ainda nesse ano (1918) o irmão de Artur (Francisco) regressou de Moçambique, promovido a Sargento do Exército pelo seu distinto valor em combate. Incorporou-se novamente no Sport Lisboa e Benfica, apesar de o irmão estar no Sporting (para onde tinha ido precisamente quando começou a guerra). De qualquer forma a juntar à alegria pelo fim da guerra (generalizada por todo o País e pela Europa), a família Pereira tinha mais um motivo de orgulho.<br /><br />Nessa época (1918/19) Artur José Pereira voltou a ser campeão de Lisboa com o Sporting. De facto ainda era dos melhores, mas faltava ainda cumprir aquilo que ele referia como seu “sonho”. Por palavras suas: “Somos todos de Belém, porque havemos de jogar pelos ‘outros’?”<br />Ou como referiu Mário Duarte anos mais tarde: “[Artur José Pereira] não queria abandonar o futebol sem deixar em Belém, berço de muitos dos melhores lisboetas (conhecidos por jogadores da praia!), um grupo digno e capaz de defender brilhantemente a sua terra que ele tanto estimava como depois tive ocasião de apreciar”.<br /><br /><strong>O sonho que se faz real</strong><br /><br />Finda a época de 1919 Artur José Pereira decidiu lançar mãos à obra. De imediato deverá ter posto os seus amigos de Belém ao corrente, nomeadamente os que jogavam ainda no Sport Lisboa e Benfica. Amigos que provavelmente encontraria todos os dias em Belém, quiçá em frequentes “peladinhas” amigáveis na praia de Belém, ou também no incontornável Café Martinho, paragem obrigatória de Artur e muitos outros homens do futebol nas primeiras décadas do século (era aliás paragem obrigatória de grandes personalidades em geral já há mais de um século).<br />Consta que a maioria desses jogadores estariam nessa altura castigados pelo Sport Lisboa e Benfica, o que os motivou ainda mais para o idéia de Artur José Pereira.<br />Para poder sair do Sporting, porém, Artur José Pereira tinha uma dívida de cortesia e amizade para a figura máxima dos “leões”, Francisco Stromp, que o tinha acolhido extraordinariamente desde a sua saída do Benfica, em 1914. Conta-se que o acanhado Artur José Pereira não conseguiu reunir coragem para fazer o pedido de saída ao temperamental amigo, e como tal pediu o auxílio do capitão Jorge Vieira. Este, acedeu, algo contrafeito, recebendo depois a curiosa resposta de Stromp: “Ó Jorge, diz ao Artur que vá à merda e que funde o tal clube em Belém!”.<br /><br />Mas, como rezam as crónicas, foi numa noite de Agosto desse ano (“sonho de uma noite de Verão”, como cita Acácio Rosa) que, num banco de jardim na Praça Afonso de Albuquerque, Artur José Pereira reuniu os primeiros entusiastas: o seu irmão Francisco Pereira, Henrique Costa, Carlos Sobral, Joaquim Dias, Júlio Teixeira Gomes, Manuel Veloso e Romualdo Bogalho. Todos eles eram jogadores de futebol.<br /><br />Depois desse encontro a idéia do novo clube foi submetida ao juízo de Virgílio Paula e Francisco Reis Gonçalves, que demonstraram o seu entusiasmo e apoio à iniciativa de Artur José Pereira. Várias reuniões se sucederam, com mais intervenientes ainda, até que em 23 de Setembro (ainda em 1919) e também na Praça Afonso de Albuquerque, se decidiu a fundação do novo Clube: o Clube de Futebol “Os Belenenses”. O nome não deixava dúvidas: nascia um clube de futebol só de Belém!<br />Não há dúvidas que, apesar de se terem contemplado pouco tempo depois outras modalidades, o “sonho” de Artur José Pereira era acima de tudo um grande clube de futebol, que pudesse rivalizar e até superiorizar-se aos rivais Sporting e Benfica. Foi esse o desígnio do principal fundador do Clube.<br /><br />Foi claro o papel de Artur José Pereira nos primeiros tempos no clube. Como jogador exímio mas homem de poucas palavras, sempre orientou a sua intervenção para os treinos e organização da equipa de futebol. O resto deixava para quem ele achava que mais entendia.<br /><br />Esteve presente na primeira Assembleia Geral do Clube em 2 de Outubro – claro – onde pouco ou nada deliberou por sua conta, tal como um “principal fundador” poderia fazer. Rejeitava o protagonismo. Só houve um ponto em que Artur José Pereira foi de facto decisivo, mas uma vez mais só para demonstrar a sua modéstia: enquanto os outros lhe pretendiam atribuir o número 1 como sócio (dado que tinha sido o mentor incontestado do Clube), Artur insistiu para que essa honra fosse para Henrique Costa, pois este era o mais velho. E assim foi decidido. Como diria mais tarde Mário Duarte: “Até nisso o Artur era grande!”. Artur José Pereira ficou como sócio nº2...<br />E claro, não assumiu nenhum cargo directivo, muito menos o de presidente!<br /><br />Como viria a contar Mário Duarte, a própria família Pereira deu um contributo especial para os primeiros tempos do Clube. Era na casa dos Pereira na Rua do Embaixador (onde ainda moravam Artur e Francisco) que os jogadores se equipavam, sempre com o carinho e solicitude da mãe de Artur José Pereira. Uma vez equipados desciam até à Rua de Belém, que depois atravessavam nesses peculiares trâmites até chegar ao Campo do Pau do Fio (na Rua Vieira Portuense): andando pelos passeios, concerteza e uma vez por outra cruzando-se com um eléctrico que passava... enfim, um cenário bastante “pitoresco” (a “carolice” no seu melhor).<br /><br /><strong>A primeira equipa e os primeiros jogos oficiais</strong><br /><br />O primeiro treinador da equipa foi Henrique Costa.<br />Os dois primeiros jogos oficiais do Belenenses (na Taça “Associação”) saldaram-se em derrotas, mas de forma alguma foram decepcionantes. A equipa estava em fase de habituação e entrosamento, para mais nos primeiros treinos era rara a vez em que o plantel estava completo, faltava sempre e pelo menos um jogador - tal como assinalaria Mário Duarte anos mais tarde.<br />A prova de fogo viria já em 1920, com o início do 13º Campeonato de Lisboa (1919/20). E na série de grupos logo calhou o Benfica como adversário. O outro era o CIF.<br />O primeiro encontro (a 11 de Janeiro) trouxe a primeira vitória do Belenenses: frente ao difícil Internacional (o CIF) no campo deste, por três bolas a duas.<br />De seguida, em 25 de Janeiro, o primeiro grande embate, precisamente frente ao Benfica (o primeiro “clássico” entre estes emblemas), a disputar no Lumiar. O resultado do primeiro encontro entre estes clubes foi favorável ao Belenenses (2-1), que mostrava que estava ali para ficar... e lutar como um grande! Imaginamos a satisfação de Artur José Pereira e dos seus companheiros: o “sonho” tinha pernas para andar.<br /><br />O Belenenses franqueou essa primeira fase em primeiro lugar, pois derrotou sem dificuldades o CIF no outro jogo por 8-0 - a primeira goleada do Clube, a 8 de Fevereiro - para além de um empate (3-3!) em casa do Benfica, a 14 de Fevereiro.<br />Sobre a goleada com o CIF (a 8 de Fevereiro), contaria depois Mário Duarte que a exibição de Artur José Pereira foi absolutamente fantástica: “o Artur José Pereira dos velhos tempos”, como referiu. Num episódio em particular, Artur “driblou” 3 adversários de seguida, um dos quais até escorregou e caiu no chão. Após este “drible tauromáquico”, Artur José Pereira parou a bola e pôs o pé em cima do adversário caído, exclamando para as bancadas “isto é que é joguinho!”. Sem perder muito mais tempo entregou depois a bola com a habitual precisão matemática a um dos seus avançados! Um “craque”!<br />Passada a 1ª fase vieram as meias-finais, disputadas entre os clubes apurados em campos neutros. Da 2ª série apuraram-se Belenenses (1º) e Benfica (2º). Da 1ª série apuraram-se Sporting (1º) e Vitória (de Setúbal, em 2º).<br />E para começar, a 18 de Abril, o primeiro Sporting-Belenenses (no Campo Grande). Venceram os “azuis” com um golo de... Artur José Pereira!<br />Em seguida o Belenenses conseguiu novo empate com o Benfica (1-1) e uma vitória frente ao Setúbal (4-1). E na sua primeira participação no Campeonato de Lisboa (ainda a principal competição de então), o Belenenses conseguia assim chegar à final!<br />A final era disputada em duas mãos, e aí o Belenenses perdeu por duas vezes com o Benfica: primeiro derrota em casa por 1-2 (30/5/1920) e depois derrota fora por 2-0 (6/6/1920).<br /><br />Entretanto, Artur José Pereira continuava em grande forma: foi convocado para a 9º jogo entre “Selecções” Lisboa-Porto (ainda não existia Selecção Nacional), sendo assim o primeiro jogador do Belenenses a ser seleccionado. Na 10ª edição também foi convocado, desta vez contando com a companhia de Carlos Sobral e Francisco Pereira.<br /><br />A ascensão dos “azuis” porém não agradava a todos, sendo frequentes os ataques da imprensa ao Clube e aos jogadores. Em Novembro de 1920 a revista “Football” publicou um artigo depreciativo para os de Belém, discriminado a condição social da maioria dos seus jogadores – como Artur José Pereira, humildes e de pouca instrução. O objectivo era desestabilizar o Belenenses, que então iria disputar a final da Taça “Associação” com o recém-criado Casa Pia Atlético Clube.<br />Porém as relações com o “vizinho” Casa Pia eram naturalmente as mais cordiais. Cândido de Oliveira, fundador do C.P.A.C. era um velho amigo de Belém e dos Belenenses. E a amizade era recíproca. Na época anterior as escolas do Casa Pia haviam treinado com alguns dos Belenenses sob a orientação do próprio Artur José Pereira, que assim se tornou em figura querida e admirada junto dos casapianos.<br />Quanto à final da Taça da AFL, o Casa Pia acabou por ser o vencedor e o Belenenses desde logo saudou com a maior alegria e entusiasmo os seus “vizinhos”. No final do jogo o próprio Artur José Pereira abraçou todos os adversários, multiplicando as felicitações.<br /><br />Entretanto e em nova convocatória para jogo entre selecções de Lisboa e Porto (a 27 de Fevereiro de 1921), Artur José Pereira, Francisco Pereira, Alberto Rio e Eduardo Azevedo foram chamados.<br />Em 6 de Março de 1921 deu-se uma nova – se bem que risível – tentativa para desestabilizar os Belenenses e acabar com o “sonho” de Artur José Pereira. Tendo tido conhecimento de um jogo particular entre jogadores de Belém, o jornal “Sports” logo noticiou que o Clube se iria desmembrar em dois clubes rivais. O jogo mais não não tinha sido do que uma “peladinha” - em jeito de paródia - entre jogadores do Clube. Para mais tinha sido arbitrado pelo próprio Artur José Pereira!<br /><br />Em 3 de Abril de 1921, por ocasião de novo Lisboa-Porto, Artur José Pereira e Francisco Pereira foram novamente titulares, com Alberto Rio a suplente.<br />Em 19 de Junho de 1921 o Belenenses conquistou o seu primeiro torneio - a Taça “Mutilados de Guerra” - derrotando o Sporting na final por 2-1.<br /><br />O 2º aniversário do Clube, em Setembro de 1921, foi demonstrativo da uma imensa adesão popular ao Belenenses, o que fez calar durante algum tempo os detractores (preocupados com tantos potenciais leitores).<br />No âmbito do aniversário foi disputado mais um Belenenses-Casa Pia, encontro que terminou empatado a 2 bolas. Como curiosidade e provavelmente por indisponibilidade dos titulares, Artur José Pereira participou neste jogo como... guarda-redes!<br /><br /><strong>O Belenenses nasceu já Grande... incómodo e perseguido</strong><br /><br />Ainda em 1921 surgiu um novo conflito "institucional". Em 17 de Novembro a União Portuguesa de Futebol (antecessora da Federação Portuguesa de Futebol) divulgou a lista de convocados para o que seria o primeiro jogo oficial de uma Selecção Nacional (também ela oficial). Nessa lista foram obviamente incluídos Artur José Pereira, o seu irmão Francisco Pereira e Alberto Rio, que continuavam a demonstrar pelo Belenenses os méritos reconhecidos já desde a sua carreira noutros clubes (como o Sport Lisboa e Benfica e o Sporting).<br />Foi então que alguns sectores - por certo afectos aos outros emblemas - levantaram então a polémica, objectando de forma desleal à convocatória de jogadores azuis. Como habitual, a voz desses elementos foi largamente difundida pelos meios de comunicação numa clara tentativa de – uma vez mais – manipular a opinião pública.<br />Quem não esteve para meias medidas foi o próprio Artur José Pereira, que perante tal vaga de hostilidade decidiu que nenhum dos jogadores do Belenenses responderia afirmativamente à chamada. O Belenenses fez então chegar ao secretário-geral da Associação de Futebol de Lisboa um carta (datada de 21 de Novembro) assinada pelos convocados e que incluía os seguintes termos (impregnados de ironia):<br />“Os signatários [...] vêm junto de V. Exª, muito respeitosamente, mas com o máximo empenho de que o seu pedido seja atentido, pedir escusa da referida nomeação. [...] Convencidos de que com a sua substituição o grupo nacional ficará seguramente melhor, e que com a sua abdicação, assim, de alguma maneira contribuirão para uma melhor representação do País no estrangeiro; de que a opinião pública ao tomar conhecimento desta resolução ficará mais tranquila, deixando portanto de ter apreensões a respeito do possível resultado do encontro Portugal-Espanha, [...] pedem a V. Exª para serem substituídos do grupo nacional, não desejando figurar sequer como reservas”.<br />Como veremos adiante, Artur José Pereira nunca mais teve sequer oportunidade de ser convocado para a Selecção Nacional...<br /><br />A época de 1921/22 também não começou de forma fácil para o Belenenses. A Associação de Futebol de Lisboa resolveu criar duas divisões, “atirando” os clubes mais recentes – incluindo o Belenenses – para a 2ª Divisão.<br /><br />Com o seu já habitual brio o Belenenses sagrou-se sem dificuldades o campeão dessa divisão. Em seguida deveria disputar o título com o vencedor da 1ª divisão. Foi assim que em 26 de Março de 1922 se encontraram (no Lumiar) Belenenses e Sporting para a final. A atmosfera não podia ser de maior euforia e também grande confraternização entre as côres adversárias. Antes de se iniciar o jogo, Artur José Pereira e Francisco Stromp, seu velho amigo, abraçaram-se. Porém o jogo foi bastante violento, sucedendo-se as faltas de ambos os lados. O Sporting venceu por 2-0 mas as decisões arbitrais em prejuízo do Belenenses foram consideradas como “bárbaras” pela imprensa da época.<br />Na sequência desse jogo a Associação de Futebol de Lisboa resolveu a 30 de Março suportar e acentuar as injustiças do juíz da partida, determinado a aplicação de diversos castigos, incluindo a suspensão de Artur José Pereira por 6 meses, por alegado “jogo violentíssimo”.<br />Tudo isto provocou simultaneamente revolta e desânimo entre os Belenenses, embora uma vez mais se erguessem para continuar, apesar de todas as (já velhas) tentativas para “afundar” o seu Clube. Quanto a Artur José Pereira, estamos em crer que estivesse bastante agastado com tudo isto, senão mesmo algo farto.<br />Aliás foi nesta altura que Artur José Pereira decidiu terminar a sua carreira como jogador. O polémico jogo com o Sporting foi o último jogo oficial do qual há registo da sua participação.<br /><br />Apesar de tudo e em 18 de Maio de 1922 a AFL decidiu aplicar uma amnistia a todos os clubes e jogadores castigados. Porém a “despedida” de Artur José Pereira consumava-se: em Abril jogou dois jogos amigáveis em visita a Aveiro (como detalharemos adiante); em Junho desse ano não fazia parte do 11 titular que disputou a Taça do Jornal “O Século”; em Setembro jogou os dois encontros amigáveis que se disputaram em mais uma visita ao Porto (já era tradição anual!); mas para o campeonato de 1922/23 já não foi inscrito.<br /><br /><strong>O fim de uma carreira, o início de outra - em ambas, um Mestre</strong><br /><br />Acabou assim a carreira de um jogador que para muitos foi considerado o melhor de todos.<br />Assim o destacou de entre todos os outros jogadores Ricardo Ornellas, grande estudioso e consagrado jornalista desportivo (também um dos principais mentores do aparecimento da Selecção Nacional) no seu livro “Números e Nomes do Futebol Português”. Nessa edição, onde se encontra uma fotografia da célebre digressão ao Brasil (em 1913) e ao chegar a vez de nomear Artur José Pereira acrescentou em exclusivo o seguinte epíteto: “o melhor jogador português de todos os tempos”.<br />Curiosamente - e infelizmente, diremos - Artur José Pereira nunca chegou a representar a Selecção Nacional, dado que o único jogo antes da sua retirada foi mesmo o Portugal-Espanha da polémica “anti-Belenense” (que já vimos atrás).<br />Tavares da Silva (também futuro Seleccionador Nacional e jornalista) foi outra grande personalidade que lhe elaborou inequívoco elogio: “Artur José Pereira nunca estudou o jogo pelos livros ou pelo ensino do treinador, conhecia o futebol como ninguém. Foi percursor do jogo moderno, adivinhando por intuição e por instinto tudo o que dizia respeito à táctica e execução”.<br />Da forma similar também se refere Cândido de Oliveira, já em Abril de 1945 em artigo publicado no jornal “A Bola” (do qual Cândido foi fundador). Este destaca e enumera as qualidades técnicas do jogador (e orientador-capitão): “[...] possuía qualidades em que nenhum outro jogador o igualou, a maior de todas definida pela atitude artística. [...] Era completíssimo, perfeitamente ambidextro e com potente remate com os dois pés; jogava primorosamente de cabeça; era um driblador estupendo e tudo isto valorizado por uma combatividade e uma coragem sem limites”. Mas foi mais longe ainda ao destacar, como Tavares da Silva, as qualidades como “cérebro” e organizador de jogo: “Foi um autêntico revolucionário do jogo, imaginando soluções, criando conceitos e sistemas que mais tarde haveriam de chegar até nós trazidos pelos técnicos e livros estrangeiros”.<br />Em suma, para além de qualidades técnicas indiviuais excepcionais, Artur José Pereira também foi muito longe (e muito antes de todos os outros) nas concepções tácticas do próprio jogo, algo que iria demonstrar nos anos seguintes como treinador. A título de exemplo, foi pioneiro – décadas antes de outros – na introdução de um novo sistema táctico já muito semelhante ao WM. Isto quando todos os outros, para além de se limitarem ao tradicional sistema em “pirâmide” (que se manteria em muitas equipas até à década de 40), não pensavam sequer que a implementação de um novo sistema poderia ser uma arma fundamental – priveligiando apenas o aperfeiçoamento das qualidade técnicas. E isto, uma vez mais, vindo de quem não lia ou estudava teorias sobre o jogo.<br /><br />O talento de Artur José Pereira iria continuar, desta vez como treinador de todas as equipas de futebol do Clube, substituindo em determinado momento Henrique Costa para a equipa principal. Nesta circunstância, fez do Belenenses uma autêntica “fábrica de jogadores”. Do escalão mais jovem até à primeira equipa, Artur José Pereira acompanhava cuidadosamente a formação dos jogadores azuis, não tardando em levar muitos para a equipa principal, também eles como grandes jogadores. Cada vez que surgia um rapaz com notável talento era comum comentar-se “este tem o dedo do Artur”; “há ali mão do Artur”. De tal forma que no meio do futebol português Artur José Pereira passou a ser reconhecido para sempre como “Mestre Artur”.<br /><br />Foi ele que descobriu o Pepe e Mariano Amaro, entre muitos outros, de entre os maiores jogadores da história do Belenenses e do futebol português. Relativamente ao primeiro, foi mesmo Artur José Pereira o responsável pela precoce mas gloriosa e famosa estreia (apesar de ciente e receoso da opinião da massa associativa, que ainda mal conhecia o pequeno génio).<br />Ainda assim, Acácio Rosa diria mais tarde que, mesmo como treinador, Artur José Pereira foi até ao final da sua carreira um executante sem par na própria equipa (mesmo contando com o dobro da idade de alguns deles!).<br /><br />Pontualmente Artur José Pereira continuou a participar em jogos amigáveis, deslocando-se por vezes a diversas partes do país para tal. Ainda em Abril de 1922 Mário Duarte conseguiu a sua participação num jogo entre equipas de Aveiro, em que Artur José Pereira seria “reforço” de uma delas. Como conta Mário Duarte esta circunstância teve grande divulgação, havendo cartazes na cidade que anunciavam o jogo, referindo-se a Artur José Pereira como valendo por “meio team”!<br /><br />Com Artur José Pereira como treinador das equipas de futebol os azuis ganharam quatro Campeonatos de Lisboa (1925/26, 1928/29, 1929/30 e 1931/32) e três Campeonatos de Portugal (1926/27, 1928/29 e 1932/33). Finalmente, um palmarés a condizer com o Grande Clube que sonhou. Para mais o Clube contava desde 1928 com um campo também à altura: as Salésias.<br /><br /><strong>O afastamento</strong><br /><br />Passados alguns tempos em que apenas os títulos - e a valia dos jogadores formados - testemunharam a categoria do Mestre Artur, chegaria o triste ano de 1937.<br />Artur José Pereira adoeceu e a recomendação do médico (precisamente o Dr. Virgílio Paula, seu companheiro, amigo e também fundador do Belenenses) foi que deveria recolher-se o máximo possível no leito doméstico: terminou assim a carreira de Artur José Pereira como treinador. E o seu contacto directo com a vida do Clube foi sendo cada vez menor.<br /><br />Perante esta situação – a retirada de Artur José Pereira - foi então que Reis Gonçalves, outro dirigente “lendário” desde a fundação do Clube, muito correcta e respeitosamente solicitou a Artur que designasse o seu sucessor (outros talvez não fizessem o mesmo).<br />Segundo os relatos, Artur José Pereira respondeu: “Falem com o Cândido. É o homem que nos convém nesta altura. E, acima de tudo, é nosso amigo.”. O “Cândido” era Cândido de Oliveira, já nesta altura um reputado jornalista, treinador conceituado e um teórico do futebol sem par. Também ele apaixonado pela Belém da sua juventude, tendo restaurado outra “herança” do futebol da zona com a fundação do Casa Pia (em 1920). E era, de facto, um grande amigo, personificando a velha amizade entre os dois emblemas de Belém.<br />O Engº Reis Gonçalves, cumprindo o desejo de Artur, foi então ao encontro de Cândido de Oliveira (no Café Nicola) - para lhe fazer a proposta. Este como primeira resposta indicou dois ou três outros nomes que pelo seu juízo dariam bons treinadores. Reis Gonçalves insistiu no desejo de Artur José Pereira. Cândido de Oliveira então serenamente respondeu que aceitaria, sim, treinar o Belenenses, mas a remuneração que lhe era prometida deveria ser entregue a Artur José Pereira. Se assim fosse, treinaria até de borla. Um grandioso gesto de amizade e respeito - como poucas vezes se viu.<br />É de referir que nessa altura (desde 1935) Cândido de Oliveira era também o Seleccionador Nacional (cargo que já tinha ocupado entre 1926 e 1929).<br />Cândido de Oliveira conduziu então o Belenenses até ao final da época de 1937/38, tendo assegurado o 3º lugar no Campeonato de Lisboa.<br />Depois disso Cândido de Oliveira teve de honrar justificadamente outros compromissos, pelo que o Belenenses solicitou então a Augusto Silva, o fiel e grande discípulo do Mestre (de quem tinha também o total aval), para que assumisse então o cargo. De igual forma este impôs uma condição fundamental: só aceitaria as funções se Artur José Pereira passasse a receber uma subvenção mensal e vitalícia por parte do Clube. E de facto, assim foi. Na Assembleia Geral de 18 de Agosto de 1938 foram aprovados os termos da proposta de Augusto Silva, que seria já o treinador na época seguinte.<br /><br /><strong>O crepúsculo</strong><br /><br />Infelizmente o estado de saúde de Artur José Pereira agravou-se a cada ano que passava, havendo quem diga que o vício do álcool acelerou a sua degradação. Vivia já retirado numa modesta casa em Linda-a-Velha, subúrbio então ainda campestre (no meio de “terra e flores”, como se dizia).<br /><br />Segundo consta ainda aproveitou essa circunstância para aperfeiçoar os seus dotes de caçador, sendo este o seu entretenimento principal.<br /><br />Em 25 de Dezembro de 1942 os Belenenses resolveram fazer uma grande homenagem ao seu fundador, à qual não sabemos – mas duvidamos – que Artur José Pereira tenha assistido, dada a sua condição cada vez mais precária. Feliz iniciativa, seria uma última e justa recordação do Clube.<br />Volvidos pouco mais que 8 meses sobre aquela homenagem, mais concretamente na alvorada de 6 de Setembro de 1943, faleceu por fim Artur José Pereira.<br />Morreu na companhia da sua esposa e da sua sobrinha, na sua casa em Linda-a-Velha.<br />A doença fatal foi a tuberculose, que na altura ainda ceifava milhares de vidas em Portugal pela inexistência de tratamentos adequados (se fosse hoje...).<br />Dois dias depois (8 de Setembro) deu-se o enterro no Cemitério da Ajuda.<br /><br />Em memória do seu justo “pai” o Clube instituíu por unanimidade da Assembleia Geral (7 de Março de 1945) que 6 de Setembro passaria a ser o “Dia da Saudade Belenenses”, dia em que todos os anos passaria a ser feita uma romagem ao túmulo de Artur José Pereira (ou no Domingo mais próximo), como assim se faz até aos nossos dias.<br /><br />Cruel desencontro, o “seu” Belenenses haveria de vencer cerca de dois anos e meio após a sua morte a maior competição do País. Nessa equipa haveriam de brilhar alguns dos seus pupilos, entre os quais se destacou o grande Mariano Amaro.<br />Outra amarga ironia do destino, Artur José Pereira teria completado em 1944 os 25 anos de sócio (os mesmos que o seu clube). Praticamente todos os seus companheiros de fundação receberam a distinção, mas Artur já não... faltou o sócio nº2...<br /><br />No decurso do ano de 2000, após o falecimento do grande Matateu, decidiu o Belenenses a construção de um Mausoléu no Cemitério da Ajuda onde passaram a repousar os restos mortais dos grandes símbolos do Clube: Pepe, Matateu e claro, Artur José Pereira. A estre ilustre trio se presta hoje homenagem a 23 de Setembro, data da fundação do Clube.<br />A Artur José Pereira foi atribuída a distinção de “Sócio de Mérito” na Assembleia Geral de 8 de Agosto de 1927. Foi o “Sócio de Mérito” nº 2, logo a seguir ao seu amigo Henrique Costa, que por imposição de Artur José Pereira era o sócio nº1.<br />Na Assembleia Geral de 18 de Agosto de 1940 Artur José Pereira foi distinguido como “Sócio Honorário”(com o nº 17).<br /><br /><strong>Epílogo</strong><br /><br />Artur José Pereira foi um génio – o primeiro - antes do tempo. Aquele que foi considerado o melhor de todos os tempos por quem o viu jogar foi entretanto ensombrado – como outros, incluindo Pepe - pelo mágico poder dos meios audiovisuais, que permitiram anos depois ver e rever as proezas de futuros craques. Não existem sequer filmes que nos permitam vislumbrar ou comparar a grandeza de Artur José Pereira com a de outros.<br />Muitos continuaram a considerá-lo o maior mesmo depois da grande aparição de Pepe. Dos que viram Matateu, só muitos poucos e a custo se lembrariam de Artur José Pereira. Não é portanto fácil dizer que - mesmo no Belenenses - Artur tenha sido o melhor de todos. Porventura foi.<br />Mas uma coisa é certa, foi um dos melhores e foi o primeiro. Só isso basta para ser... O MAIOR.<br /><br />Como resumiu de forma sublime Mário Duarte: “Que maior e melhor fundador poderia ter o nosso clube?”<br /><br /><strong>Nota: texto inicialmente publicado na <a href="http://www.blogger.com/www.geocities.com/hpacfb/">página do autor</a>, posteriormente também publicado no <a href="http://www.blogger.com/www.osbelenenses.com/">Site Oficial do Clube</a></div></strong>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-18653593290893323262009-05-27T00:14:00.007+01:002009-06-05T16:08:08.327+01:00Grande Vicente!<div align="justify"><strong>Lenda imortal, coração grande</strong><br /><br />Ao escrever sobre Vicente (recuso o vulgarizante artigo definido) os maiores louvores e elogios que se lhe possam fazer… obrigatoriamente pecam por defeito. Nunca o vi jogar (salvo pelas imagens do Mundial de 66), mas os livros e os testemunhos de outros não deixam margem para dúvidas. Vicente é o arquétipo do ideal Belenenses.<br /><br />Possuidor de capacidades técnicas ímpares e de uma inteligência táctica notabilíssima, se pudesse jogar hoje Vicente desmentiria com facilidade a idéia de que os jogadores de outrora não teriam lugar no futebol actual. Com extrema facilidade. Com uma concentração invulgar, sabia posicionar-se, manter a vista na bola, adivinhar os pensamentos do adversário e fazer os "tackles" no momento exacto, naquela fracção de milésimos de segundo tão difícil de calcular até mesmo para os melhores físicos que se possam reunir (ainda menos outros jogadores de hoje em dia). Assim "cortava" bolas com eficácia de pasmar, quando o adversário ainda mal tinha dado conta da sua presença. Tornou-se mesmo popular a expressão, quase cinematográfica: "Corta, Vicente!"<br /><br />Mas se as qualidades técnicas elevaram Vicente à galeria dos melhores de sempre do Mundo (sim, uma vez mais, nada de exagerado), as qualidades humanas em nada ficavam atrás. Antes, as duas eram complemento evidente, que se traduzia no próprio comportamento em campo. Acanhado, humilde, discreto, Vicente era e é de uma bonomia desconcertante, de uma quase ternura pelo próximo. E com os adversários, em campo, não fazia excepção. Ao falar do Vicente uma das primeiras coisas que o meu Pai se recorda (ele sim, viu-o jogar) era a forma como este jogava sempre, mas sempre sem maldade. E não era apenas a intenção, Vicente nunca ou raramente magoou algum opositor. Mesmo quando pensasse que o tinha feito, era o primeiro a confortar o jogador caído, como se de um irmão de sangue se tratasse. Vejam só, tentem conceber para os dias de hoje um jogador que seja por si só uma autêntica e intransponível muralha defensiva (agora chamam-lhes "trincos", "ferrolhos" ou sei lá o quê) sem nunca recorrer à violência física. Só mesmo algum "craque" de outro mundo, só mesmo alguém com talento infinito. Só mesmo um Vicente, como não os há.<br /><br />Num passado jantar de aniversário do Clube também tive o privilégio de escutar mais um impressionante depoimento de quem viu o Vicente em campo. Foi da parte do grande fadista e Belenenses dos sete costados, Carlos do Carmo (pouco mais velho, vizinho de bairro e aluno da mesma escola que o meu Pai), que contou perante uma embevecida plateia azul como Vicente lhe proporcionava uma peculiar forma de apreciar um jogo de futebol. Confessou Carlos do Carmo que numa daquelas tardes de Domingo decidiu seguir com a vista apenas e só Vicente, abstraindo-se de tudo o resto, do que faziam todos os outros jogadores e a própria bola. Não surpreendentemente, valeu a pena, disse. Valia a pena só ver Vicente jogar. Por tudo o que já referi acima, porque a sua visão e inteligência faziam com que o decurso de um jogo inteiro se concentrasse e palpitasse naquele cérebro, naqueles músculos… como um Deus que se passeia por entre mundanos e impotentes mortais.<br /><br /><br /><strong>A carreira e breve história de um campeão</strong><br /><br />Não, o Belenenses não teve a alegria de ver Vicente integrar uma equipa vencedora do título máximo do futebol nacional. Mas como veremos, é pormenor de somenos. Porque nem valeria afirmar que Vicente merecia um Campeonato Nacional. Um qualquer Campeonato Nacional é que deveria estar à altura de merecer Vicente!<br /><br />Vicente Lucas nasceu em Lourenço Marques (hoje Maputo, capital de Moçambique), no bairro pobre do Alto Mahé, a 24 de Setembro de 1935. Filho de Lucas Matambo, tipógrafo, e de Margarida Heliodoro, era o mais novo de uma numerosa prole (tinha 4 irmãos). Entre os irmãos mais velhos, claro, outra incontornável referência do futebol: o nosso Matateu (Sebastião Lucas da Fonseca - ou Lucas Sebastião, como corrigiu a sua filha Argentina, há tempos).<br />É difícil falar de Vicente sem falar de Matateu, eram do mesmíssimo sangue e foi por influência deste último que o irmão seguiu na mesma profissão e o seguiu até ao Belenenses. E ambos foram futebolistas excepcionais. No entanto Matateu chegou primeiro, vingou, tornou-se goleador de sonho e era um homem extrovertido e idolatrado pelas multidões com a maior naturalidade. Vicente em boa medida era o oposto. Jogador defensivo, introvertido e pouco ou nada ocupado com a sua fama. Por tudo isto e desde a época em que jogaram no Belenenses existe uma injusta tendência para colocar Vicente sob a "sombra" do irmão. Não, as glórias de um e outro são absolutas.<br /><br />Vicente, tal como o irmão, também tinha alcunha no bairro. Só que enquanto "Ma' Tateu" (que em landim significa crosta de pele, talvez por se esfolar frequentemente nos pelados da “bola”) vingou junto das gentes da Metrópole, "Ma' Ndjombo" (que em landim significa muita sorte), a de Vicente, já não.<br /><br />Vicente começou por jogar num clube de bairro, até ingressar como júnior no mesmo clube por onde passara o irmão Matateu, o 1º de Maio, já então filial do Belenenses (ainda é hoje). Havia sido João Belo (Campeão de Portugal pelo Belenenses em 1933) a descobrir o "filão" daquela família.<br />Foi quando já Matateu levava ao delírio as bancadas das Salésias que o nome do seu irmão começou a ser falado. Dizia o irmão mais velho que Vicente ainda era melhor que ele! Começaram então os esforços para juntar os dois em Belém, algo que apesar da maior resistência de Vicente (e da sua mãe), acabou por acontecer.<br />O Belenenses, Lisboa e Portugal rebentavam de ansiedade. Falava-se da vinda de um "Matateu II". Quando Vicente finalmente desembarcou no Cais da Rocha do Conde de Óbidos, a 30 de Junho de 1954, tinha à sua espera uma numerosa comitiva, que incluía não só dirigentes do Clube, o irmão Matateu, mas todo um ajuntamento de associados e curiosos. Foi reportagem de jornal! Ao saber que o estampavam já com o epíteto de "Matateu II", a forte personalidade e o orgulho de Vicente logo o levaram a exclamar: "Matateu II não! Eu sou o Vicente." Uma vez mais, um génio do mesmo sangue, mas outro génio.<br /><br />A partir da estreia - com tão só 19 anos – foi questão de pouco tempo até Vicente encantar os Belenenses, o País e o Mundo. No Belenenses destaca-se a vitória na Taça de Portugal, em 1960.<br /><br />Pela Selecção imortalizou-se também como um dos melhores de sempre. É o 3º jogador do Belenenses com mais internacionalizações (20), atrás apenas do irmão (27) e do igualmente enorme Augusto Silva (21). Mas talvez o feito maior e mais conhecido de todos foi a presença no Mundial de 1966, onde tratou de "secar"… o "Rei", o brasileiro Pelé. Deixo para outra ocasião um relato sobre a brilhante saga de Vicente em Inglaterra, mas aproveito para fazer referência a um artigo que Luís Oliveira deixou no bloghue Canto Azul ao Sul, que traduz bem a grandeza de Vicente e a ajuda a esclarecer certo equívoco quanto à sua responsabilidade por certa lesão do "Rei" nesse Mundial: "A simpatia de Pelé pelo Belenenses".<br /><br />A título de curiosidade, Portugal acabou por ser eliminado pela Inglaterra num desafio em que Vicente… não jogou, alegadamente por não estar em condições físicas. Em surdina, timidamente, houve e há quem assegure que, tivesse Vicente jogado, não teríamos perdido esse jogo e quiçá o Mundial teria sido português. Talvez se Vicente fosse de outro clube esta história fosse diferente…<br />Mas hoje por aqui fico em detalhes sobre a sua carreira, terminada de forma triste… que nos faz pensar na justiça que há neste mundo. Uma daquelas estúpidas e desleais rasteiras da vida… logo a um dos mais leais e bons dos homens.<br /><br /><br /><strong>Vicente hoje</strong><br /><br />Vicente costuma ser presença assídua no Restelo e em efemérides do Clube (em boa-hora este o elege como símbolo máximo). Tive o privilégio de me cruzar com ele algumas vezes, causando-me sempre uma estranha sensação… de arrepios, de rendição absoluta e paralisante. Novamente, como um mortal que se atreve a aproximar de uma divindade. E o bom Vicente sempre tão afável, tão simpático, como se eu e todos os outros afinal fôssemos menos que ele!<br />A primeira vez que estive a seu lado foi num treino de captação, ainda Vicente era responsável nas nossas camadas jovens (fui lá mais por curiosidade, pois nunca na vida me senti talhado para jogador). Nessa tarde constatei como Vicente, apesar da sua generosidade e simpatia, não deixava de ser um mestre rigoroso e disciplinador. Fruto da escola de muitos e excelentes treinadores, logo com o mítico Riera à cabeça, não esquecer...<br />Noutra vez e em almoço da Mailing List da Trafaria, novo encontro. Uma nota: ao desembarcarmos do cacilheiro, vindos de Belém, os homens que estavam no cais (completamente alheios ao evento) não evitaram comentar entre si: "Olha, é aquele, o irmão do Matateu...".<br />Por fim, a última vez que estive com Vicente foi no âmbito da "Volta Azul a Portugal" pela filiais do Belenenses. Em Elvas, uma vez mais, Vicente a fazer as vezes de embaixador do Clube. E que Senhor Embaixador!<br /><br />Costumamos dizer, por rigor, que nenhum técnico ou jogador alguma vez estará acima do Belenenses. Pela lógica, nem faz sentido. Mas Vicente é Enorme como o Belenenses. Hoje e para mim é como se fôsse um 2ª Aniversário do Clube.<br />70 anos é uma bonita idade, mas cá estaremos por muitos mais ainda para juntos festejar novas vitórias!<br /><br />Parabéns Vicente!<br />Parabéns! Obrigado por tudo! Obrigado!<br /><br /><strong>Nota: uma primeira versão deste texto, pequena homenagem por ocasião do 70º aniversário de Vicente, foi publicada pelo autor a 24 de Setembro de 2005 no blogue </strong><a href="http://cantoazulaosul.blogspot.com/"><strong>Canto Azul ao Sul</strong></a> </div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-24882050521833910472009-05-26T23:25:00.017+01:002009-06-05T16:07:54.894+01:00A conquista do Campeonato de 1945/56<div align="justify"><strong>Belenenses Campeão</strong><br /><br />Em 1946 o Belenenses conquistou o Campeonato Nacional da 1ª Divisão: o maior título em futebol, da maior prova do desporto português. Já antes o nosso Clube havia conquistado 3 Campeonatos de Portugal, que, sendo à época a máxima competição, deveriam ser considerados como equivalentes. Contudo, os Campeonatos de Portugal eram disputados no formato que agora conhecemos como de "Taça" (por eliminatórias), enquanto os Campeonatos Nacionais da 1ª Divisão, introduzidos em 1935 e "oficializados" em 1938, consagraram a competição por pontos (todos contra todos). Não sendo essa diferença razão para menosprezar os Campeonatos de Portugal, como é frequente constatar nos diversos órgãos de Comunicação Social, é porém justo dizer que o título conquistado em 1946 terá sido o maior feito do Clube de Futebol "Os Belenenses" até hoje. Para ser Campeão Nacional o Belenenses conseguiu 18 vitórias, um registo que só seria repetido em... 1987/88 (3º lugar), num campeonato já disputado por... 20 equipas! (18 vitórias, 12 empates e 8 derrotas, em 1987/88, contra 18 vitórias, 2 empates e 2 derrotas em 1945/46, num campeonato com 12 equipas).<br />Vamos aqui relembrar e analisar alguns dos aspectos mais determinantes dessa grande conquista.<br /><br /><br /><strong>Portugal e a Europa, depois das Grandes Guerras</strong><br /><br />É curioso constatar que o título de 1946 foi alcançado praticamente um ano depois do fim da 2ª Guerra Mundial na Europa (a vitória final dos aliados sobre o Japão só se sucederia cerca de 3 meses mais tarde), enquanto a fundação do próprio Clube, em 1919, concretizou-se cerca de 10 meses após a declaração do Armistício da 1ª Guerra Mundial.<br />No entanto, como se sabe, as consequências das duas Guerras Mundiais foram distintas para o nosso País. Portugal participou como beligerante na 1ª Guerra Mundial, onde inclusivé combateram alguns dos futuros jogadores do Belenenses, com destaque para Francisco Pereira, irmão do nosso grande fundador, Artur José Pereira (chegou a receber louvor pela bravura demonstrada em Moçambique). No caso da 2ª Guerra Mundial, o nosso país manteve a neutralidade. Embora fossem também tempos difíceis (e a neutralidade se traduzisse numa distribuição de apoios camuflados aos dois blocos beligerantes), não se comparam com os problemas vividos aquando do primeiro conflito.<br /><br />Em 1945 já haviam decorrido cerca de 12 anos sobre a implantação do "Estado Novo", sendo que foi curiosamente nesse mesmo ano que a PVDE (Polícia de Vigilância e Defesa do Estado) foi convertida na famosa PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado).<br />As relações entre o Belenenses e o Estado Novo, contrariamente ao que se veicula com frequência, não se revestiam de nenhuma proximidade especial, muito menos de favorecimento. Nalguns casos sucedeu-se até o contrário. O melhor exemplo envolveu dois dos futuros campeões de 1946, Mariano Amaro e Artur Quaresma.<br />A 30 de Janeiro de 1938, antes de se iniciar um Portugal-Espanha, deu-se um episódio deveras curioso e praticamente desconhecido da maioria, que envolveu 3 jogadores do Belenenses então seleccionados (onde se incluía também Simões, para além de Amaro e Quaresma). Defrontavam-se então Portugal, sob a ditadura de Salazar, e a Espanha de Franco, futuro ditador (ali travava-se ainda a sangrenta guerra civil, pelo que o jogo não foi reconhecido pelas instâncias internacionais do futebol). Assim sendo, tinha-se tornado obrigatória a saudação fascista (naquele tempo "olímpica", mas que servia perfeitamente aos tempos) no alinhamento inicial. E foi então que alguns faltaram à regra: Quaresma ficou em sentido, não erguendo sequer o braço; Simões e Amaro ergueram os punhos cerrados, algo ainda mais afrontoso (parecia a saudação comunista). Juntou-se ainda o guarda-redes Azevedo, do Sporting, que encolheu ligeiramente os dedos (curiosamente, muitos anos mais tarde, Azevedo viria a confessar que era também adepto do Belenenses... para além de vir do Barreiro, como Quaresma). A seguir ao jogo todos eles foram detidos pela polícia política (a PVDE) para interrogatório.<br />Como contou Quaresma uns anos mais tarde (Record, Janeiro de 2004): <blockquote>"Fomos à Pide e eles ficaram. Eu, deixando o braço em baixo, disse que me esquecera de o levantar. Não houve mais problemas porque o Belenenses moveu influências. Nunca fui político, mas embirrava com aquelas coisas do fascismo. O Barreiro era foco de comunistas opositores ao regime e eu era amigo de muitos. Mas fiz aquilo sem premeditação, foi um acto natural."</blockquote><br />Há uns anos, numa tertúlia de Belenenses (promovida pela Mailing List do Belenenses) tivemos o privilégio de contar com a presença de Quaresma, que recordou aquela história, com emoção. Amaro e Simões acabaram também por ser libertados, embora fossem mais “activos” na sua contestação. Mas eram jovens, já famosos, e os bons ofícios de gente ligada ao Clube ajudaram a resolver o caso. Fica ainda o rocambolesco da revista “Stadium”, que publicou uma fotografia “retocada” do alinhamento, com uns toscos dedos esticados acrescentados às mãos dos jogadores! (é caso para falar em censura de dedos censurados – sendo que Quaresma “ganhou” um braço!).<br />Mais adiante falaremos destes jogadores, sem prejuízo do muito que já se escreveu a seu respeito (recomendo em especial os textos publicados no site oficial do Clube).<br />Por agora fica a idéia, indiscutível, que a equipa do Belenenses de 1945/46 contava com elementos nada queridos pelo regime.<br /><br /><br /><strong>O Belenenses já era grande</strong><br /><br />Cingindo-me agora aos aspectos "meramente" desportivos, era um dado adquirido que o Belenenses "pré-1946" era já um Grande. Fundado em 1919 por um dos maiores génios do futebol português, Artur José Pereira, alcançou em poucos anos o topo. E o papel de Artur José Pereira fez-se sentir mesmo até 1946, isto apesar de trágica e ironicamente ter falecido poucos anos antes (em 1943) e de ter abandonado as suas funções de treinador das camadas jovens do Clube em 1937/38 (curiosamente foi em 1945 que Cândido de Oliveira o elegeu como “o melhor jogador português de todos os tempos”).<br />Augusto Silva, o treinador campeão de 1946, era considerado como o maior discípulo de Artur José Pereira. Como jogador, foi o grande líder da equipa após a retirada de Artur, e um dos "Leões de Amesterdão" (Jogos Olímpicos de 1928). Foi também ele que assumiu definitivamente o comando como treinador após a retirada do mestre, após uma breve mas solidária passagem de Cândido de Oliveira (entre outras coisas, fundador do jornal "A Bola" – em 1945, curiosamente - e do Casa Pia Atlético Clube).<br />Augusto Silva e o também ex-jogador azul Rodolfo Faroleiro (treinador principal em 1941/42 e 1942/43, sendo depois o adjunto de Augusto Silva) deram continuidade ao valiosíssimo trabalho de prospecção e formação de novos talentos – a esmagadora maioria ainda “made in Belém” - bem como aos exigentes métodos de treino e preparação física. No entanto, foi ainda o próprio Artur Pereira a descobrir, por exemplo, o talento do grande Mariano Amaro!<br />Não se pode ignorar também o contributo do lendário Scopelli, que revolucionou o futebol português enquanto jogador-treinador do Clube (assumiu o cargo de treinador na época de 1939/40, sucedendo a uma breve passagem de Lippo Hertzka, sendo também o treinador em 1940/41).<br />Augusto Silva retomou o seu cargo como principal treinador para a época de 1944/45, após a curta passagem do húngaro Alexandre Péics.<br /><br />Pelo caminho, o Belenenses conquistou 3 Campeonatos de Portugal (tantos quanto Benfica e só menos um que Porto e Sporting), 5 Campeonatos de Lisboa e uma Taça de Portugal. Aliás, nos triunfos precedentes, obtidos na década de 40 (um Campeonato de Lisboa em 1943/44 e a Taça de Portugal em 1941/42) já haviam estado presentes alguns dos campeões de 1946. Foram os casos de Serafim, Feliciano, Amaro, Quaresma, Gomes, Rafael, Elói e José Pedro, formando assim uma equipa extremamente jovem.<br />Assinale-se também que na mesma época de 1945/46 o Belenenses conquistou também outro Campeonato de Lisboa (o 6º), vincando assim a sua supremacia total na época.<br /><br />Para comprovar ainda o valor da nossa equipa é de destacar o convite feito pelo Real Madrid para a homenagem ao seu jogador Alonso. Em 15 de Maio de 1945, o Belenenses alcançou um espantoso empate em Madrid (2-2), sendo que no jogo de retribuição, nas Salésias, foi conseguido novo brilharete: vitória por 1-0. Mais tarde, depois da conquista do título, viria honra ainda maior: o convite para a inauguração do novo estádio do Real Madrid (o renovado Chamartín, então baptizado "Santiago Bernabéu" - o presidente "merengue", a quem se deveu o convite).<br /><br />No historial do próprio Campeonato Nacional da 1ª Divisão, se até 1946 o Belenenses ainda não o tinha vencido, também é verdade que pouco faltou, adivinhando-se que o título chegaria mais cedo ou mais tarde (como chegou). Senão repare-se nas classificações obtidas:<br /><br />1944/45 – 3º lugar em igualdade pontual com SCP (2º), a 3 (!) pontos do campeão SLB<br />1943/44 – 6º lugar (uma época então considerada como muito “má”, atente-se), atrás de SCP, SLB, Atlético, FCP e Olhanense<br />1942/43 – 3º lugar, 2 pontos (!) atrás do campeão SLB, 1 ponto atrás do SCP (2º)<br />1941/42 – 3º lugar, 8 pontos atrás do campeão SLB, 4 atrás do SCP (2º)<br />1940/41 – 3º lugar, 4 pontos atrás do campeão SCP, 1 ponto atrás do FCP (2º)<br />1939/40 – 3º lugar, 9 pontos atrás do campeão FCP, 7 atrás do SCP (2º)<br />1938/39 (1ª edição “oficial”) – 4º lugar, a 10 pontos do campeão FCP, a 9 do SCP (2º) e 8 do SLB (3º)<br />1937/38 – 5º lugar, a 13 pontos do campeão SLB, a 13 do FCP (2º), 12 do SCP (3º) e 1 do Carcavelinhos (um dos “antepassados” do Atlético)<br />1936/37 – 2º lugar, a 1 (!) ponto do campeão SLB<br />1935/36 – 4º lugar, a 4 pontos do campeão SLB, a 3 do FCP (2º) e 1 do SCP (3º)<br />1934/35 – 4º lugar, a 4 pontos do campeão FCP, a 2 do SCP (2º) e 1 do SLB (3º)<br /><br />Em suma, nas 11 épocas até então disputadas, só por 5 vezes esteve o Belenenses afastado dos 3 primeiros lugares; nas restantes 6 vezes ficou muito, muito próximo do primeiro lugar; e em 3 dessas ocasiões terá mesmo falhado o título por muito, muito pouco (1936/37, 1942/43 e 1944/45). Logo na época anterior (1944/45), não fossem dois golos duvidosamente anulados por um fiscal de linha em jogo contra o Sporting, teríamos sido já campeões (foi… o Benfica).<br />Repito, um sucesso azul adivinhava-se. Ainda que, como já antes e como seria depois, seria de esperar que terceiros tentassem impedi-lo por todos os meios.<br /><br /><br /><strong>O Campeonato</strong><br /><br />O Campeonato de 1945/46 tinha uma dificuldade acrescida. Foi definitivamente abandonado o número de 10 equipas concorrentes (em vigor desde 1942/43, depois de serem 8, e após duas outras tentativas em 1939/40 e 1941/42 [neste caso com 12]), com o alargamento para 12 equipas. Para concretizar o alargamento, apenas havia descido o Salgueiros (último em 1944/45) e foram promovidos Sport Lisboa e Elvas (feito histórico da equipa alentejana), Boavista e Oliveirense.<br /><br />Na primeira volta, o Belenenses cedo “embalou” para o primeiro lugar, só conhecendo a derrota à 8º jornada, no terreno do Benfica (venceu este por 2-0). No campo do Sporting (do Lumiar), na primeira jornada, empatámos (1-1). Novo empate, já só na 7ª jornada, frente ao Atlético.<br />Pelo meio, algumas vitórias expressivas, como se pode constatar na lista completa dessa 1ª volta:<br /><br />1ª jornada – Sporting (fora): E 1-1<br />2ª jornada – Académica (casa): V 7-0<br />3ª jornada – Boavista (casa): V 6-1<br />4ª jornada – Oliveirense (fora): V 0-1<br />5ª jornada – V. Guimarães (casa): V 5-1<br />6ª jornada – V. Setúbal (fora): V 1-4<br />7ª jornada – Atlético (casa): E 2-2<br />8ª jornada – Benfica (fora): D 2-0<br />9ª jornada – FC Porto (casa): V 3-2<br />10ª jornada – Olhanense (fora): D 2-0<br />11ª jornada – SL Elvas (casa): V 5-2<br /><br />O Belenenses resistiu até meados de Fevereiro de 1946 à frente do campeonato, altura em que a derrota em Olhão permitiu a ultrapassagem por Benfica e Sporting. Note-se que a equipa do Olhanense era fortíssima – acabou em 4º lugar! – e aliás o nosso jogador campeão Gomes havia sido recrutado por lá, por exemplo.<br /><br />Destaque ainda para o jogo com o Futebol Clube do Porto. Estando por duas vezes a perder, o Belenenses acabou por dar a volta e vencer por 3-2, com um “hat-trick” de um jovem avançado-centro que havia vindo dos juniores (com 18 anos!) e fazia a sua estreia precisamente nesse dia: Manuel Andrade. Era o elemento mais jovem da equipa, vindo a tornar-se no seu melhor marcador, com 19 golos!<br /><br />Na segunda volta o Belenenses foi… simplesmente implacável. Somou apenas vitórias... até à vitória final!<br /><br />Começou logo por ultrapassar de novo o Sporting (salvo erro treinado pelo próprio Cândido de Oliveira, benfiquista confesso), ao vencer por 2-1 nas Salésias. De acordo com o jornal “A Bola”, conta-se que antes do início do jogo “dirigentes leoninos dirigiram-se ao centro do terreno enlameado para entregaram aos directores 'azuis' uma cigarreira de prata que pertencera a Pepe e que não se soube como fora parar ao Sporting. Por causa dessa mais ou menos grotesca 'cerimónia oficial' a partida começou com quinze minutos de atraso!”. <br />Muito estranho mesmo! Pobre Pepe! Mas terá sido um talismã…<br />A primeira parte acabou sem golos. Depois adiantou-se o Sporting no marcador graças a um infeliz auto-golo de Serafim para a vantagem. Os Belenenses cerraram os dentes e não desistiram. Foi Andrade, o “miúdo”, a conseguir o empate. O golo da vitória foi obra de Rafael. O Sporting ficaria assim definitivamente arredado da “corrida” ao título.<br /><br />Na 15ª jornada há a destacar a goleada infligida à Oliveirense nas Salésias, por 10-0! Este resultado ocupa ainda hoje o 6º lugar no “ranking” de goleadas conseguidas pelo Belenenses em provas oficiais nacionais. Nesta edição do campeonato, porém, o “record” foi para um autêntico massacre do Atlético às mão do Porto, por 11-0!<br /><br />O jogo decisivo para que o Belenenses tomasse a dianteira decorreu na 19ª jornada, com a vitória por 1-0 frente ao Benfica. O jogo realizou-se nas Salésias, por imposição do Belenenses, face à vontade de alguns em deslocar o encontro para o Estádio Nacional, para garantir mais receitas.<br /><br />Na jornada seguinte, o Belenenses passou mais uma “prova de fogo”, derrotando o Porto no Porto por 0-1. Curiosamente, enquanto decorria o Benfica-Boavista, em Lisboa, alguém resolveu lançar o boato que o Belenenses tinha empatado, conseguindo assim animar um encontro que já estava bem “morto” (o resultado já era 4-2 e assim ficou).<br /><br />Aqui fica a lista completa de resultados, até à penúltima jornada:<br /><br />12ª jornada – Sporting (casa): V 2-1<br />13ª jornada – Académica (fora): V 1-3<br />14ª jornada – Boavista (fora): V 1-4<br />15ª jornada – Oliveirense (casa): V 10-0<br />16ª jornada – V. Guimarães (fora): V 2-4<br />17ª jornada – V. Setúbal (casa): V 3-2<br />18ª jornada – Atlético (fora): V 2-4<br />19ª jornada – Benfica (casa): V 1-0<br />20ª jornada – FC Porto (fora): V 0-1<br />21ª jornada – Olhanense (casa): V 6-0<br /><br />Vingada a derrota em Olhão por expressivos 6-0, o Belenenses ficou a uma vitória de distância do tão almejado título. Atrás espreitava o Benfica, com apenas menos um ponto e vantagem no caso de empate pontual.<br /><br /><br /><strong>A épica jornada de Elvas</strong><br /><br />Tudo se conjurou então para um dramático Domingo de futebol. A 26 de Maio de 1946, em Elvas, o Belenenses deveria tentar vencer o Sport Lisboa e Elvas, sendo dada por quase certa a vitória do Benfica frente ao Atlético.<br /><br />Sport Lisboa e Elvas que, como o nome indicava, era filial do próprio Benfica. Consta aliás que os benfiquistas terão enviado um técnico seu para assegurar as melhores condições da equipa do SLE frente ao Belenenses. Em vão, felizmente. Como curiosidade, na época seguinte o SLE, a braços com dificuldades financeiras, pediu auxílio à casa-mãe. Estes, numa postura que já lhes era habitual, disseram que não tinham dinheiro para dar. Profundamente desiludidos com a atitude do Benfica os dirigentes do Sport Elvas decidiram proceder à ruptura com a casa-mãe e à fusão do seu clube com outro clube da cidade, curiosamente também bastante descontente com os “apoios” da sua casa-mãe: o Sporting Clube Elvense, filial do Sporting. Nasceu assim “O Elvas” Clube Alentejano de Desportos, sem filiação! (onde viriam a passar muitos ex-Belenenses).<br /><br />Pelo contrário, o Clube de Futebol “Os Elvenses” era (e ainda é) desde Novembro de 1924 filial do Belenenses - a primeira do Clube! - filiação escolhida na altura por precisamente já existirem duas filiais de outros dois “grandes” de Lisboa. Parte dos elvenses também apoiaram assim o Belenenses naquele jogo. E desde então fortaleceram ainda mais a sua relação com a casa-mãe - ao contrário das filiais dos “vizinhos” de Lisboa! – como eu próprio pude comprovar num almoço de confraternização no âmbito de uma “Volta Azul a Portugal”, promovida pelo Belenenses. Aproveito para saudar de novo não só esses elvenses mas também os azuis de outras localidades que estiveram presentes, como o Crato, Avis e Arronches!<br />A nossa filial elvense é o melhor exemplo da implantação que o Belenenses tinha por todo o país, fruto dos sucessos alcançados logo desde a fundação. E a esse jogo decisivo em Elvas acorreram também adeptos azuis das mais variadas partes.<br /><br />Naquele tempo chegar à “raiana” Elvas desde Lisboa era ainda um desafio considerável, não existindo obviamente a auto-estrada através da qual se faz hoje a ligação em pouco mais de 2 horas. Já existia desde há bastante tempo ligação ferroviária via Entroncamento (como ainda é hoje) mas, avaliando pelos horários (e máquinas) actuais, essa viagem pode levar cerca de 6 horas e meia. Na altura seria mais, seguramente.<br />Quanto aos automóveis, eram na altura um bem só acessível a uma minoria, sendo que a considerável “expedição” azul distribuiu-se assim em muitas “boleias”. A própria equipa do Belenenses teve de ser deslocar em carros particulares, pois naquela altura o Clube ainda não dispunha de autocarro.<br />O percurso terá sido o da Estrada Nacional nº4, tendo passado por Vila Franca, daí até Pegões (ainda EN10), depois seguindo por Vendas Novas, Montemor-o-Novo, Arraiolos (ou Évora), Estremoz, Borba e, finalmente, Elvas. No total, cerca de 230 quilómetros de distância. Considerando que na época uma velocidade máxima de 100 Km/h era ainda uma relativa extravagância (daí a expressão “a 100 à hora”, hoje quase “passo de caracol” para muita gente), estaríamos a falar de quase 5 ou mais horas de viagem.<br /><br />Voltando de novo ao nosso adversário, foi a primeira equipa alentejana a chegar ao Campeonato Nacional (precisamente o de 1945/46), um feito sensacional para a época. “Aguentou-se” no escalão principal até 1950 (já como Elvas CAD desde 1947), cabendo ao Lusitano de Évora retomar a presença do Alentejo alguns anos depois.<br />A estrela de então era um homem da terra (como a totalidade ou quase totalidade da equipa), o avançado-centro Patalino. Posteriormente a própria cidade de Elvas prestou grande homenagem a este jogador (que chegou a ser internacional por 3 vezes, mesmo sendo jogador do Elvas – facto que também perturba os que hoje só concebem uma Selecção a partir dos “três”), inaugurando um busto com a sua figura.<br /><br />Nessa tarde o Belenenses alinhou com: Manuel Capela, Vasco de Oliveira, António Feliciano, Francisco Gomes, Serafim Neves, Mariano Amaro, Mário Coelho, António Elói da Silva, Armando Correia, Artur Quaresma e Rafael Correia. Augusto Silva, como já referimos, era o treinador. Oficial de marinha e figura de grande destaque nas glórias azuis dos anos 20 (foi companheiro de Pepe e também protagonista dos primeiros “quartos de hora” à Belenenses), imprimia aos treinos da equipa o rigor da preparação física militar, um dos principais motivos do sucesso. Mais tarde o guarda-redes Capela justificou mesmo que o posterior êxito “ficara a dever-se às duas duras sessões de treino semanais, «uma de ginástica e outra de bola», que todos os jogadores «faziam com sempre renovado prazer na emoção das Salésias», antes ou depois de mais um dia de trabalho” (A Bola). Augusto Silva que naquela altura - e até ao triunfo de Matateu – era ainda o jogador do Belenenses com mais internacionalizações (21)!<br />Capela (o Guarda-redes), Vasco e Feliciano (os defesas) eram então conhecidos como as “Torres de Belém”, quer pela sua estatura (deveras impressionante a de Capela) quer pela quase inexpugnável muralha defensiva que formavam em campo.<br />Mariano Amaro era o capitão e pelo seu valor se deduzia o grande valor do conjunto. Como médio direito era especialista em “cortar” o jogo dos adversários, “secando” muitas vedetas dos rivais. Tornou-se um dos jogadores mais populares do Belenenses e de Portugal.<br />Francisco Gomes e Serafim completavam uma linha média de respeito. Lá na frente estariam Mário Coelho, Elói, Armando, Quaresma e Rafael. A propósito da forma como jogavam, Quaresma revelou mais tarde uma “gracinha” dos colegas de defesa: "Costumavam dizer que, como trocávamos a bola durante tanto tempo lá à frente, eles até podiam fazer jogos mais descansados!". E ele mesmo, Quaresma, era uma das maiores referências.<br /><br />O jogo não poderia ter começado da pior maneira para o Belenenses: o elvense Patalino inaugurou o marcador com pouco mais de um minuto decorrido. Pior ainda, até ao intervalo o Belenenses foi uma equipa completamente assomada pelos nervos, apática e desorientada. Pelas palavras de Artur Quaresma:<br />“O Patalino marcou e a maioria dos nossos jogadores tremeram. Ao intervalo, o moral estava de rastos. Alguns companheiros ficaram desorientados e até o grande Amaro, o capitão, foi-se abaixo. O Vasco e eu, que éramos mais descontraídos e frios, começámos a puxar por eles.”<br />Amaro, segundo contaram os colegas, chegou às lágrimas, desesperado e desorientado. E foram de facto Vasco e Quaresma, mas também José Pedro e Rafael, os que mais tentaram animar a equipa, mantendo viva a esperança.<br />Na segunda parte e com as notícias dos golos que asseguravam a vitória do Benfica (4-2) o Belenenses finalmente ressuscitou. Com Vasco a dar o “mote”, como relatou Artur Quaresma:<br />“O Vasco mostrou grande vontade de vencer e na segunda parte praticamente ganhou o jogo. Fez uma corrida diabólica pelo lado direito, deu-me a bola e fiz o golo. A equipa começou a animar e conseguiu o 2-1.”<br />Segundo certos registos o golo de Quaresma surgiu aos 66 minutos, enquanto o segundo golo, da autoria de Rafael – também “servido” por Vasco – teria sido aos 75 minutos. Outra versão fala do golo de Quaresma aos 75 minutos com o golo de Rafael “cinco minutos depois”. Neste caso enquadra-se perfeitamente nos famosos “15 minutos à Belenenses”. Mas independentemente dos minutos, foi um final de jogo “à Belenenses”.<br />Em ambos os golos, o ímpeto e a garra de Vasco. Por sinal um adepto adversário ainda o tentou agredir, partindo um chapéu-de-chuva nas suas costas, sem grande efeito (ou com o efeito contrário ao desejado!).<br />No final do jogo os jogadores azuis abraçaram-se no centro do campo, desfeitos em lágrimas. Amaro, o que mais tinha sofrido, foi o que mais exultou. Disse depois Feliciano: “Quando terminou o encontro de Elvas estávamos todos arrasados, completamente exaustos, mas mesmo assim ainda tivemos ânimo para chorar de felicidade, como Madalenas inconsoláveis. Tinham sido os mais emocionantes 15 minutos à Belenenses...”<br /><br />O regresso a Lisboa foi apoteótico. Os carros particulares que transportavam os jogadores logo ficaram retidos no Cais do Sodré. Como contou José Sério, então guarda-redes suplente:<br />“Os carros foram obrigados a parar e o trajecto até Belém foi lento, com muita gente nas ruas a agitar bandeiras".<br />Chegados a Belém foi a vez das obrigatórias três voltas à estátua do “padrinho” Afonso de Albuquerque (“nunca mais se viu uma festa tão bonita na Praça Afonso de Albuquerque”, diria Quaresma). A festa continuou depois na sede do Clube.<br /><br /><br /><strong>Balanço da época</strong><br /><br />Na tabela final as equipas ficaram assim ordenadas:<br /><br />1º Belenenses, 38 pontos<br />2º Benfica, 37 pontos<br />3º Sporting, 32 pontos<br />4º Olhanense, 27 pontos<br />5º Atlético, 21 pontos<br />6º Porto, 20 pontos<br />7º Setúbal, 18 pontos<br />8º Guimarães, 18 pontos<br />9º SL Elvas, 17 pontos<br />10º Académica, 16 pontos<br />11º Boavista, 12 pontos<br />12º Oliveirense, 8 pontos<br /><br />O Belenenses venceu 18 jogos, empatando 2 (1 empate em casa, 1 fora) e perdendo apenas outros 2 (ambos fora). Marcou um total de 74 golos, só sendo superado pelo Benfica (82). Só nas Salésias foram marcados 50 golos, tendo sido a equipa que mais golos marcou em casa. Em matéria de golos sofridos fomos “senhores” absolutos, com apenas 24.<br /><br /><br /><strong>As outras contas do título</strong><br /><br />Segundo o jornal “A Bola”, o título conquistado significou um prejuízo de 282 contos para o Belenenses (supomos que referentes ao exercício de 1946 - e não incluiriam apenas os gastos relacionados com o futebol), o que para a época era considerável. As despesas chegaram a 957 contos, mais que, por exemplo, as do Benfica (915 contos). Outros tempos! No entanto, os benfiquistas contaram com maior volume de receitas, com 834 contos, enquanto o Belenenses havia conseguido apenas 668 contos.<br />No entanto há que realçar alguns aspectos. Em 1945, por exemplo, o lucro do exercício havia sido de 238 contos.<br />Feitas as contas (recorde-se por exemplo que os subsídios mensais aos jogadores não chegavam a 500 escudos e que os prémios haviam sido de 4 000 escudos), chega-se à conclusão que as despesas com plantel e treinador mal superavam metade das despesas totais! Outros tempos também…<br />Em termos de deslocações para fora de Lisboa o campeonato de 1945/46 implicou duas viagens ao Porto, uma a Guimarães, uma a Coimbra, uma a Oliveira de Azeméis, uma a Olhão, uma a Elvas e uma a Setúbal. Nada comparável com os dias de hoje (em número) mas considerando as vias e meios de transporte disponíveis (carros particulares), deveriam ter um peso significativo. Para mais quando as privações do pós-guerra ainda se faziam sentir.<br />Até 1949 o Clube foi diminuindo os seus prejuízos, sendo que nesse exercício voltou a aos lucros (cerca de 65 contos). Era Presidente Acácio Rosa, que alarmado com a proliferação do profissionalismo e a precariedade das receitas conseguiu levar a cabo uma contenção de custos significativa. Pena é que, tendo sido campeões, as receitas não viessem a registar um “salto” para os níveis dos nossos adversários…<br />Um elemento fundamental era o número de sócios. As campanhas até ao título conquistado permitiram um aumento significativo, embora viesse a ser… algo efémero. Chegados aos 9 000 sócios (eram 6 793 em 1945!) foi depois lançada uma campanha para alcançar os 12 000 mas… o crescimento foi lento, muito lento…<br /><br /><strong>Quem eram e o que foi feito dos campeões</strong><br /><br />Salvo erro, dos campeões de 1946 e à data estarão ainda vivos José Sério, António Feliciano, Mário Sério, Artur Quaresma e Manuel Andrade. Aliás a 6 de Maio de 2001, antes de mais um Belenenses-Sporting, foram estes jogadores homenageados pelo Clube, para além de José Pedro, que entretanto e infelizmente já terá falecido. Quanto a Artur Quaresma, é presença assídua no Restelo, tendo eu tido a oportunidade (e o privilégio) de conversar com ele a 17 de Junho de 2000, no chamado “almoço histórico” da Mailing List do Belenenses. Dele falarei adiante.<br /><br />Começando pelas “Torres de Belém”, o guarda-redes Capela infelizmente foi um dos jogadores que de certa forma decepcionou os Belenenses. Pouco tempo depois apareceu na Académica de Coimbra, com o pretexto de prosseguir os seus estudos de Letras. Segundo Homero Serpa esta vontade não era nova e se não fosse um seu tio (um grande Belenense) a interceder em épocas anteriores, mais cedo teria deixado o Belenenses. A única contrapartida que o nosso Clube conseguiu foi a de que caso Capela viesse a sair da Académica, seria apenas para o Belenenses (deixando Sporting, Benfica e Porto sem hipóteses). Não se verificou e Capela ainda chegou a tornar-se uma lenda na Académica, chegando também a internacional (5 vezes). Acabava assim a primeira versão das “Torres de Belém”. Totalizou 51 jogos pelo Belenenses em Campeonatos.<br /><br />Quanto a Vasco, continuou no Belenenses. Em 1949 decidiu terminar a sua carreira, mas Acácio Rosa conseguiu convencê-lo a continuar. Era um jogador frequentemente injustiçado pelo seu temperamento e impetuosidade. No seu regresso, disse:<br />“O público foi, em muitas ocasiões, injusto para comigo. Em quase todos os jogos eu era assobiado, e na maioria das vezes, sem razão. Isto custava-me muito e, creia, era para mim motivo de grande tristeza. Sempre tive a fama de jogador violento, de temperamento exaltado e de outras coisas mais, mas, pode acreditar, nunca joguei com o intento de magoar os adversários! É certo que o entusiasmo com que sempre joguei poderia dar essa impressão, mas que eu tivesse o intento propositado de magoar, de ser violento, não é verdade.”<br />Fez um total de 98 jogos pelo Belenenses em Campeonatos, contando com 2 internacionalizações (em 25 de Maio de 1947 e 21 de Março de 1948). O “Barrote”, como ficou conhecido, veio a falecer a 8 de Março de 2000, merecendo as devidas palavras públicas de apreço por parte do Clube. Quis ao seu Belenenses como poucos. Recebeu por parte do Belenenses, em 1949, a medalha de “Mérito e Valor Desportivo”.<br /><br />Feliciano, por sua vez, protagonizou um dos mais emblemáticos episódios de apego ao Clube. Nascido na Covilhã a 19 de Janeiro de 1922, cedo ficou órfão de pai, vindo a ingressar na Casa Pia. De seguida transcrevemos o texto do jornal “A Bola”, do livro “100 figuras do futebol português”:<br />“Depressa passou para a equipa de honra do Casa Pia. Deu nas vistas e o Benfica interessou-se. Nessa altura já jogava como terceiro-defesa. E foi num jogo com o Benfica, para a Taça de Portugal, nas Salésias, que o seu destino ficou marcado. Alejandro Scopelli assistiu à partida e ficou deslumbrado com o defesa-central. Era o homem que procurava para substituir Tarrio. Mas, através de Miguel Siska, do Porto, outro canto de sereia. «Cheguei a estar hospedado na Pensão Alegria uns 15 dias. Mas senti-me deslocado, muito pequenino ao pé de jogadores como Carlos Pereira, Pinga, Guilhar, Pocas, Novas e, por isso, sem dar cavaco, meti-me no comboio e voltei para Lisboa.»<br />Como Scopelli lhe tinha dito que aparecesse pelas Salésias, foi. Os gansos tinham uma dívida de gratidão a pagar aos homens da Cruz de Cristo: quando, para a Exposição do Mundo Português, o seu campo do Restelo foi destruído por ordem governamental, o Belenenses colocou-lhes as Salésias à disposição. Por isso, para libertarem Feliciano pediram... três contos. Assinou-se o acordo a uma mesa da Brasileira do Chiado, ficando Feliciano com a garantia de um ordenado mensal de 300 escudos. «Nos meus primeiros tempos no Belenenses arranjaram-me um emprego no Grémio dos Armazenistas de Mercearia. O emprego trouxe-me um pequeno problema: eu não tinha um fato para vestir e não podia, como é evidente, ir para o Grémio fardado com o uniforme da Casa Pia. Valeu-me na emergência Francisco Silva [director do Grémio e do... Sporting]. Ofereceu-me um casaco, uma camisa e uma gravata. Estava salva a situação. Com as calças do fardamento, o enxoval ficou completo»...<br />O seu primeiro treinador no Belenenses foi Artur José Pereira, que, apercebendo-se de que Feliciano só chutava com o pé esquerdo, o obrigava a jogar apenas com uma bota calçada. Estreou-se contra a Cuf, com uma vitória por 6-0, numa partida histórica em que Horácio Tellechea marcou os seis golos da equipa e, em 1943/44, alcançou o seu título: campeão de Lisboa. Dois anos depois, com o seu célebre oitavo exército, o Belenenses sagrava-se campeão nacional. Era o tempo das Torres de Belém. Vasco, Feliciano e Serafim.”<br />Feliciano estreou-se com a nossa camisola a 29 de Setembro de 1940. Ele que sentiu a vitória de 1946 como uma “recompensa de Deus por uma partida do destino: não muito tempo antes não pôde alinhar contra a Espanha, no Estádio Nacional, por ter «engordado dois quilos durante o estágio». A mágoa andou consigo durante semanas e semanas. Mas, aquela «tarde mágica» de Elvas tudo apagou.” (A Bola).<br />Mas até aquela altura Feliciano era um jogador que não hesitava em assinar ficha pelo Clube mal acabava a época, sem olhar a nada mais (“nunca lhe pedindo um tostão [ao Belenenses]”). Acontece que como campeão e estando de férias na Corunha, recebeu uma proposta deveras tentadora. O Celta de Vigo (há quem diga que foi o Vasco da Gama, do Brasil, mas isso foi mais tarde – proposta recusada, claro!) adiantou um salário mensal de 3 000 pesetas. Note-se que havia recebido 4 contos só pela conquista do campeonato e recebia 300 escudos mensais do Belenenses para ajudar às despesas! No entanto e antes de tomar uma decisão, foi ter com Acácio Rosa. Ao que parece, ainda foi elaborada uma contra-proposta para o Celta, em que se previa o pagamento de 200 contos ao Belenenses mais 200 contos à cabeça para Feliciano. Mas no fim Acácio Rosa convenceu António Feliciano, implorando-lhe em lágrimas: “Põe-te no meu lugar, António. Estás a pedir-me para deixar ir um ídolo dos nossos adeptos!”. Feliciano, sensibilizado, acedeu: continuou no Belenenses e jamais representaria outro clube. Pela decisão recebeu ainda 5 contos, enquanto manteve o seu emprego no Grémio dos Armazenistas de Mercearia.<br />Em 1947, depois de excelentes exibições na Selecção (incluindo uma memorável vitória por 4-1 sobre a Espanha), chegou a ser considerado pela conceituada revista francesa “L’Équipe” como o melhor central da Europa. Contou 14 internacionalizações, entre 1945 e 1949.<br />A propósito, aqui fica um episódio bem engraçado, como relatado em “100 Figuras do Desporto português” (A Bola): “Quando se estreou na Selecção, o que mais estranhou foi ver os jogadores mais cotados, os ídolos com quem poderia, enfim, privar como par entre pares, a dizerem, amiúde, que estava na hora de irem lavar os dentes. Era a senha secreta para fugirem ao controlo do seleccionador e irem jogar cartas pela noite dentro. Foi na Corunha que fez o seu debute com a camisola das quinas. «Fomos num autocarro especial, como a deslocação maçava e podia dar lugar ao adormecimento dos músculos, apeávamo-nos de vez em quando e fazíamos um pouco de footing com sprints intervalados, à borda da estrada.» Nesse jogo competir-lhe-ia marcar Zarra. Um monstro. Peyroteo casara havia pouco tempo. Tivera permissão para levar a mulher com ele. Em jeito de... lua-de-mel. Pouco antes do jogo a senhora abeirou-se de Feliciano e deu-lhe uma santinha. Para que tivesse sorte. «Fiquei comovido. E nunca mais me separei da santinha. Joguei com ela na algibeira do calção. Saí-me tão bem que o dr. Tavares da Silva se agarrou a mim a chorar.» A santa jamais largaria. Ficou sua mascote.<br />Não muito depois, na vitória de Portugal sobre a França, por 2-1, foi considerado o melhor defesa da Europa e nunca mais se esqueceu da jornalista francesa que lhe pregou um quente beijo como sinal de admiração!”<br />Mais tarde deu-se um outro episódio cómico com Feliciano, tal como se pode ler na mesma publicação do jornal “A Bola”:<br />“Por essa altura, uma das cenas mais incríveis da sua vida. Por Belém correu o rumor de que tinha sido... assassinado. Assassinado fora, de facto, outro desportista, António Feliciano como ele. Foi José Maria Pedroto quem lhe deu a notícia da sua... morte. Feliciano explorava o bar da delegação do Belenenses na Avenida da Liberdade, onde os jogadores almoçavam ao domingo, antes dos jogos. Foi para o jogo. Contra o Estoril. Já toda a gente em Belém sabia que fora boato. Mesmo assim, quando pisou o relvado das Salésias estrugiram as palmas. O Belenenses ganhava ao Estoril por 1-0. Feliciano tentou fazer um rodriguinho, perdeu a bola para Bravo, o primeiro português a transferir-se para Espanha, que marcou o golo do empate. «Os sócios da superior desataram aos berros e eu ouvi, distintamente, os fulanos dizerem: porque é que este gajo não morreu mesmo?»”<br />Já só em 5 de Setembro de 1954 se deu a despedida, com a devida homenagem do Clube. Em sua honra, o Belenenses venceu o Atlético por 4-0. É um dos maiores recordistas do Belenenses, com 294 presenças e 24 golos marcados em Campeonatos. Pouco tempo depois abraçou a carreira de treinador em vários clubes, sendo posteriormente apanhado de surpresa quando se preparava para treinar o Portimonense (1965), com um convite para treinar as camadas jovens do Futebol Clube do Porto. Assim foi, entrando para a história do clube nortenho, ao conquistar vários títulos das camadas jovens. Só em 1988 cessou as suas funções no F.C.P., tendo sido alvo de uma grandiosa homenagem por parte dos portistas em 1985. Em 1986 foi agraciado com a medalha de “Bons Serviços Desportivos”, tendo recebido anteriormente a medalha de “Mérito e Valor Desportivo” por parte do Belenenses. Ainda hoje vive na “Invicta”, com o seu sorriso de sempre.<br /><br />José Sério, como suplente de Capela, não teve em 1945/46 grandes oportunidades (jogou por 3 vezes). No entanto, com a saída de Capela viria a descobrir-se como o “4º mosqueteiro”, o 4º elemento das “Torres de Belém”, na sua versão renovada (Homero Serpa). Viria a realizar 144 jogos de Campeonato pelo Belenenses, em 7 épocas como titular indiscutível. Sob uma ingrata comparação com Capela por vezes não terá tido o reconhecimento devido, mas efectivamente tornou-se num dos guarda-redes com mais história no Clube. Só viria a ser substituído como titular já em 1954, pelo também grande José Pereira (o “Pássaro Azul”, “magriço” de 1966, também ele injustamente criticado muitas vezes). Aliás em número de jogos pelo Belenenses só mesmo José Pereira e o “Imperador” Marco Aurélio conseguiram superar a marca de José Sério. Como já referimos, ainda é um dos poucos sobreviventes de 1946.<br /><br />Quanto a Amaro, viveria ainda momentos de alegrias e tristezas. Este torneiro de metais, rapaz castiço do castiço bairro de Alfama, chegou ao Belenenses para a época de 1934/35, ainda não tinha 20 anos. Ainda nas reservas ocupou várias posições até que o olho clínico de Artur José Pereira – outra vez – o fez “comandante” do centro do terreno. Estreou-se a 15 de Dezembro de 1935 como médio direito. Daí até ser aclamado pela crítica foi um pequeno passo. O jornalista Vítor Silva chamou-o o “Einstein da bola”, epíteto que daria nome a uma monografia publicada pelo Clube, elaborada pelo mesmo Vítor Silva e sob a coordenação de Acácio Rosa. Aqui fica um excerto:<br />“Amaro transmitiu-nos sempre a sensação de que nascera com aquilo dentro de si: um sentido de futebol fácil, fluído, natural, não só quanto a execução, mas, principalmente, quanto a uma extraordinária percepção dimensional do jogo, dentro das quatro linhas do rectângulo. Quase nos apetecia dizer, se não fôssemos ferir certos ouvidos mais sensíveis, que Mariano Amaro foi um pequeno Einstein da bola que, sem o menor esforço ou consumidora determinação, descobriu a quarta dimensão do jogo, dando-lhe uma amplitude que talvez nenhum outro jogador português soube, primeiro imaginar, e, depois, explorar como seria aconselhável.”<br />Recebeu inúmeras ofertas para jogar noutros clubes, mas recusou sempre, para continuar no seu Belenenses. Do livro “100 Figuras do Futebol Português” (A Bola): “Scopelli, dizendo-lhe que tinha lugar em qualquer equipa do Mundo, quis levá-lo para a Argentina. «Estive meio tentado, mas a mulher pediu-me muito para não ir, não fui.» Várias vezes lhe acenaram com muito dinheiro do Sporting. E do F. C. Porto. «Foi o Pinga que me quis levar, disse-me que iria ganhar o mesmo que ele. Nessa altura ele recebia um conto e quinhentos por mês a posta de bacalhau custava 15 tostões.» O coração fê-lo ficar outra vez nas Salésias. E perder muito dinheiro.”<br />Em 1948, porém, a carreira de Amaro como jogador chegaria ao fim de forma triste e algo trágica (fazendo lembrar também Artur José Pereira, quando se viu forçado a abandonar a carreira de treinador). Estava prestes a iniciar-se a final da Taça de Portugal – opondo Belenenses e Sporting – quando pelos altifalantes se soube do impedimento de Amaro, acometido de doença súbita e grave. Já não tinha sido a primeira vez, pois mesmo antes da grande conquista de 1946 (em 1944 e 1945) tinha sido aconselhado pelos médicos a abandonar o jogo. Mas esta seria a última. A sua recuperação já antes tinha sido assunto de comoção nacional, ele que havia chegado a capitão da Selecção, tendo sido internacional por 19 vezes (ainda é hoje o nosso 4º jogador com mais internacionalizações). Consta que a sua vida algo boémia, de noites curtas (ele que tinha o ar “gingão e afadistado”), em nada terá ajudado à tuberculose. Escreveu um dia Aurélio Márcio: “Treinava-se de manhã, passava à tarde pelo café Nicola, saía com a rapariga que escolhia entre as muitas que se lhe davam, terminando a noite na jogatina. E sobre tudo isto era um jogador excepcional…”<br />Mas sobreviveu. Ainda chegou a pensar regressar, com 30 anos, mas não lhe foi possível.<br />A 26 de Novembro de 1948 veio o jogo de despedida, o “último pontapé de Amaro” (Acácio Rosa): “Rodeado pelos jogadores dos dois clubes, Amaro foi a meio campo dar o pontapé simbólico para o começo do desafio. No momento em que o ídolo se encaminhava para a cabina, para não mais voltar, os olhos do público fixam-se no jogador, como a querer gravar aquele momento e a fixar numa só imagem toda a carreira do jogador que a encerra naquele instante: a iniciação, a ascenção, as distinções, o pedestal... e a retirada.”<br />Os clubes em causa eram Belenenses e Benfica, tendo-se realizado também jogos envolvendo colectivos de homenagem, como uma Selecção de 1938 vs. S.L. Saudade e um Sporting - Selecção Nacional de Novos.<br />A 30 de Agosto de 1965 foi-lhe feita nova e grandiosa homenagem, com direito a um “jogo da saudade”, onde se defrontaram os campeões de 1945/46 com os vencedores da Taça de Portugal de 1959/60. Em 1984, o Grupo “Os Mil” instituiu os troféus “Amaro” (na sequência dos troféus “Pepe”), tendo o próprio Mariano estado presente na cerimónia de entrega, com seu o habitual bom humor. Disse então ele que a sua mãe, se fosse viva, ainda o chamaria “capitão Amaro”, confessando por outro lado que tinha deixado de assistir a jogos de futebol, pois já estava farto que todos lhe perguntassem se já estava “melhorzinho”!<br />Fez 174 jogos em Campeonatos pelo Belenenses. Como treinador, passou pelo Elvas (clube sucessor do adversário de 1946!), o Oriental, Covilhã, Torreense e Vitória de Guimarães (onde conseguiu um notável 5º lugar em 1958/59, tendo lutado até ao fim com os primeiros – uma época memorável para os vimaranenses).<br />O “Einstein da bola” veio a falecer a 23 de Maio de 1987 (aos 72 anos), com direito a um minuto de silêncio na jornada seguinte do campeonato em todos os campos do país. O Belenenses justamente e até ao fim da sua vida havia-lhe concedido um suplemento mensal de 25 contos sendo que “pouco antes de morrer recebia de reforma da função pública nove contos por mês, porque só em 1970, falhadas as muitas tentativas como treinador, começara a trabalhar nos telefones.” (A Bola). O Clube agraciou-o com as medalhas de “Bons Serviços e Valor Clubista” e “Mérito e Valor Desportivo”, distinguindo-o como “Sócio de Mérito” em 1964.<br /><br />Outra lenda de fidelidade ao Belenenses foi Serafim, que acabou por ser o recordista de todos os campeões de 1946 e um dos jogadores que mais jogos fez pelo Belenenses. Só para o Campeonato foram quase 300 jogos (298), tendo feito a sua despedida a 11 de Setembro de 1955. Desta forma ainda viria a fazer parte de outras memoráveis equipas do Clube, ao lado de jogadores como Matateu, Vicente e Di Pace. Foi internacional pela Selecção 18 vezes, entre 1945 e 1953. Infelizmente também já terá falecido. Recebeu da parte do Clube a medalha por “Mérito e Valor Desportivo”.<br /><br />Artur Quaresma viria a ser outro exemplo de grande amor ao Belenenses, ele que como já referimos ainda é presença frequente no Restelo, bem como em muitos eventos da vida do Clube. Já referimos o almoço da Mailing List, mas também foi um dos nossos “embaixadores” na recente “Volta Azul a Portugal” pelas filiais.<br />Não havia melhor exemplo de dedicação, de um homem que “despertava de madrugada e ainda noite feita apanhava o cacilheiro [do Barreiro] para estar nas Salésias à hora do treino, trabalhando depois o resto do dia como electricista” (A Bola).<br />Pouco depois do título veio a despedida algo precoce (aos 31 anos), celebrada a 5 de Outubro de 1948. Num jogo de infantis, o Belenenses venceu o Atlético por 2-0. E as camadas jovens viriam a ocupar o seu futuro. Depois, como contou o jornal “Mundo Desportivo”: “O último pontapé oficial de Artur Quaresma foi no jogo da sua despedida, em 5 de Outubro de 1948, frente ao Sporting Clube de Portugal, tendo os azuis ganho por 4-1 e cabendo a Quaresma, depois da marcação do segundo golo, obter também o terceiro e último da sua carreira oficial.<br />Sporting: Azevedo; Moreira e Juvenal; Canário, Marques e Serra Coelho; Jesus Correia, Vasques e Peyroteo; Travassos e Albano.<br />Belenenses: Sério; Figueiredo e Serafim; Rebelo, Feliciano e David Matos; Matos, Nunes, Sidónio, Quaresma e Narciso.<br />Aos 4 minutos, Quaresma serviu Sidónio em magníficas condições, este deixou correr a bola à sua frente e sobre a meia esquerda rematou cruzado ao lado esquerdo de Azevedo: 1-0.<br />Depois:<br />De um despique entre Marques e Sidónio sucedeu que nem um nem outro ficou com a posse da bola e foi Quaresma, em corrida, quem arrancou um remate vitorioso: 2-0.<br />E, logo a seguir em jogada individual Quaresma, fez levantar o público, quando obteve o 3-0!<br />Depois, Quaresma abandonou o futebol, sendo substituído por Pinto de Almeida.<br />No final do jogo Quaresma ofereceu a taça com o seu nome a Serafim, mas este cedeu-a ao Capitão do Sporting, Manuel Marques, gesto que o públcio saudou com fortes aplausos.”<br />Em boa verdade, Quaresma veio a ser um digníssimo sucessor na formação de novos talentos “azuis”, numa notável tradição iniciada pelo próprio Artur José Pereira, passando por outras lendas como Scopelli, Rodolfo Faroleiro e Augusto Silva. Foi-lhe confiada ainda em 1947 pelo Presidente Octávio de Brito a criação das escolas de futebol, a respeito da qual afirmou a um jornalista:<br />“A criação das escolas foi quanto a mim uma das melhores iniciativas do Belenenses, pois é delas que podem sair os futuros bons jogadores devidamente preparados. Num clube como o Belenenses a missão de treinador é muito importante e da maior responsabilidade. Espero, no entanto, com o decorrer do tempo, fazer alguma coisa de proveito para o meu Clube.”<br />Em 1948/49 chegou a assumir o cargo de Treinador principal, conseguindo um bom 3º lugar.<br />E em 2000, precisamente sobre o que resta do saudoso campo das Salésias (ao pé da fatídica baliza de 1954/55), tive a oportunidade de conversar com Quaresma sobre a evolução do treino de jogadores. Confessou ele que não entendia a preparação dos nossos dias, com algumas corridas, uns toques de bola e pouco mais. Recordou as intensas sessões de ginástica a que eram sujeitos os jogadores do seu tempo. Treinos verdadeiramente duros, com a disciplina militar de um Augusto Silva ou o rigor de um Artur José Pereira. Recordemos, aquando de uma das memoráveis deslocações a Madrid o Belenenses chegou a impressionar a imprensa espanhola pela sua força física! Como bem sabemos o futebol português veio a menosprezar esses atributos, em detrimento da “técnica” (mais “brinca-na-areia”), algo que em anos vindouros limitaria a nossa Selecção e certas equipas em confrontos internacionais.<br />Quaresma contou-nos também uma outra história engraçadíssima. Parece que aos seus pupilos costumava dizer que um verdadeiro futebolista também se reconhecia pela forma… de andar! Não podia andar “à toureiro” (com os pés “para dentro”), nem “à padeiro” (com os pés virados “para fora”). Teria de ter, por assim dizer, uma forma de andar “normal”, equilibrada e fluída. Bela memória a desse almoço, em que recordou com lágrimas os companheiros já desaparecidos mais as agruras com a PIDE/PVDE.<br />Quaresma realizou um total de 154 jogos em Campeonatos, com uma impressionante marca de 71 golos! Foi internacional por 5 vezes, entre 1937 e 1946. Recebeu da parte do Clube a medalha por “Mérito e Valor Desportivo”.<br /><br />Rafael Correia foi outro “caso” especial. Logo quando terminou o histórico jogo de Elvas, no meio de toda a emoção, decidiu ali mesmo que era já altura de abandonar o futebol, “para poder sair em beleza – campeão”, confidenciando depois que nunca julgara possível chorar-se, assim, de alegria, como naquele momento (A Bola). O verdadeiro terror das balizas adversárias, que jogava em toda a linha atacante e possuía poder de remate tremendo, consumou a sua despedida a 28 de Maio de 1948, com estas palavras: “Eu no Belenenses joguei sempre por gosto. Noutro clube, estou certo que me aborrecia de um futebol jogado por obrigação – e então teria de abandonar a actividade porque não era do meu feitio saltitar de clube para clube.”<br />A sua festa de despedida foi simples, “tão simples como sempre foi o Rafael. Festa de família, festa de amigos – poderemos dizer.” (Acácio Rosa):<br />“A abrir: um Oriental - Atlético, ganho pelo primeiro por 2-1.<br />Depois os miúdos azuis e um misto dos outros clubes. Um empate a zero foi o resultado do encontro entre os 22 futuros “ases”; os 22 futuros “Rafaeis”.<br />A seguir à cerimónia de despedida, o Dr. Octávio de Brito, em palavras de grande eloquência e fervor clubista, fez a apologia da ideia desportiva e o elogio do homenageado, enquanto Rafael ladeado por Francisco Ferreira e Bernardo Soares, depunha flores no monumento a Pepe.<br />Depois, viu-se Rafael assoberbado de flores e presentes.<br />Por último o jogo “O Elvas” [novamente, o sucessor do adversário de 1946] – Belenenses. Venceram os alentejanos por 3-2. Pela equipa do clube alinharam Gilberto, Eloy e Franklin, antigos companheiros de Rafael.”<br />Internacional por 6 vezes, realizou um total de 16 épocas seguidas no Belenenses, com 126 jogos para o Campeonato e a fantástica fasquia de 86 golos marcados!<br />Viria a falecer, ao que consta, em “condições trágicas” (Homero Serpa). Recebeu da parte do Clube a medalha por “Mérito e Valor Desportivo”.<br /><br />Sobre os restantes heróis de 1945/46 pouco podemos adiantar, sendo mais escassas as informações. Eis o que conseguimos apurar:<br /><br />Francisco Gomes, jogador salvo erro vindo do Olhanense (então pujante), realizou um total de 145 jogos para Campeonatos, tendo marcado 15 golos. Instalou-se em Belém, acarinhado como mais um do bairro. Ao que parece, também já terá falecido. Recebeu da parte do Clube a medalha por “Mérito e Valor Desportivo”.<br /><br />António Elói (ou Eloy) da Silva viria a completar 87 jogos de Campeonato pelo Belenenses, com 37 golos marcados. Curiosamente num espaço de notícias da internet pude descobrir o depoimento de quem se diz ser filho de Elói (Alfredo Silva). Segundo as informações recolhidas, Elói terá sido ainda jogador do Braga, vindo a falecer por volta de 1980. Recebeu a medalha do Clube por “Mérito e Valor Desportivo”.<br /><br />Quanto a José Pedro, Artur Quaresma viria a considerar que, junto dele próprio, de Elói, Rafael e Franklin (já não jogava no Belenenses em 1945/46), foram “a melhor linha avançada da história do clube e, pela qualidade, uma das melhores do futebol português.”<br />Segundo outros testemunhos (jornal Record), José Pedro foi “um artista de grande visão, driblador extraordinário que tratava a bola por tu e para quem o futebol não tinha segredos”.<br />Era considerando o mais "argentino" dos jogadores campeões, herdeiro da magia de Scopelli.<br />Fui informado através do nosso prezado consócio Pedro Patrão que José Pedro Bazaliza também já terá falecido. Fez 81 jogos de Campeonato, com um registo 42 golos marcados.<br /><br />Armando Correia, “um passador exímio”, fez um total de 50 jogos em Campeonatos, com uma marca de 33 golos.<br /><br />Mário Coelho viria a totalizar 56 jogos em Campeonatos, com uma marca de 24 golos.<br /><br />Mário Sério (salvo erro irmão de José Sério e também ainda vivo), Francisco Martins e António Martinho, ao que parece, não terão feito muito mais jogos pelo Belenenses (Mário Sério: 18 jogos, 1 golo; Francisco Martins: 11 jogos; António Martinho: 7 jogos, 4 golos).<br /><br />Quanto a Manuel Andrade, a “revelação-prodígio” de 1945/46, titular até ao fim do Campeonato depois da sua auspiciosa estreia contra o Porto, terá feito um total de 37 jogos (presumimos que apenas na época seguinte), tendo marcado um total muito interessante de 27 golos. Em 2007 conseguimos notícias suas, por uma entrevista concedida a um jornal da sua terra (Madeira). Vale a pena transcrever alguns excertos do artigo:<br /><blockquote>"Para alguns madeirenses, o nome de Manuel Basílio Ferreira Andrade, nascido em São Gonçalo, freguesia do Funchal, a 23 de Maio de 1927, pode não dizer muita coisa.<br />Mas, se falarmos do avançado-centro que em 1946 apontou 19 golos, em 14 jogos, ao serviço do Belenenses, e foi um dos grandes responsáveis pelo único título de campeão nacional de futebol da I Divisão até ao momento conquistado pela equipa do Restelo, serão muitos os que se lembrarão. (...) O ano de 1946 é, sem dúvida, a melhor recordação que este jogador madeirense pode ter. "Fiz a minha estreia na primeira categoria do Belenenses nesse ano, frente ao FC Porto. Estávamos a perder por 0-2 e consegui marcar três golos que deram a vitória à equipa".<br />"Contudo, o melhor momento estava para vir, pois três dias depois de completar 19 anos (26 de Maio), o Belenenses ganhou ao Elvas por 2-1 e conquistámos o título nacional. Sem dúvida, a melhor prenda de aniversário que já tive até ao momento", adiantou, com um grande sorriso.<br />Já em relação à final da Taça de Portugal, marcada para amanhã (Maio de 2007), em que o Belenenses irá medir forças com o Sporting, o antigo goleador do Restelo está a 'torcer' pela 'Cruz de Cristo', apesar de ter um carinho também pelo Sporting, onde jogou na época de 1948/1949.<br />Manuel Andrade está ciente das profundas mudanças verificadas no futebol entre a década de 50 e a actualidade. Contudo, admite que algo deveria ainda perdurar, nomeadamente a entrega e o amor à camisola dos jogadores, aspectos que existem pouco no futebol de agora.<br />"Nós não éramos profissionais e recebíamos 1.200 escudos por mês. No entanto, os jogadores possuíam uma mentalidade muito forte dentro de campo, uma técnica invejável e lutavam até à exaustão".<br />"Situações que hoje em dia existem pouco no futebol português e onde são poucos os jogadores que são autênticos profissionais. Penso que 75% dos atletas são apenas semiprofissionais e interessam-se muito mais em receber o ordenado no final do mês do que suar a camisola", acrescentou, ainda.<br />A título de exemplo, o avançado do Futebol Clube Os Belenenses admite que "muitos jogadores portugueses da actualidade não teriam lugar nas reservas de muitos clubes dos anos 50".<br />Manuel Andrade esteve poucos anos no futebol sénior: estreou-se em 1946 no Belenenses, onde ficou até 1949, altura em que a vinda do treinador argentino Scopelli foi motivo para mudar de ares.<br />"Sempre joguei como avançado e com a vinda de Scopelli, para além de ir para a equipa de reservas, fui colocado como defesa direito, um lugar que não era para mim. Ainda me lembro dos treinos conjuntos onde, para mostrar que era avançado, marcava golos na própria baliza do lado direito do campo. Uma situação que não foi entendida pelo treinador, pelo que optei por ir para o Sporting". Em Alvalade, Manuel Andrade jogou durante uma época, ainda ao lado dos cinco violinos, mas devido a questões profissionais, acabou por sair para o Estoril Praia, onde veio a terminar a sua carreira.<br />Ao nível dos craques do desporto-rei, Manuel Andrade relembra o seu colega do Belenenses, Amaro: "Para mim, o símbolo do Belenenses não é o Matateu mas sim Amaro, um jogador fora de série"."</blockquote><br /><br />Sabemos que em 1965, aquando da homenagem a Mariano Amaro, alinharam por uma das equipas do “jogo da saudade”: Capela, Vasco, Feliciano, Amaro (o próprio), Quaresma, Serafim, Mário Coelho, Elói, Armando, José Pedro, Andrade, Martinho e Mário Sério. Por outro lado em 1984, aquando da entrega dos troféus “Amaro”, é feita a referência a outros campeões que então ainda estariam vivos, como Capela e Serafim. Estranhamente nem estes nem outros dos sobreviventes foram convidados para essa cerimónia, onde esteve apenas o próprio Amaro.<br /><br />Obviamente não podemos esquecer Augusto Silva, que com a conquista de 1945/46 acrescentou mais uma brilhante página na história do futebol nacional, ao ser o primeiro treinador português a conseguir o título de Campeão Nacional da 1ª Divisão. O seu grandioso passado como jogador não caberia aqui e agora, como páginas consideráveis que são da história do nosso Belenenses. Sem dúvida, um dos maiores Belenenses de sempre. Sargento da Marinha de Guerra, formou dezenas de autênticos “guerreiros” de azul.<br />Como treinador campeão logo foi convidado para Seleccionador Nacional. Foi ainda o treinador principal do Belenenses para a época de 1946/47 (4º lugar), sendo depois sucedido pelo regressado e igualmente lendário Scopelli. Em 1951/52 Augusto Silva regressaria ao cargo, assegurando boa parte da época como treinador principal. A esse respeito encontrámos um interessante artigo de 1951 onde ainda é visível a “marca” do grande “mestre”:<br /><br />“COMEÇARAM OS TREINOS NAS SALÉSIAS<br />MAS, POR ENQUANTO, APENAS HOUVE EXERCÍCIOS FÍSICOS<br /><br />Em Belém começou o futebol sem bola. Quer dizer: os «azuis» deram já início aos treinos, reservando as duas primeiras semanas deste mês a exercícios físicos. O contacto com a «borracha»... virá depois.<br />A convocação marcada, para quarta-feira, dia 1, ás 8 horas, ginástica.<br />Muito antes daquela hora começaram a chegar os madrugadores, ávidos de pisarem a relva fresca...<br />O «Manel» a todos atender com a mesma diligência, entregando a cada um, camisola, calções, meias e... alpargatas ou sapatos de borracha. Santos Varela, director do campo, sempre atento e zeloso, presenciou a entrega do equipamento.<br />Nos vestiários, o ambiente era familiar. Cruzámos com Augusto Silva.<br />- Há novidade?<br />- Nada de novo.<br />- Quando começam os primeiros pontapés na bola?<br />- Daqui a duas semanas.<br />- Até lá só ginástica, não é verdade?<br />Augusto Silva fez um sinal afirmativo e afastou-se, indo prevenir os jogadores que era chegada à hora de começar o treino.<br />Ás oito horas em ponto os jogadores deram entrada no campo juntamente com o seu professor de ginástica e nosso camarada de trabalho Serradas Duarte. Acompanhava-o o treinador Augusto Silva e o director da secção de futebol Humberto Gonçalves que fez a apresentação do novo mestre aos jogadores.” (Record, 4 de Agosto de 1951)<br /><br />Curiosamente descobrimos também que Augusto Silva chegou a ser treinador principal do Santa Clara, nos Açores (e não foi o único ex-Belenense, por lá passaram também Francisco Ferreira e Júlio Amador).<br />Veio a falecer em 1962, sendo-lhe dedicado um eloquente artigo pelo jornalista Vítor Silva (Acácio Rosa). Foi distinguido como “Sócio de Mérito” em 1927 e também como “Sócio Honorário”, ainda em 1940.<br /><br />Uma palavra ainda para:<br />- Carlos Pama, então o “massagista” de serviço (na verdade o fisioterapeuta de hoje em dia). Começou nas suas funções ainda em 1934, continuando ainda em 1961, então com direito a justa homenagem do Clube. Sucedeu-lhe o não menos brilhante João Silva, que já entrara no Clube em 1943.<br />- O Dr. Octávio de Brito, Presidente do Clube em 1945, que alicerçou um Belenenses competitivo e de reconhecimento internacional, sendo bom exemplo disso as relações privilegiadas que manteve com o Real Madrid; o Dr. Constantino Fernandes, Presidente do Clube em 1946, que também já o havia sido entre 1942 e 1944. Ambos já falecidos.<br />- E por fim, como não poderia deixar de ser, Acácio Rosa, esse mito do nosso Clube que às tantas com este se confundia na identidade. Foi toda uma vida ao serviço do Belenenses. Como se viu acima, teve também um papel determinante na conquista (foi vice-presidente do Clube desde 1945 até 1948) e nas justas homenagens aos campeões de 1945/46. Foi Acácio Rosa, acima de todos, que nunca esqueceu aqueles heróis.<br />A sua vida daria um livro, mas felizmente deixou-nos os seus livros, sobre o seu Belenenses, que mais não são do que o mais fiel retrato do seu legado.<br /><br /><br /><strong>Nota: a primeira versão deste texto foi publicada pelo autor a 26 de Maio de 2005 no blogue <a href="http://cantoazulaosul.blogspot.com/">Canto Azul ao Sul</a></strong> </div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-81077571777519459272009-05-26T23:03:00.002+01:002009-05-27T23:12:54.663+01:00SÉRIE: Cinquentenário do Estádio do Restelo - Capítulo I - 4ª parte<div align="justify"><strong>Capítulo I: Antepassados do Estádio do Restelo<br />4ª parte: o adeus às Salésias</strong><br /><br />No seguimento do «ultimato» de 1946 não foi fácil nem pacífica a escolha do local para o novo estádio do Belenenses, como veremos detalhadamente no capítulo seguinte.<br /><br />Quando em 1948 ficou finalmente resolvida a questão, iniciou-se uma verdadeira corrida contra o tempo, uma vez que o prazo estabelecido para o abandono das Salésias (6 anos) aproximava-se a passos largos… e a tarefa de erguer o novo complexo, como também veremos adiante, parecia ciclópica.<br /><br />A vitória no Nacional de futebol de 1945/46, por sua vez, elevou ainda mais as exigências. Em virtude do final de carreira de muitos dos jogadores campeões - em muitos casos prematuro e até triste, como no caso de Mariano Amaro - a forçosa e difícil renovação do plantel significou o início de um novo ciclo. É certo que a nova «sementeira» já prometia: logo na época de 1946/47 o Belenenses conquistou o seu primeiro Campeonato Nacional de Juniores. Por outro lado e na mesma altura surgiram as escolas de futebol (ainda pioneiras), sob a orientação do campeão Artur Quaresma.<br />Mas a equipa de «Honra» ressentiu-se.<br /><br />Na época seguinte (1946/47) obteve «apenas» o quarto lugar, a 14 pontos do líder. A época de 1947/48 até foi mais satisfatória, com luta pelo título (o Belenenses terminou em terceiro, a apenas 4 pontos do primeiro) e a presença na final da Taça de Portugal. Porém essa mesma final ficaria marcada pelo desolador impedimento de última hora do capitão Amaro (capitão do Belenenses e da Selecção Nacional, note-se), acometido de doença grave. Transtornada, a equipa falhou a oportunidade (com derrota por 3-1 frente ao Sporting). Para cúmulo, o mítico treinador argentino Alejandro Scopelli (para sempre Belenenses do coração) viria a ser despedido em circunstâncias pouco agradáveis.<br /><br />Nas três épocas seguintes a situação da equipa agravou-se progressivamente e, em simultâneo, acentuavam-se as dificuldades financeiras. Depois de novo terceiro lugar na época de 1948/49 (a 7 pontos do primeiro), seguiu-se um quarto lugar na época 1949/50 (a 18 pontos do primeiro) e um 9º lugar em 1950/51 (a 21 pontos do primeiro), a pior classificação do Belenenses até aquela data.<br /><br />Os tempos eram outros. O profissionalismo, não muito antes considerado vergonhoso, passou a padrão vulgar. Em consequência - e embora não fosse propriamente novidade (muito menos no Belenenses) - o recrutamento de talentos além-fronteiras (com preferência para goleadores) afigurava-se como uma vantagem competitiva fundamental. O Belenenses tinha de reagir.<br /><br />O Belenenses reagiu… e bem. Depois de ter conseguido suportar as graves dificuldades financeiras - com rigor e notáveis sacrifícios - recuperou a audácia que tão bem lhe assentava desde nascença. No dia 5 de Maio de 1951 inaugurou uma importantíssima delegação na Avenida da Liberdade (nº 105 – 2º andar), em pleno coração de Lisboa. Embora não fosse a primeira da sua história, viria a ser a mais emblemática e bem sucedida de todas. A sua situação era de tal modo vantajosa que o Clube transferiu para ali os seus serviços de secretaria, instalando também um serviço médico. Tudo isto para estar mais perto de mais adeptos, mas também de boa parte dos seus atletas.<br /><br />No futebol, a «revolução» teve alcunha… um nome que o futebol português jamais esquecerá: em Setembro de 1951 fez a sua estreia Sebastião Lucas da Fonseca, mais conhecido como «Matateu». O ingresso do «Diamante Negro» foi um decisivo ponto de viragem, mais tarde complementado com a chegada de outros jogadores lendários como o argentino Di Pace (Matateu afirmaria, décadas mais tarde: «Eu fui um marcador de golos, mas o Di Pace é que foi o maior de todos») e o não menos genial Vicente Lucas (irmão mais novo do Matateu).<br />As Salésias recuperaram a euforia de outrora, inebriadas por um futebol mágico e arrebatador que de novo arrastava multidões.<br /><br />Entretanto, noutras áreas do Clube, devemos assinalar ainda:<br />- a inauguração de uma nova e impressionante Sala de Troféus, por ocasião do 34º aniversário;<br />- a criação de uma pista de ciclismo nas Salésias (sem custos para o clube), devidamente acompanhada por um fulgurante regresso às competições, com destaque óbvio para a Volta a Portugal;<br />- as brilhantes vitórias no atletismo, com a conquista de vários campeonatos por equipas (femininos), vários títulos individuais e o estabelecimento de inúmeros recordes. À cabeça do sucesso, um nome para nunca esquecer: Georgete Duarte.<br />E, mais importante ainda, o novo estádio tornava-se realidade. Devido aos compreensíveis atrasos no arranque e execução da obra (como veremos adiante), o Belenenses conseguiu o adiamento do severo prazo imposto pela CML para o abandono do Estádio José Manuel Soares. 1956 seria o ano do adeus.<br /><br />Como a saudade não consegue muitas vezes virar costas à tristeza, quis o destino que entre as últimas recordações das Salésias se intrometesse um episódio amargo… talvez o mais amargo da história do Belenenses.<br /><br />Provida de jogadores fenomenais (como os que referimos atrás – Matateu, Di Pace ou Vicente), a equipa de futebol chegou à última jornada do Campeonato Nacional de 1954/55 em primeiro lugar...<br /><br />...com um ponto de vantagem sobre o segundo classificado, o Benfica. O Belenenses deveria levar de vencida o Sporting, já que a vitória do Benfica no seu jogo (frente ao Atlético) parecia mais que certa. Esta mesma certeza ditava que os sportinguistas já não tivessem qualquer esperança de ser campeões, mesmo que derrotassem o Belenenses (ficariam a um ponto dos «encarnados»).<br /><br />O desfecho foi terrível. A poucos minutos do fim do jogo, o Belenenses vencia por 2-1 e já se fazia a festa nas Salésias. O resultado já deveria ser mais dilatado, uma vez que o árbitro preferiu ignorar um lance em que o guarda-redes leonino defendeu um remate de Matateu… para além da linha de golo. O juiz de linha correu para o centro do terreno. O próprio guardião do Sporting viria a reconhecer que tinha sido golo. Mas de nada valeram as desesperadas súplicas do «Diamante Negro». Quando já só restavam apenas quatro minutos, o Belenenses sofreu o golo do empate numa jogada absurdamente simples.<br />Consumada a vitória do Benfica, as Salésias inundaram-se de lágrimas.<br /><br />Como consolação, a conquista da segunda Bola de Prata por Matateu (que já havia conquistado a primeira de todas, dois anos antes) e a participação na prestigiada Taça Latina, a maior competição a nível europeu de então. O Belenenses não conseguiu levar de vencida em Paris os poderosos Real Madrid (que venceria nas épocas seguintes as primeiras cinco edições da Taça dos Campeões Europeus) e AC Milan… mas também a Europa rendeu-se a Matateu.<br /><br />O título de 1955/56, última época completa nas Salésias, foi para o Futebol Clube do Porto (cuja última conquista datava de 1940), terminando o Belenenses em 3º lugar.<br />Ainda ensombrados pela tremenda desilusão de Abril de 1955, assim foram os últimos dias no já saudoso campo.<br /><br />O último encontro internacional decorreu a 31 de Maio de 1956, frente ao Sevilha, que curiosamente havia sido o adversário no primeiro, 35 anos antes.<br />O último jogo do Belenenses no Estádio José Manuel Soares realizou-se na primeira jornada do Campeonato Nacional, a 9 de Setembro do 1956. Praticamente cumpridos 29 anos sobre o primeiro jogo oficial ali realizado, após a conquista de centenas de títulos em diversas modalidades, cerca de vinte mil Belenenses acenaram adeus às Salésias presenciando uma vitória por 4-2 frente ao Atlético.<br /><br />No dia 23 de Setembro seguinte, data da inauguração do novo estádio, o Clube fez a despedida formal. Às 11 horas da manhã foi prestada homenagem a José Manuel Soares, o «Pepe», cujo monumento só mais tarde seria trasladado para o actual local. Seguidamente coube ao Presidente da Direcção arrear a bandeira e dar início ao numeroso cortejo em direcção ao Restelo, afastando-se derradeiramente a multidão do mágico recinto que tantas vezes havia colorido de alegria em azul.<br /><br />O destino final das Salésias foi bem cruel para a saudade Belenense. Afinal nunca se ergueram prédios de habitação sobre o relvado que certos génios impregnaram de recordações maravilhosas. Não se fizeram jardins sobre o comprimento da pista que desafiou velozes campeões. Volvidas seis décadas sobre a sua sentença, as Salésias não foram afinal «imoladas às exigências do plano de urbanização da Capital do Império». Foram imoladas sim, mas para dar lugar a nada.<br />O campo ainda lá está… sem relva que se veja. Conserva umas velhas balizas, quais esqueletos fantasmagóricos. Ainda se vislumbra a velha pista de cinza, agora moldura de um baldio. No peão, barracas. No lugar da grande bancada, uma vaga ruela.<br /><br />Recentemente (entre 2000 e 2004) a Direcção do Clube promoveu romarias ao local do antigo estádio (incluindo a realização de treinos simbólicos) no âmbito das comemorações de aniversário do Belenenses. O propósito foi o de homenagear campeões do passado, mas também sensibilizar os proprietários (Casa Pia de Lisboa) e a Câmara Municipal para que o espaço pudesse ser recuperado para o desporto. Ao que parece… em vão.<br />Numa das romarias, em 2002, foi descerrada uma placa que lembra o que pode: «C.F. OS BELENENSES / ESTÁDIO DAS SALÉSIAS / 1º CAMPO RELVADO DE PORTUGAL / 29-1-1928 A 09-09-1956».<br /><br />No Restelo é ainda o monumento ao Pepe que melhor recorda aquele passado glorioso. Assim já o desejava Acácio Rosa em 1952:<br />«Mantém-se viva a nossa saudade – que será eterna – e a sua figura, o seu nome, a sua imagem hão-de acompanhar-nos das Salésias – Estádio José Manuel Soares – para o Restelo, porque a vida deste garoto, - e que grande jogador! – personifica a chama do idealismo e o fervor da fé belenense.»<br /><br />30 anos depois da estreia de José Manuel Soares, caberia ao novo herói do «povo» azul (Matateu) abrir com a mesma chave de ouro a nova porta para o futuro do Belenenses… no Estádio do Restelo.</div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-1771524347069096662009-05-26T23:01:00.002+01:002009-05-27T23:12:24.540+01:00SÉRIE: Cinquentenário do Estádio do Restelo - Capítulo I - 3ª parte<div align="justify"><strong>Capítulo I: Antepassados do Estádio do Restelo<br />3ª parte: glória e ameaça sobre as Salésias</strong><br /><br />No final da década de 30, o Estádio José Manuel Soares era a «sala de visitas» do futebol português. Era, com toda a naturalidade, a «casa» da Selecção Nacional. E em 25 de Junho de 1939...<br /><br />...coube-lhe nova e grande honra: jogou-se ali a primeira final da Taça de Portugal (vencida pela Académica de Coimbra).<br />Cumpre destacar que até à inauguração do Estádio Nacional (em 1944) as Salésias também foram uma verdadeira «casa» da Taça de Portugal, tendo sido o palco de 5 finais (a última delas a 1 de Julho de 1945). A título de curiosidade, foi numa das duas finais que não se realizaram nas Salésias (mas sim no estádio do Lumiar) que o Belenenses venceu a sua primeira Taça de Portugal, como veremos adiante.<br /><br />Era assim um estádio familiar às multidões. Veja-se outro exemplo, este ocorrido ainda em 12 de Fevereiro de 1939: para corresponder à afluência de um Portugal-Suíça o estádio passou a dispôr de mais 5 000 (!) lugares no peão.<br /><br />Em 1940 foi inaugurado um evento que alterou radicalmente a zona ribeirinha de Belém: a Exposição do Mundo Português. Parecia passar ao lado do Belenenses, que conservava as Salésias. No entanto não era bem assim. Era um sinal do frenesim que ocupava urbanistas e construtores na renovação de Lisboa. Pouco prometia ser poupado e os estádios de futebol estavam longe de ser excepção.<br />Desde logo e por causa da Exposição o Casa Pia teve de deixar o seu Campo do Restelo, dando lugar a um efémero parque de diversões anexo ao recinto do evento: não mais voltaria a Belém. Isto embora o Belenenses, solidário e fraternal, tivesse oferecido o seu estádio para que os «gansos» pudessem continuar a jogar - retribuição de tantos outros gestos passados. Aqueles encontraram mais tarde nova «casa», mais longe, do outro lado de Monsanto (o seu actual Estádio Pina Manique). A ameaça ao próprio Belenenses parecia adiada. E em frente seguiu.<br /><br />Ainda em 1940, a pista de atletismo foi beneficiada e o Belenenses chegou a acordo com a Associação de Atletismo de Lisboa para que todas as suas provas oficiais se passassem a realizar exclusivamente no Estádio José Manuel Soares.<br /><br />A sede do Clube, entretanto, «deambulou» pela Rua de Belém (nº 48), pela antiga Travessa da Praça (nº 8) já em 1942, até que em 1943 «parou» pelo nº 534 da Rua da Junqueira (na esquina com a Calçada da Ajuda).<br /><br />Em termos de resultados, sereno mas pujante, o Clube granjeou renovados brilharetes. Em 1942, conquistou a primeira Taça de Portugal em futebol. Foi caso para dizer que à terceira foi de vez, já que nas duas finais anteriores o Belenenses havia sido a equipa vencida. Em 1944 conquistou o seu 5º Campeonato de Lisboa. Em 1945 (15 de Maio) a equipa de futebol brilhou em Madrid perante o Real (empate a duas bolas) e fez história no encontro de retribuição (31 de Maio), batendo os espanhóis nas Salésias com um golo de Rafael.<br /><br />Mas nem só de futebol se engrandeciam os azuis. Nas restantes modalidades sucediam-se as honras, mas também os sacrifícios. Como por exemplo em 1941, quando Acácio Rosa, num de muitos seus gestos de confesso amor pelo ecletismo, pagou do seu bolso a iluminação do campo de basquetebol, inaugurado um ano antes! Em 1945, outro marco da sua «chancela»: a realização do primeiro jogo internacional de Andebol no país.<br /><br />No Atletismo, Natação, Ciclismo, «Rugby», Basquetebol, Andebol, Hóquei em Campo, Ténis ou Ténis de Mesa... das fileiras do Belenenses destacavam-se campeões e recordistas nacionais, alguns deles para sempre consagrados como referências do desporto português.<br /><br />Mas o Clube tinha reservado para si um feito mais estrondoso ainda, na modalidade «rainha». Já senhor de três Campeonatos de Portugal, uma Taça de Portugal e cinco Campeonatos de Lisboa, avançou para a época futebolística de 1945/46 com as maiores expectativas, que não foram goradas: o Belenenses sagrou-se pela primeira vez Campeão Nacional da 1ª Divisão de Futebol, para além de ter conquistado o seu sexto Campeonato de Lisboa. A supremacia!<br /><br />O país ficou a saber afinal que nas Salésias estavam três «Torres de Belém» a guardar o Tejo: Capela, Feliciano e Vasco de Oliveira (com Serafim das Neves, por vezes, a fechar um «quarteto»). Três baluartes transformados em formidável muralha defensiva. Como médio direito, um «Einstein da bola», assim chamaram o genial Mariano Amaro. A estes juntavam-se os vitoriosos campeões Francisco Gomes, Artur Quaresma, Armando Correia, Rafael Correia, Manuel Andrade, José Pedro Bazaliza, António Elói, Mário Coelho, José Sério, Francisco Martins, Mário Sério e António Martinho.<br />A comandar esta «constelação», o primeiro treinador português a conseguir conquistar um campeonato nacional: Augusto Silva.<br /><br />Com todos os jogos em casa disputados nas Salésias, só um deles não resultou em vitória (empate frente ao Atlético). Contra a Oliveirense, houve golos com fartura: 10-0...<br /><br />Mas, a propósito, lembramos que o «record» do conjunto dos Campeonatos Nacionais e Primeira Liga fora estabelecido na época anterior… numa vitória do Belenenses sobre a Académica de Coimbra por 15-2! Mais uma marca histórica do futebol português «fabricada» nas Salésias, que se mantém insuperada até hoje.<br /><br />À beira de completar 30 anos de história, o Belenenses colocava-se definitivamente no pedestal dos grandes do desporto português. Com as vitórias no futebol, naturalmente, cresceu a massa adepta. Já em 1933, por altura da conquista do terceiro Campeonato de Portugal (mais do que qualquer outro clube conseguiu até então), havia sucedido algo semelhante.<br /><br />Entre 1942 e 1944, pese a fraca clasificação do futebol neste último ano (um 6º lugar, até então a pior classificação de sempre, preocupando seriamente os dirigentes), a Direcção do Clube podia orgulhar-se de ter quase triplicado o número de sócios contribuintes, de 1721 para 4185. O objectivo seguinte seria chegar aos 5000 sócios. Com a valia da equipa e os triunfos, pareceu até banal (mas não o foi, claro): em 1945 contavam-se 6793 sócios, em 1946, 8498 sócios (!) e em 1947, 9125 sócios! Em 5 anos o Belenenses conseguiu mais do que quintuplicar o seu número de associados!<br /><br />Por outro lado, a presença de adeptos Belenenses no resto do país (e até no estrangeiro) não parava de aumentar. Quase 20 anos depois do aparecimento dos primeiros clubes filiados, em 1946 eram já 39 as filiais e delegações!<br /><br />Com tamanho afluxo de novos «Beléns», os dirigentes sentiam crescer as responsabilidades do Clube. Era preciso manter o nível competitivo do futebol mas também atender à prática desportiva em geral. Assim sendo projectaram-se novas valências para o parque desportivo.<br /><br />Logo em Maio de 1946 – quase em simultâneo com a conquista do Campeonato Nacional de futebol – o Clube remeteu à Câmara Municipal de Lisboa um pedido de autorização para efectuar melhorias no complexo, onde se incluía a construção de um ginásio coberto destinado aos filhos dos sócios. A resposta da edilidade chegou através de despacho publicado no Diário Municipal, no dia 17 de Junho seguinte.<br /><br />No referido despacho era concedida a autorização para tudo o que havia sido requerido, com um senão. E que senão! A Câmara Municipal de Lisboa notificou o Belenenses de que só poderia dispôr das instalações desportivas das Salésias por mais seis anos, findos os quais teria de abandoná-las! Assim, sem mais nem menos, qual faca apertada à garganta!<br /><br />Após 20 anos de labor, enlevo e obra feita sem par, o Belenenses, que por ironia e inocentemente propunha novas melhorias, viu-se na iminência de ser despojado de tudo.<br />Como veremos no capítulo seguinte, a intenção de «deslocar» os estádios de futebol (não só as Salésias) não era nova. Mas o momento e a forma deixavam transparecer outras intenções, falando-se de invejas alheias causadas pelo notório sucesso e crescimento do Clube em todas as frentes.<br />Pouco depois veio a saber-se qual era a real intenção da Câmara Municipal: dar passo à urbanização da zona. Mas por ora, no presente capítulo, trataremos de acompanhar o que foi feito do Estádio José Manuel Soares, até ao dia em que teve de ser efectivamente abandonado pelo Belenenses.<br /><br />Perante aquela aberrante contingência, quase todas as melhorias previstas acabaram por ser descartadas, sendo assim evitada despesa inútil… que poderia fazer falta para a solução do novo campo desportivo. No entanto, por entender ser da maior premência e benefício, o Belenenses persistiu na construção do ginásio coberto, que viria a ser inaugurado em Janeiro do ano seguinte.<br /><br />Ainda em 1947, enquanto o Belenenses sofria pelo destino da sua «casa», surgiu o convite para ser visita de honra na inauguração da «casa» de outrém. Não era um convite qualquer de um clube qualquer. O poderoso Real Madrid, reconhecendo o Belenenses como clube cimeiro em Portugal – mas também já como velho amigo – queria a sua presença na estreia do seu novo Estádio de Chamartin.<br /><br />A 14 de Dezembro desse mesmo ano cumpriu-se o inolvidável privilégio, com uma exibição de gala que deixaria Madrid deslumbrada pelos azuis de Lisboa. O resultado final foi uma derrota por 3-1 (depois dos sucessos de 1945), mas o «caseirismo» do árbitro do encontro e a impressionante valia do Belenenses não passaram despercebidos à própria (e exigente) imprensa do país vizinho.<br /><br />Curioso, irónico. Defrontaram-se as mais fortes equipas dos dois lados da fronteira. Uma inaugurava o maior estádio da Península. A outra, o Belenenses, iria perder o seu… ainda sem certezas quanto ao futuro.</div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-88367902291376079932009-05-26T22:42:00.002+01:002009-05-27T23:12:01.038+01:00SÉRIE: Cinquentenário do Estádio do Restelo - Capítulo I - 2ª parte<div align="justify"><strong>Capítulo I: Antepassados do Estádio do Restelo<br />2ª parte: as Salésias - Estádio José Manuel Soares<br /></strong><br />Em 6 Novembro de 1927 o Belenenses cumpriu a primeira parte daquilo a que se tinha proposto como afirmação de grandeza e vitalidade: inaugurou a sua sede na Rua da Junqueira (nº188 – 1º).<br /><br />Funcional e bem apetrechada, dispunha de secretaria, um gabinete para a Direcção, sala de bilhar, sala de honra, sala de comissões, sala de jogos, sala de ping-pong e «bufete». Na ocasião distinguiram-se pelo seu suado trabalho: Joaquim d´Almeida, Jaime Alves, Henrique Chelmike, Júlio Crespo, Joaquim Rio, Miguel Buttuler, Manuel Barros e Alfredo Barros Ramalho. Note-se que dois deles eram jogadores do primeiro «team» de futebol…<br /><br />Faltava ainda o campo próprio, mas os trabalhos, também pela mão de consócios, não cessavam…<br /><br />O grande dia chegou no ano seguinte. Pelas palavras de Acácio Rosa:<br />«Alma de Almeida na construção do campo: Após esforços e sacrifícios de toda a ordem, tendo como alma criadora de todos os trabalhos o seu jogador Joaquim d´Almeida (a «Alma de Almeida»), o Belenenses inaugura as Salésias a 29 de Janeiro de 1928, num encontro com o Carcavelinhos para o campeonato de Lisboa».<br /><br />Ribeiro dos Reis, figura proeminente do desporto e da F.P.F. (para além de posterior co-fundador do jornal A Bola) escreveu a propósito: «Não obstante a chuva que caiu durante a noite, o terreno de jogo estava excelente, o que demonstra o cuidado que presidiu à sua construção. O rectângulo do jogo é amplo e desafogado. O plano inclinado para os peões é o mais vasto de todos os nossos campos e, quando devidamente acabado, deve, em dias de grandes enchentes, produzir um magnífico aspecto. O campo ainda não tem bancadas. Provisoriamente foram utilizados para o efeito uns bancos corridos ao longo do «touch».»<br /><br />Saiba-se ainda que o primeiro jogo foi disputado entre o Bom Sucesso e o Sporting, às 13 horas. O Belenenses estreou o seu campo às 15, vindo a vencer o Carcavelinhos por 4-2.<br /><br />A reter, um nome indelével: Joaquim de Almeida. Jogador campeão, eclético, com as suas próprias mãos trabalhou na construção do campo (como já o tinha feito para a nova sede), até ao último dia, até ao último momento antes da inauguração. E não se esgotou nesta ocasião o contributo deste grande atleta em prol do Belenenses.<br />O Clube pulsava com os corações das gentes de Belém. Quando a equipa jogava fora, um dos jogadores mais queridos no bairro (Azevedo) largava um pombo-correio que diligentemente levava as notícias de vitória a casa, onde aguardavam os vizinhos, suspensos de ansiedade. Para levar os equipamentos Clube tinha ao serviço um burrico, que saía das Salésias, de madrugada, com a sua carroça (a Carris não autorizava o transporte). Pitorescos, por certo, estes retratos de uma dedicação extraordinária.<br /><br />Não tardou o novo campo em ser consagrado com novos títulos: na época de 1928/29 o Belenenses conquistou os Campeonatos de Portugal e de Lisboa.<br />Com o desafogo, ensaiaram-se novas modalidades: surgiram o «Rugby», o Hóquei em Campo, o Ténis de Mesa e as aulas de Ginástica. Pouco depois o Andebol e mais tarde o Basquetebol. As Salésias acolhiam também, com carinho, o ecletismo.<br /><br />O labor não cessou. Para erguer as bancadas em falta, a Direcção nomeou uma «Comissão de Melhoramentos», composta por Joaquim d´Almeida (de novo), Vital Jorge de Sousa, Jaime Alves, Fernando Nunes e Luís Teixeira… que não tardou muito em mostrar obra: em 21 de Junho de 1931 foram inauguradas bancadas em cimento armado. Obra pioneira, que os outros grandes clubes haveriam de esperar vários anos para ter igual – as suas bancadas eram ainda feitas de madeira.<br /><br />Cada vez mais modernas, as Salésias depressa se fizeram mítico campo de glórias, albergue de novos e ímpares talentos do desporto português. Um deles, José Manuel Soares (mais conhecido como o «Pepe» - ídolo nacional, jogador de categoria internacional), viria a falecer em trágicas circunstâncias em Outubro de 1931, lembrando amargamente que a par das brilhantes vitórias caminhava uma teimosa sombra de infortúnio. Em 23 de Setembro de 1932 (aniversário do Clube) foi inaugurado um monumento nas Salésias em sua honra, da autoria de Leopoldo de Almeida e custeado por subscrição pública nacional. Vivia-se o luto, mas não mais se esqueceria o Pepe. Mal se sabia então, mas o monumento do «Pepe» estaria destinado a ser pétrea testemunha de uma era…<br /><br />As melhorias nas Salésias, contudo, multiplicavam-se - qual recrudescida reacção perante a adversidade. Durante as gerências de 1932 a 1936 completou-se mais uma série de obras no campo (que já então passou a ostentar o nome do malogrado «Pepe»):<br />- Sobre a bancada central, prolongada em 50 metros, foi aberta uma bancada para os sócios, com lugares sentados e camarotes;<br />- Foi inaugurada a pista de atletismo em cinza, que pelo juízo da Direcção seria a melhor do país. A condizer, disputa-se o 1º torneio «Madrid-Lisboa»;<br />- Construiram-se cabines para os árbitros, arrumação dos equipamentos e o posto médico.<br /><br />Em 1933 e em reconhecimento do seu valoroso serviço em prol do desporto, o Belenenses recebeu do Presidente da República a mais alta condecoração concedida a clubes desportivos...<br /><br />...sendo agraciado como «Comendador da Ordem Militar de Cristo». Com novo Campeonato de Portugal conquistado, foi ano de especial rejúbilo. Em 1935, outra alta condecoração atribuída: «Oficial da Ordem de Benemerência».<br /><br />O Campo «José Manuel Soares» era então o estádio com maior lotação de Lisboa. Em 22 de Março de 1936, mais uma obra de relevo: o Belenenses inaugurou as coberturas, tornando-se assim no primeiro clube a dispôr de bancadas cobertas. Enquanto decorriam as obras e estando impossibilitada a utilização do campo, um belo gesto para recordar: o Casa Pia cedeu graciosamente as suas instalações. No criterioso supervisionamento das obras, outro devotado dirigente: Salvador do Carmo. Entretanto e nesse mesmo ano faleceu João Luís de Moura, a quem se deveu a conquista das Salésias.<br /><br />Ainda em 1936, a 16 de Dezembro, foi assinado um contrato com a Fazenda Pública permitindo a utilização de mais 9.800 m² de terreno com vista à construção de um campo de treinos. O Belenenses crescia.<br /><br />Em 27 de Janeiro de 1937, porém, novas dificuldades. Um ciclone assolou Lisboa e destruíu por completo as coberturas das bancadas e camarotes. Não se detiveram em desânimo os Belenenses. Logo a 19 de Fevereiro principiaram as obras de reconstrução. Mas trabalhava-se em mais, adivinhava-se mais deslumbre.<br /><br />Em 24 de Abril de 1937 ressurgiu, renovado e esplêndido, o Estádio José Manuel Soares, já incontestavelmente o melhor do País. Não só estavam reconstruídas as coberturas, como se construíra uma bancada de 3 metros em redor do campo; as instalações sanitárias e as cabinas dos atletas foram dotadas de condições de higiene e conforto nunca dantes vistas; estava pronto o campo secundário de treinos, algo raro ou único… mas mais que tudo isso, uma outra novidade era de pasmar: o Belenenses apresentava o primeiro campo relvado de Portugal!<br />Não havia igual, e disso deu conta a revista «Stadium», poucos dias depois (28 de Abril):<br /><br />«A inauguração do estádio José Manuel Soares foi caracterizada pela imponência e brilho que o público emprestou à pugna Belenenses-Benfica, na qual os donos da casa arrancaram a vitória. Tarde de emoção e de consagração, ao esforço dos que pelo desporto muito fazem!!!<br /><br />É imponente, tudo isto. O rectângulo verde, dum verde macio que faz bem à vista, que permite ver bem o que se passa em redor. Depois, um rectângulo complementar, cor de tijolo, que forma um contraste que realça ainda mais a mancha verde do tapete de relva. Em volta, como sulco aberto na cercadura de tijolo, a fita preta da pista de atletismo. O gradeamento, em branco e azul, dá ao terreno o aspecto curioso dum grande ring com o público debruçado sobre o campo de luta. Num dos lados, os gradeamentos limitam os alçapões de mágica por onde os jogadores aparecem e desaparecem…<br /><br />A toda a volta, mas especialmente do lado da geral, um mar de cabeças, um mar que ainda não entrou em animar-se… Tranquilo, por enquanto. Um vento de bonança que talvez não chegue a acompanhar a ventaneira desenfreada que sopra nos camarotes… No topo de nascente - uma nota de cor, cor de rosa… São os pequenos do Asilo NunÁlvares, companheiros do Belenenses no aproveitamento da cerca do asilo. Há quem nos diga que o Belenenses vai oferecer bibes azuis à pequenada. Assim, estão melhor. A cor-de-rosa é a cor dos sonhos ainda ingénuos. E dá mais alegria ao campo quando os pequenos se agrupam para ver o jogo.»<br /><br />Afixaram-se no Estádio placas que assinalavam a efeméride. Uma delas apelava ao orgulho dos sócios: «Belenenses Honrai o Símbolo do Nosso Querido Clube». Uma outra, com justeza, perpetuava gratidão: «Este campo foi mandado arrelvar pela direcção da F.P.F.A. de 1936/37. Dirigiu o arrelvamento o agrónomo J. McInroy (Os Belenenses agradecidos) em 24-4-1937».<br /><br />O país pareceu render-se à nova maravilha do desporto português. A 9 de Janeiro de 1938 realizou-se o primeiro de muitos jogos da Selecção Nacional ali disputados. A 30 de Outubro do mesmo ano coube ao Belenenses a honra de receber no seu estádio o Festival Desportivo de Comemoração das Bodas de Ouro do Futebol em Portugal: cumpriam-se 50 anos sobre o célebre jogo da Parada de Cascais e a maioria dos intervenientes (alguns deles simpatizantes do Belenenses) esteve presente. Ali e naquele dia, mais que nunca, se honraram os autênticos pioneiros do futebol português.<br /><br />De permeio, novas melhorias: o campo de treinos foi arranjado de forma a permitir competições oficiais das categorias inferiores de futebol, bem como a prática de outras modalidades desportivas; foi construída à volta do campo uma vala para escoamento das águas da chuva; foi aberto um furo artesiano (de 36,42 metros), para abastecimento de água para as regas e abastecimento dos balneários...<br /><br />Estava feito um estádio de categoria internacional!</div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-58229549028208123172009-05-25T10:15:00.008+01:002009-05-27T23:11:30.911+01:00SÉRIE: Cinquentenário do Estádio do Restelo - Capítulo I - 1ª parte<div align="justify"><strong>Capítulo I: Antepassados do Estádio do Restelo<br />1ª parte: da praia ao Campo do Pau de Fio<br /></strong><br />Antes de recordar o historial do Estádio do Restelo, desde a sua planificação e construção até aos dias de hoje torna-se incontornável fazer referência aos espaços que o precederam.<br /><br />Quando decidiu erguer o novo estádio, o Belenenses era já uma colectividade estabelecida com singular grandeza no panorama do desporto nacional, revelada não só em proezas atléticas mas também – e precisamente – na edificação de um outro campo, dos mais emblemáticos e pioneiros recintos da primeira metade do Século XX: as Salésias.<br /><br />Ao abordar essa «pré-história» do Restelo, portanto, tratamos de evocar um notável legado de sonhos e símbolos – no fundo, uma identidade amadurecida e magnífica – bem como um rol de quase incontáveis adversidades, cuja superação custaria incansáveis labores, mas sublimaria uma inquebrantável vontade. De tudo isso o Restelo não foi o princípio. E, como veremos futuramente, também não foi o fim. Foi herdeiro de cores e amores, mas também de dores…<br /><br />Belém foi o berço lisboeta do futebol popular. Era não só um local privilegiado para a sua prática, mas propiciava a sua conversão em espectáculo-fenómeno cativante de massas, capaz de congregar ruas e bairros inteiros, despojados de qualquer distinção de classes ou níveis de instrução.<br /><br />Tudo começou na praia, pois claro, não fossem os nossos os «rapazes da praia» (embora inicialmente de forma trocista). Pouco após o primeiro jogo de «foot-ball» em Portugal continental (promovido pelos irmãos Pinto Basto na Parada de Cascais em 1888) surgiram as primeiras disputas nos areais do Restelo e Pedrouços. O jogo ganhava raízes também na Casa Pia, instituição pioneiríssima na educação física.<br />Em 1904 foi fundado o primeiro grande clube de futebol de Belém, o Sport Lisboa, que treinava nos terrenos do antigo hipódromo e das Terras do Desembargador, embora cada vez mais furtivamente. O hipódromo, embora já abandonado para o seu propósito inicial (as corridas de cavalos), era frequentemente utilizado para outros fins que prejudicavam não só a realização dos jogos como as próprias marcações do «foot-ball»: ali ensaiavam-se os primeiros vôos a motor, as primeiras corridas de ciclismo (e depois automobilismo); faziam-se exercícios de artilharia e desfilavam a cavalaria e os lanceiros perante dignatários e realeza estrangeira; de quando em quando, um concurso hípico.<br /><br />Desta forma o Sport Lisboa remeteu-se então às Terras do Desembargador, também conhecidas como Campo das Salésias, por serem fronteiras ao Convento (embora o acesso se fizesse a partir da Calçada da Ajuda). Era «campo», não pelo futebol, mas por ser à época o campo de parada do quartel de cavalaria ali próximo (hoje entremuros, nas Oficinas Gerais de Material de Engenharia)… circunstância que levaria o Sport Lisboa a abandonar precocemente o seu último reduto em Belém, por decisão do próprio Ministério da Guerra. Aos militares não agradavam as intromissões, ajuntamentos consideráveis e, não raras vezes, desordens. Uma boa parte dos jogadores do Sport Lisboa também via com bons olhos a saída das Salésias, pois o terreno tornava-se penoso para jogo (abundavam as covas e desapareciam constantemente as marcações) e as condições gerais eram pobres. Esgotaram-se assim as hipóteses de contar com um campo próprio em Belém e «exilou-se» o Sport Lisboa para outras paragens, entre lamentos e saudades.<br /><br />Vivia-se a euforia pelo fim da Iª Guerra Mundial quando em 1919 um grupo de jogadores de Belém, cansados de serem a nata dos «outros», resolveram fundar o Clube de Futebol «Os Belenenses»: verdadeiro clube dos belenenses. Começaram por treinar nas Terras do Desembargador (muito brevemente) e logo depois numa nesga de espaço junto à Praça Afonso de Albuquerque (onde, num banco do jardim, haviam decidido fundar o clube).<br /><br />Devido à súbita e inesperada afluência (de candidatos a jogadores e de público), cedo tomaram novo «campo», logo ao lado, mais para o meio da Rua Vieira Portuense (anexo ao espaço do antigo mercado), bem em frente do casario onde seria instalada a primeira sede, como ainda hoje se testemunha em placa alusiva. Nasceu assim o «Campo do Pau de Fio», assim chamado porque estava ali «plantado» um poste telegráfico, junto à linha divisória do terreno de jogo.<br /><br />Desde logo se abeirou o povo de Belém para ver o seu novo clube, à volta do campo, por debaixo das colunas e nas varandas das casas. Numa delas até o Presidente da República (Manuel Teixeira Gomes) assistiu a treinos e jogos do Belenenses. Foi ali que o Belenenses exibiu o seu primeiro troféu, a prestigiada Taça dos Mutilados de Guerra. Também ali vicejou o ecletismo do Clube: nas celebrações do 2ª aniversário já se realizavam grandes provas de atletismo e ciclismo… e demonstrações de boxe! Pitoresco, era também o primeiro «vestiário»: a própria casa da família de Artur José Pereira (principal fundador), na Rua do Embaixador.<br /><br />No entanto e com vista à participação regular no Campeonato de Lisboa (na altura a competição mais importante do País), o Campo do Pau de Fio não reunia as condições necessárias... pelo que o Belenenses passou a realizar os jogos oficiais em campo emprestado: o Stadium do Lumiar.<br /><br />Mais tarde, em 1924, uma coligação de clubes representados na Associação de Futebol Lisboa levou esta a determinar que aquelas colectividades que dispunham de campos próprios (onde se incluíam as da dita coligação) não os poderiam ceder graciosamente a outros emblemas para efeitos de campeonatos. Directamente visados eram o Belenenses e o Casa Pia (também de Belém e na altura Campeão de Lisboa em título), que assim corriam o risco de não poderem participar no Campeonato de Lisboa. Isto embora o Presidente da Associação fosse Virgílio Paula, ilustre belenense desde os tempos da fundação, a quem a integridade não permitia senão aceitar a vontade unânime dos delegados.<br /><br />O Casa Pia não demorou muito até inaugurar (no mesmo ano) um campo cedido pela própria instituição, a que se chamou «Campo do Restelo». Para a sua inauguração foi convidado o Belenenses, estando em disputa – apropriadamente – a «Taça Belém» (caprichosamente a contenda terminou em empate, pelo que o troféu ficou por entregar). Note-se que este Campo do Restelo ficava junto à parte ocidental das traseiras do Mosteiro, não coincidindo com qualquer parte do que viria a ser o complexo do Estádio do Restelo.<br />O Belenenses, por sua vez, passou a ter de alugar o campo do Lumiar, isto enquanto não encontrasse campo próprio e terminasse de vez com a «maldição» de não poder jogar em Belém. E foi por lá, longe de Belém, que o Belenenses conquistou o seu primeiro grande título, o Campeonato de Lisboa, a 21 de Março de 1926 (vitória por 1-0 frente ao Sporting).<br /><br />Perante o imbróglio colocava-se a hipótese de apresentar o Campo do Pau de Fio como campo próprio. O tesoureiro do Clube logo esclareceu: «Não, isso é quase impossível. Mas nos já deitámos as nossas vistas para o magnifico campo das Salésias». O Belenenses cobiçava já uma faixa de terreno, no coração do seu bairro. Tentou. Após várias insistências, o Governo acedeu. Através de decreto datado de 15 de Dezembro de 1926 foi finalmente estabelecido um acordo, sob os auspícios do Ministério das Finanças:<br /><br /><blockquote>Considerando que ao Governo da República não pode ser alheio o interesse pela causa desportiva do país; Considerando que o Clube de Futebol "Os Belenenses" por várias vezes tem pedido a cedência de terrenos anexos ao Asilo Nun’Alvares [anteriormente denominado Refúgio e Casas de Trabalho e proprietário do antigo edifício do Convento das Salésias e respectiva cerca] para ali instalar o seu campo desportivo; Considerando que em nada o referido asilo é prejudicado por tal cedência: Em nome da Nação, o Governo da República Portuguesa, sob proposta do Ministro das Finanças, decreta para valer como lei o seguinte:<br /><br />Artigo 1º: É cedida a título precário ao Clube de Futebol "Os Belenenses", com sede na Rua Vieira Portuense, nº 48- 1º, em Belém, desta cidade de Lisboa, uma faixa de terrenos, constante da planta anexa ao processo arquivado na respectiva Repartição, para nela serem instalados a sede e o campo de desporto do referido clube.<br /><br />Artigo 2º: Reverterá para a posse do referido Asilo a referida faixa de terreno, com todas as obras e benfeitorias ali feitas, e sem indemnização, quando deixar de ser utilizada para o fim a que agora é destinada.<br /><br />Artigo 3º: O Clube de Futebol "Os Belenenses" entregará ao Asilo Nun’Álvares a percentagem de 6 por cento sobre a receita bruta de todos os desafios de futebol ou festas desportivas, ali realizadas, bem como a receita líquida duma festa desportiva anual.<br /><br />Artigo 4º: Fica revogada a legislação em contrário.</blockquote><br /><br />Deve assinalar-se desde já que a faixa de terreno em causa (que não coincidia com o campo primitivo do Sport Lisboa), enquanto por lá esteve o Belenenses, nunca deixou de ser utilizada para o fim a que foi destinada… bem pelo contrário.<br />Mas prossigamos com esta grande vitória de 1926, em tudo devida ao esforço do Presidente de então, o Ten. Coronel Luís de Moura.<br /><br />O Belenenses não perdeu tempo. Logo a 27 de Janeiro de 1927 reuniu uma Assembleia Geral Extraordinária para proceder à ratificação do acordo e aprovação do plano de trabalhos. Surgiram dúvidas. Sentindo um voto de desconfiança, a Direcção apresentou demissão. Porém, em 9 de Março, decorreu nova reunião da Assembleia Geral, dessa vez com sucesso e aclamação (incluindo a recondução do elenco directivo). A título de curiosidade, eram estas as contas previstas:<br /><br />Custo das obras: 250 mil escudos<br />Receitas:<br />Quota suplementar de 30 escudos (valor mínimo de 1000 sócios): 30 mil escudos<br />Emissão de títulos: 30 mil escudos<br />Disponibilidades: 40 mil escudos<br />Empréstimo externo: 150 mil escudos<br /><br />Deitaram-se as mãos à obra logo a partir do dia 5 de Abril seguinte. O contrato inicial, celebrado com os empreiteiros António Vicente Ramos e Bruno José dos Santos, implicava uma despesa de 92 mil escudos. Em 20 de Maio, nova empreitada, com despesa de 12 mil escudos. No total foram gastos 104 mil escudos.<br /><br />Em declarações ao jornal «Os Sports», na edição de 5 de Setembro, o Presidente do Clube antevia já com entusiasmo: «Com a inauguração do campo e a instalação da sede, uma e outra coisa funcionando no coração de Belém, os progressos do Clube hão-de acentuar-se. O Belenenses tem uma característica bairrista que é interessante e que não se deve perder».<br />O Belenenses extravasava já os limites do seu bairro, mas não sendo «clube de bairro», cuidava do seu fervor «bairrista», na melhor e mais castiça acepção possível. No fundo, cuidava da sua identidade. Dias antes daquela entrevista (3 de Setembro) havia sido inaugurada uma concorrida «Feira Franca» no Largo de Belém, com vista à obtenção de fundos. A melhor prova daquelas palavras.<br /><br />Entre trabalhos e canseiras, a equipa de futebol continuava a ganhar também em campo, ainda que alheio: o Belenenses conquistava no Lumiar o seu primeiro Campeonato de Portugal!<br /><br />Quanto ao Campo do Pau de Fio, curiosamente, voltaria a ser campo de jogos, mas da FNAT (antecessora do Inatel), desde o início dos anos 40 até à inauguração do seu estádio – o actual «1º de Maio» – em 1959.</div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3937106286951574796.post-5564030399899039732009-05-24T18:04:00.004+01:002009-05-24T18:16:15.984+01:00Em reformulaçãoCom novo rumo, este blogue irá ser dedicado à História do Clube de Futebol "Os Belenenses"... e ao que significa SER BELENENSES.<br /><br />Alguns dos conteúdos transitarão da seguinte página (também do autor):<br /><a href="http://www.geocities.com/hpacfb/">http://www.geocities.com/hpacfb/</a><br /><br />BELÉM ATÉ MORRER!Unknownnoreply@blogger.com0